[FOTO1]
No silêncio da aurora e sem esperar que janeiro chegasse, Olavo Bilac partiu para conhecer sua Via-Láctea. Alma inquieta que era, saiu, antes do Sol, num 28 de dezembro, a ouvir as estrelas que rompiam o céu ainda deserto. Um século após a sua morte, o poeta nunca deixou de ser publicado, lido, analisado e revisto. Com uma obra cheia de subjetividade e lirismo, ele figura, na literatura brasileira, como ourives do verso.
A estreia de Olavo Bilac se deu com o livro Poesias, de 1888. O Parnasianismo, corrente literária da qual fez parte, já estava firmado no Brasil desde o começo da década de 80 do século XIX, quando uma "nova geração" de escritores abraçou o culto à perfeição estilística e formal. Figura paradigmática do começo do século XX, Bilac demonstrava plena identificação com a "Serena Forma", objeto de desejo dos parnasianos, marca também visível em sua tão famosa Profissão de Fé, poema no qual confessa: "Invejo o ourives quando escrevo [...] Porque o escrever ? tanta perícia, tanta requer!".
Olavo ingressou nos cursos de medicina e de direito, embora não tenha concluído nenhum deles. Dedicou sua vida, por assim dizer, à poesia e ao jornalismo. Publicou seus primeiros versos em 1883, ainda na Gazeta Acadêmica. Frequentador das rodas de boêmia e de literatura do Rio de Janeiro, se apaixonou por Amélia de Oliveira, irmã do poeta Alberto de Oliveira. O casamento, no entanto, nunca aconteceu, supostamente porque a família de Amélia não o considerava um noivo promissor. Com isso, nunca casou e nem deixou filhos.
Unindo o Parnasianismo francês à tradição portuguesa, Olavo Bilac demonstra, ao correr da pena, intimidade e destreza com o soneto. Para o pesquisador Sânzio de Azevedo, autor do livro O Parnasianismo na Poesia Brasileira ele foi "o que mais próximo chegou do rigor estético da corrente literária, com sua forma impecável", mas também um dos que dela mais se afastaram, "pelo sensualismo escaldante e pelo tom crepuscular de seus últimos versos", analisa. Para ele, A Via-Láctea é o poema de Bilac que mais expressa sua tendência ao lirismo, também influenciado pela sua declarada admiração pelos versos de Bocage, poeta português do século XVIII.
"Costumamos achar que os poetas parnasianos pregavam a "arte pela arte" e, portanto, viviam ausentes da vida cotidiana. Bilac, ao contrário, foi figura pública intimamente ligada com questões de seu tempo", lembra Suene Honorato, professora de Literatura Brasileira do curso de Letras da UFC. Olavo, inclusive, defendeu a profissionalização do escritor e colocou-se ativamente no debate político, além de ter escrito textos didáticos, crônicas jornalísticas, e a letra do Hino à Bandeira do Brasil.
Como jornalista, trabalhou em revistas e jornais e, no periódico Gazeta de Notícias, substituiu Machado de Assis na seção "Semana". Olavo, no entanto, era homem de poesia. Nas duas primeiras décadas do século XX, seus versos eram copiados de mão em mão, declamados nos saraus literários e, em pouco tempo, ganharam popularidade. Assim tornou-se conhecido poema o Via-Láctea", que, anos mais tarde, emprestou um de seus versos para a canção Divina Comédia Humana, de Belchior: "Ora (direis) ouvir estrelas! Certo/ Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto /Que, para ouvi-las, muita vez desperto/ E abro as janelas, pálido de espanto...
Tido como o maior poeta parnasiano do Brasil, Bilac foi eleito, em 1907, o "príncipe dos poetas brasileiros", em concurso lançado pela revista Fon-Fon. Esse prestígio é dado, em parte, por seu declarado amor pela língua vernácula. No famoso soneto Língua Portuguesa, inclusive, ele reencontra esta que é a "Última flor do Lácio, inculta e bela", tão amada em seu viço agreste e em seu aroma. Foi a partir dela que encontrou as bases do rigor de estilo, resultado do ofício do escritor que, longe do turbilhão da rua, "trabalha e teima, e lima, e sofre, e sua!".