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Biografia narra os anos de Belchior no mosteiro dos capuchinhos
Vida & Arte

Biografia narra os anos de Belchior no mosteiro dos capuchinhos

Livro narra os anos do cantor e compositor cearense Belchior no mosteiro dos frades capuchinhos, em Guaramiranga, e ilumina a criação dos lendários discos Alucinação e Coração Selvagem
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“Em Sobral”, escreve o jornalista Jotabê Medeiros, “as experiências não foram decisivas. Ele considerava que ainda não tinha idade para o sexo. Mas frequentava a ‘zona’ por conta de um grande saxofonista que se apresentava por lá”. Noutro trecho, revela que aquele jovem de 18 anos “trazia outras coisas” para o mosteiro de Guaramiranga (CE). “Era capaz de improvisar repentes e emboladas durante até duas horas, para alegria da sua turma.” E, numa síntese da personalidade do noviço, traça: “Além de bem-humorado, frei Francisco Antônio era atento, disciplinado, fraterno e cortês”. Citava de cor todo o “Testamento de São Francisco” e se mostrava indiferente às dores do cilício.

 

Essas passagens, que ajudam a entender por que frei Francisco Antonio de Sobral trocaria o claustro pelos palcos e o noviciado pela música, integram o primeiro capítulo da biografia Apenas um rapaz latino-americano: a vida e os mistérios de Belchior. O livro estava quase encerrado quando, no último fim de semana, Jotabê, autor da obra e amante das canções do cearense, foi pego no contragolpe. Numa reviravolta quase novelesca, viu-se obrigado a suspender a viagem já programada para Santa Cruz do Sul (RS), cidade onde o compositor tinha passado os últimos anos num isolamento autoimposto, e pegar o voo rumo a Fortaleza.


“Eu esperava encontrar o Belchior na semana que vem. Tinha uma pista de onde ele estava e ia atrás. E acabei terminando em Fortaleza, por artimanhas do destino. Vim encontrá-lo aqui, deitado”, diz, referindo-se ao corpo do músico, velado por quase 12 horas no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura em meio a cantorias e homenagens, na última segunda-feira e manhã de terça. Do lado de fora, Jotabê fazia entrevistas e coletava depoimentos para, finalmente, colocar um ponto final na narrativa.


A biografia pretende alinhavar um retrato da vida e da obra de Belchior, morto no último domingo. Quer dar conta não apenas da música, mas também de outras facetas menos conhecidas, como a de pintor, além de diálogos que se tornaram fundamentais na produção dos grandes discos do poeta.


Para Jotabê, a escolha de Belchior como personagem não é casual: “Acho que ele era o maior outsider da música brasileira. Foi solitário. Foi anti-panelinha o tempo todo, mesmo com o Pessoal do Ceará. Belchior não foi um deles, embora fosse um deles. Ele não negava a irmandade, mas a música dele se afirmava em outra direção”.


Essa direção, defende o jornalista, é a mesma responsável pelo número de jovens que foram se despedir do compositor. “Uma coisa fez o Belchior diferente: ele fala pra juventude”, analisa. “A música dele tem uma reflexão da natureza do jovem, é muito profunda nesse sentido. Ao mesmo tempo, ela obriga as pessoas a pensarem acima da média. É popular, mas não é popularesca”.


De acordo com o escritor, Belchior é como uma canção que falasse a todo mundo: é um canto de toda parte e de parte nenhuma. “A vida dele é exemplar pra qualquer ser humano em qualquer lugar do mundo. É uma grande história”, anuncia.

 

SAIBA MAIS

Jotabê Medeiros é jornalista, crítico musical e escritor. O primeiro capítulo da biografia Apenas um rapaz latino-americano: a vida e os mistérios de Belchior, a ser lançada pela editora Todavia, foi publicado no site da revista Piauí e pode ser lido no link piaui.folha.uol.com.br/o-claustro

 

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