Renato Abê
renatoabe@opovo.com.br
Rico Dalasam até já veio em Fortaleza. Foi dentro da programação da Feira da Música, em 2015. Na ocasião, porém, ele tinha na bagagem apenas as seis faixas do ep Modo Diverso. Hoje o rapper tem Orgunga, seu disco de estreia, e, de lá pra cá, conquistou espaço nacionalmente com seu discurso afiado de resistência da periferia e defesa das minorias. De volta, o artista sobe hoje ao palco do Órbita Bar, a partir das 21 horas, dentro da programação de Pré-Carnaval do espaço na Praia de Iracema.
A rápida passagem pela Capital há dois anos foi marcante. Por aqui, o artista viveu um “breve” romance, que foi transformado na música Vambora, um rap com pandeiro, triângulo e muita nordestinidade. “Voltei pra minha terra cheio de história e um pouco carente. A estrada tem disso, rota solitária entre duas saudades”, poetiza Rico. “Eu escrevi a música em Fortaleza, foi tudo mágico”, lembra.
Em suas composições, tem espaço para o amor e para festa, mas sobretudo para discursos de afirmação. “Acredito no fervo (sinônimo de festa, agito) enquanto luta. A gente está falando com precisão e a mensagem precisa chegar (no público) com liberdade”, elabora o artista que tem percorrido o País. Além das próprias músicas, ele vem conquistando parcerias: divide os vocais com Emicida em Mandume e com Pabllo Vitar no hit Todo Dia.
[QUOTE1]Apesar de ser um dos destaques da novíssima geração do rap brasileiro (ao lado de nomes como Karol Conka), Dalasam prefere não falar pelo movimento. “O rap é muito grande e acontece de várias formas. A existência de mulheres e LGBTs não vai trazer uma definição total para o rap brasileiro”, aponta, se esquivando de falar sobre mudança no gênero musical. Ele, entretanto, celebra o crescimento de nomes que fogem do estereótipo que dominou o rap por muito tempo: homem heterossexual. “Acho que estamos dando visibilidade para a diferença e vamos chegar muito maior, ir muito mais longe”, projeta, com segurança.
Referência também na moda, o artista quer quebrar o mito de que o som vindo da periferia tem necessariamente tom triste e de lamento. O rapper defende ser importante dar voz também à alegria, o que, segundo ele, incomoda as plateias mais acomodadas. “Nossa ascensão e nossa visibilidade incomodam. Até o sorriso que a gente dá é questionado”, reclama. “Se eu tiver bem vestido, é porque eu sou vendido. Se tiver fora da estética de favela, já não é verdadeiro. A gente tem que quebrar isso todo dia”, diz.
Seja em Taboão da Serra, periferia onde nasceu, ou em Londres, onde gravou o clipe de Riquíssima, o rapper argumenta ser o mesmo “negrinho cheio de querer”. “Se eu puder, vou tacar a roupa mais foda. Eu trabalho como qualquer outra pessoa. Marginalizar nossa arte é um recurso dos opressores”, aponta. A resposta, ele conta, dá nos palcos. “O importante é retrucar da forma que a gente faz: com esse deboche. É mantendo a força que existe na realização do nosso trabalho de uma forma positiva e inspiradora. Com brilho e sorriso no rosto”, ensina.
SERVIÇO
Rico Dalasam
Quando: hoje, a partir das 21 horas
Onde: Órbita Bar (R. Dragão do Mar, 207 - Praia de Iracema)
Quanto: Entre R$ 20 e R$ 40
Telefone: 3453 1421
SAIBA MAIS
Ep Modo Diverso
"As seis faixas do primeiro trabalho de Dalasam apresentaram o artista ao País. Os destaques da obra são os singles Não Posso Esperar e Aceite-C. Além do rap-desabafo Reflex, em que ele canta: “Há tempos eu venho pensando que eu poderia ser a voz de várias pessoas/ Talvez pelo fato de minha história ser um pouco complexa”, recita. Ele continua: “É necessário que você se faça entender".
CD Orgunga
"O termo que dá nome ao disco nasce da expressão “orgulho negro e gay”. Entre os destaques do álbum, que figurou em lista dos melhores de 2016, destaque para Milimili, Esse close eu dei e Relógios. Na faixa Dalasam, ele canta: “Negros, gays, rappers, quantos no Brasil? Deve haver vários. Tantos tão bons quanto os fodas que rima uma cota. Tirando os que estão e ninguém nota".