Mariana Amorim
ESPECIAL PARA O POVOvidaearte@opovo.com.br
Bruna Caram é dona de uma voz marcante. Aos 30 anos, a artista independente chega ao seu quarto disco gravado em estúdio e, sem esforço algum, envolve todos ao seu redor. Com uma proposta mais madura, Multialma apresenta um trabalho em sua maioria autoral e parcerias com grandes nomes como Chico César e Zeca Baleiro.
A vontade de lançar um disco autoral e mostrar seu lado compositora acompanha Bruna desde seu último trabalho, o livro Pequena Poesia Passional. A obra, publicada em 2015, é o primeiro trabalho com poemas da artista. Bruna explica que depois da experiência, ela se sentiu mais ‘livre’ e quis levar isso aos palcos. A experiência com a dramaturgia também ajudou nesse processo de autoconhecimento.
A única faixa não autoral do disco é Além da Última Estrela, composta por Dominguinhos em parceria com o cearense Fausto Nilo. Gravada por Maria Bethânia, há 24 anos, a canção habita a memória afetiva da paulistana.
O Vida&Arte conversou com a Bruna Caram sobre o novo disco e como ela se descobriu uma multiartista.
O POVO – Multialma vem sendo repercutido como o seu disco mais maduro até agora. Você encara assim?
Bruna – Sim! Sei que é de fato meu disco mais maduro até hoje porque foi o que mais me custou coragem para fazer. Isso de lançar pela primeira vez um disco autoral, de tocar um instrumento no estúdio pela primeira vez, de chamar vários convidados especiais pela primeira vez, tudo isso precisou de uma segurança que nunca soube se tinha. Enfrentei meus demônios. Um pouco porque os trabalhos de atriz e escritora foram precipícios nos quais amei me atirar.OP – E como foi a escolha do repertório? É um disco praticamente todo autoral, teve algum motivo para isso?
Bruna – Isso aconteceu sem querer, o disco foi se fazendo… Mas, quando percebi que não tinha vontade de pedir canções para meus amigos compositores, achei um sinal estranho. Sempre amei garimpar canções e, de repente, eu não tinha (essa) vontade. Tinha também algumas parcerias prontas que eu queria lançar e foram as parcerias que foram aproximando meu coração e meu desejo de um repertório mais autoral. Meus empresários sugeriram um disco autoral antes de eu ter me dado conta de que seria isso!
OP – E sobre as parcerias, como foi a escolha? Como foi o trabalho de composição com os outros artistas?
Bruna – Este trabalho vem acontecendo ao longo dos anos, não foi para o disco. Então foi muito sincero e espontâneo! Os parceiros do disco são meus amigos, pessoas que adoro, que também são artistas que admiro. O Zeca (Baleiro) produziu uma faixa e quando terminou disse que queria compor uma junto comigo, antes de eu saber que seria um disco autoral. Chico era parceiro de longa data e um dia, saindo do estúdio, surgiu uma letra na minha cabeça que só parecia ter a cara dele. Fizemos a canção no mesmo dia. Achei bonito como meus parceiros me carregaram. E minha sanfona também. Ter começado a tocar definitivamente um instrumento me colocou uma asa nova pra voar…OP – E sobre a sua participação na minissérie Dois Irmãos, na Globo? É o seu primeiro papel como atriz?
Bruna – É meu primeiro papel. Fiz dois anos de oficina de teatro com a Cris Ferri, minha grande mestra e diretora dos meus shows. Sempre me aproximei do teatro, pois sempre achei que minha maneira de cantar tinha muito mais a ver com a mensagem e interpretação que com a música. Mas, como me apaixonei pela arte, sabia no meu coração que um dia trabalharia como atriz. Foi o maior presente da minha vida.
OP – Você também lançou um livro de poesias. O que motiva a se comunicar por tantas plataformas?
Bruna – Demorei para entender que o que eu faço não é exatamente cantar… É justamente misturar as artes. Faz tanto sentido para mim escrever quanto cantar, tocar quanto atuar. Não quero nunca mais dividir o que para mim foi uma coisa só. Tanto é que fizemos uma turnê de shows do livro, misturando música, teatro e poesia.Isso para mim é o que faz mais sentido.OP – A única música não autoral deste novo disco é Além da Última Estrela, composta por Dominguinhos e Fausto Nilo e gravada por Bethânia há 24 anos (no disco Olho d’Água). Porque essa escolha?
Bruna – Dominguinhos foi o espelho mais bonito que encontrei para minha alma. Sanfoneiro, nordestino, brasileiro, com uma obra extremamente sensível, dramática, melodiosa… Foi aquela canção que não pude descartar quando decidi que o disco seria autoral. Meu coração me obrigou a gravar.
OP – A canção Eu Vou Pra Rua é uma crítica direta ao machismo. Como você encara o papel da música para o empoderamento?
Bruna – A arte tem um papel fundamental na luta por direitos. E o machismo é tão sorrateiramente cruel, está tão encruado no nosso dia-a-dia, que é pouco falar dele aos gritos, protestando. É preciso denunciá-lo de mais maneiras, de todas as maneiras possíveis. A música é uma maneira sedutora, bem-humorada. E como é lindo ver nos shows homens cantando esse grito de guerra pró-mulheres! O que eu puder fazer para promover esse respeito, farei.