Deve ser difícil ter noção do peso que se assumir gay tem sobre nossas personalidades sem viver isso. Não importa quão bem resolvido você for, quão bem preparado você esteja, quanto apoio você receba. É, em geral, um dia que muda toda a sua vida. Eu vivi um processo longo, que começou em 2006 e culminou em 2009. Também acompanhei alguém que assumiu um relacionamento comigo para a família e acompanhei o laço dessa camisa-de-força que nos tira o ar por anos afrouxar no peito de mais alguém. Por mais ilógico que seja ter de declarar a atração por alguém para parentes, isso muda tudo. Com Amor, Simon, de Greg Berlanti, é sobre esse dia em que, para se sentir aceito, alguém precisa aprender a se aceitar.
“Sair do armário” é externar um processo. E é algo cada vez mais comum em uma sociedade onde as minorias conquistaram uma nesga de visibilidade. O primeiro passo fora do armário é o primeiro passo rumo à paz, por mais que o caos seja completo na nossa cabeça. Não existe bala mágica. Nenhuma reação perfeita da família é o bastante, nenhum apoio de amigos é suficiente. Porque no final das contas, é algo completamente pessoal.
Com Amor, Simon é sobre um garoto normal desses filmes para jovens. Branco, bonito, sorriso perfeito, gosto musical impecável, grupo de amigos diversificado, introvertido, mas bem apessoado. Simon (Nick Robinson) não tem nada muito de novo, apenas o segredo de que é gay. A ideia central de Greg Berlanti é expor o quanto tudo aquilo é banal – mesmo dentro da pasteurização do Ensino Médio norte-americano mostrado nos cinemas..
No filme, o protagonista troca emails com um colega misterioso, Blue, que se assume gay em um fórum online anônimo. Outro rapaz da mesma escola, Martin (Logan Miller), descobre o segredo e começa a chantagear Simon para conseguir se aproximar de Abby (Alexandra Shipp). E assim começa o jogo, repetido, de um amigo traindo o outro para proteger alguém que ama. Aquela ladainha repetida de drama adolescente.
Só que Com Amor, Simon entendo uma coisa. Entendo o peso que é se assumir mesmo para quem sabe que não vai “sofrer” com a família e amigos. É, voluntariamente, dar um passo sem volta e mudar tudo na própria vida. É, por vezes, machucar muito alguém que lhe ama, mesmo que a dor dessa pessoa seja indevida. A força do filme é justamente ser leve ao mostrar algo que, internamente, será sempre pesado. Com Amor, Simon mira o público jovem, carente de representatividade. E, como Mulher Maravilha (2017) e Pantera Negra (2018) mostraram, representatividade muda tudo.
Berlanti pode não ter criado um novo paradigma de filmes para adolescentes e jovens adultos. Ele não revolucionou linguagem, não criou algo de novo. O bom de Com Amor, Simon é isso. É um filme perfeitamente normal, com o qual qualquer pessoa pode se identificar. Esse eco para uma nova safra de pessoas LGBTQ deixa tudo muito, muito mais fácil. Falo por mim e por várias gerações de meninos gays.
Salas e horários de exibição (22 a 28/3)
UCI Iguatemi - Sala 7 (leg) - 21h40; Del Passeo - Sala 2 (leg) - 19h; RioMar Fortaleza - Sala 10 (leg) - 17h; RioMar Kennedy - Sala 4 (dub) - 18h15
Outras estreias da semana
CÍRCULO DE FOGO: A REVOLTA
O mais caro tokusatsu da história, Círculo de Fogo foi sucesso (moderado) em 2013. O filme volta com novo elenco e sem o vencedor do Oscar Guillermo del Toro. Do time original, só temos a volta de Mako Mori (Rinko Kikuchi), que, enfim, era uma das melhores coisas do filme. A direção é do estreante Steven S. DeKnight.
PEDRO COELHO
Baseado na clássica história infantil de Beatrix Potter (protagonista do longa biográfico Miss Potter, de 2006), a obra mostra a tumultuada relação de um coelho rebelde com o senhor McGregor. Após a morte do dono da casa, seu sobrinho, Thomas, precisa renovar a mansão para lucrar com a venda. Isso se Pedro permitir. O filme mistura animação com atores reais.
SAUDADE
O documentário de Paulo Caldas se debruça no mais lusófono de todos os sentimentos: a saudade. Aspectos plásticos e sensoriais são resgatados por meio de viagens, entrevistas e relatos de brasileiros e habitantes de outros países que têm “saudade” no vocabulário.
WESTERN
Co-produção Alemanha, Bulgária e Áustria, Western, é o terceiro longa de Valeska Grisebach. O filme acompanha um grupo de trabalhadores alemães em uma região remota da Bulgária. Lá, eles aprendem a lidar com os preconceitos e a falta de confiança que surge da barreira da linguagem.