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Conversas de tamborzeiro
Vida & Arte

Conversas de tamborzeiro

| PROJETO | Idealizado e conduzido pelo educador social Wellington Nascimento, Papo de Tambor apresenta a jovens do Cuca Mondubim a dança maranhense do tambor de crioula
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Projeto Papo de Tambor (Foto: Tatiana Fortes)
Foto: Tatiana Fortes Projeto Papo de Tambor

Uma fogueira, uma roda de conversa e muitas, muitas conexões - com a ancestralidade, a cultura popular, o cotidiano na periferia e o autoconhecimento como povo negro. Há cerca de um ano, o educador social Wellington Nascimento, 37, toca à frente o Papo de Tambor, projeto que coloca em evidência todas essas questões e culmina na execução (teoria e prática) do cadenciado tambor de crioula.

Reconhecido como um dos patrimônios imateriais do País, assim como a capoeira, o frevo e o samba de roda, o ritmo maranhense adentrou na Terra da Luz e, aos poucos, vem tomando conhecimento em eventos abertos, trazendo canto, dança, toque e o mais importante: a devoção a São Benedito, o santo preto padroeiro da brincadeira, geralmente mais vista no Carnaval e no período junino.

A vivência, geralmente com periodicidade quinzenal, acontece ao lado do ginásio do Cuca Mondubim. O início se dá por volta das 16 horas, quando uma pequena fogueira é acesa com o propósito de afinar o trio de tambores que dá a base ao ritmo de origem africana: em tamanhos diferentes, o tambor central (meião) dá cadência ao toque; o menor (crivador) faz o contratempo do médio e, por fim, o grande (roncador/ rufador) é mais livre e faz o jogo com a coreira (como é chamada a dançarina do tambor de crioula; coreiro, por sua vez, é o nome dado aos homens).

"Eu não sou a figura central (da vivência). Eu não estou aqui como um professor, mas para fazer conexões", faz questão de frisar Wellington para uma plateia de cerca de 20 jovens frequentadores do equipamento. "É macumba? É macumba?", grita um senhor que passa de moto na ocasião. "Quase!" (risos), responde Wellington, aproveitando a deixa para falar do respeito aos mestres, assim como da ligação dessas manifestações com as religiões afro-brasileiras e dos preconceitos que ainda cercam as mesmas.

"Acho que uma das maiores dificuldades que eu tive foi justamente desvincular a imagem que o tambor passa diante de uma sociedade que não tem conhecimento de sua cultura, de sua origem, de sua ancestralidade, de suas raízes. No início, o tambor era ligado a tudo de ruim que se possa imaginar. Mas posso dizer, com felicidade, que hoje em dia não temos mais essa dificuldade, já se consolidou. E o Cuca, como equipamento, me deu toda a estrutura necessária", explicou.

Formado em Pedagogia pela Faculdade Cearense (FaC), Wellington Nascimento apresentou seu trabalho de conclusão de curso com o tema Pedagogia Social: Educação Através do Tambor e Seus Efeitos Socioculturais e, atualmente, integra o corpo docente da instituição. A inserção na prática do tambor de crioula deu-se a partir da escola de percussão Caravana Cultural, fundada e coordenada pelo carioca Marcello Santos.

"A partir daí, tive a oportunidade de conhecer mais, viajar para São Luís e conhecer outros mestres, dentre eles Amaral. Mas minha relação é para além do tocar, de uma brincadeira. Eu respeito o tambor como algo sagrado. Ele me levou a lugares que eu nunca imaginei estar: lugar de fala, espaços que me viam e me valorizavam. Minha relação é de respeito, de veneração mesmo. É algo sagrado pra minha vida", resumiu.

A roda, finalmente, é formada. Nela, são passadas ainda as toadas (músicas), que têm uma ordem certa para serem cantadas. "O tambor constrói a nossa cultura. Eu sou tamborzeiro", sintetiza Wellington.

Papo de Tambor

Quando: projeto quinzenal, sempre às 16h

Onde: Cuca Mondubim (rua Sta Marlúcia, s/n)

Acesso gratuito

Info: (85) 3499 0018

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