Na década de 1940, durante o fervor da Segunda Guerra Mundial, a invasão japonesa à Malásia interrompeu o fornecimento de borracha para as tropas norte-americanas. Utilizada para produzir botas para os soldados, cascos de navios, pneus e tratores, a matéria-prima era indispensável para os Estados Unidos. Em um acordo com o presidente Roosevelt em 1943, Getúlio Vargas enviou cerca de 60 mil brasileiros para a região amazônica atrás do látex. Marcada por injustiças e esquecimentos, a saga dos seringueiros é documentada no longa Soldados da Borracha (2019), do cineasta cearense Wolney Oliveira. Inédito no Estado, o filme será exibido em caráter hors concours no 29º Cine Ceará hoje, às 19h30min.
Formado pela cubana Escuela Internacional de Cine y Televisión (EICTV), Wolney Oliveira é diretor do Cine Ceará - Festival Ibero-americano de Cinema. Em sua filmografia, elenca títulos premiados como A ilha da morte (2006), Elementais (1994) e Sabor a mí (1992). "Conheci a história dos combatentes através da Ariadne Araújo, que era repórter do jornal O POVO, em alguns cadernos sobre o tema em 2004. Eu tinha 44 anos de idade e foi a primeira vez que eu soube o que eram os soldados da borracha. Apesar de ser uma história importantíssima e que tem tudo a ver com o Ceará, pouca gente sabe", partilha Wolney. Naquele ano, o cineasta produziu o média Borracha para a vitória, gravado no Ceará e no Acre. Desde então, o realizador imergiu em uma minuciosa e longa pesquisa sobre os seringueiros convocados por Vargas.
"Como eu me apaixonei pelo tema, fiz questão de não mandar esse média para nenhum festival porque eu sabia que voltaria (a visitá-lo)", continua Wolney. Em 2016, o cineasta lançou o livro Soldados da Borracha: Os Heróis Esquecidos, projeto em parceria com o historiador Marcos Vinícius Neves. "Mas comecei a filmar Soldados da Borracha ainda no final de 2012 e o filme ficou pronto em abril deste ano. Foi filmando em oito regiões: Ceará, Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, Acre, Rondônia, Amazonas e Pará. Eu queria mostrar o tamanho da história. Em Brasília, eu acompanhei a PEC dos Soldados da Borracha durante três anos, filmei toda essa tramitação", explica o diretor.
Cerca de 30 mil cearenses foram convocados por Getúlio Vargas para explorar borracha na Amazônia, segundo a pesquisa de Wolney. Eles representavam metade do contingente que migrou para o norte e enfrentou má alimentação, doenças tropicais, deslocamentos penosos e uma intensa exploração trabalhista. "No primeiro ano já morreram aproximadamente 30 mil. Eles foram abandonados por Getúlio no campo de batalha da Floresta Amazônica enquanto estavam produzindo borracha para a indústria bélica. Os soldados foram dizimados", indigna-se Wolney. A palavra "revolta", aliás, permeia a construção do documentário. Apenas em 2014, o Senado aprovou uma indenização de somente R$ 25 mil para soldados da borracha sobreviventes. Sem pensão vitalícia ou demais direitos, os seringueiros convocados durante a Segunda Guerra vivenciam uma severa realidade de esquecimento.
"Até hoje, em 2019, os soldados da borracha que foram grandes heróis são injustiçados pelo governo brasileiro. Eles foram os responsáveis pela vitória dos Aliados", continua o diretor, produtor e também roteirista do longa. Premiado na 24ª edição do É Tudo Verdade - Festival Internacional de Documentários, Soldados da Borracha tem nomes como Mair Tavares na edição e DJ Dolores na paisagem sonora. "Essa era uma história perdida que ninguém conhecia. O filme é um resgate político, é um documento registrado. É de uma importância política e iconográfica imensa para os direitos humanos", finaliza o cineasta.
Soldados da Borracha no 29º Cine Ceará
De Wolney Oliveira. 2019. 82 min. Documentário. Brasil.
Quando: Hoje, 4, às 19h30min
Onde: Cineteatro São Luiz (Rua Major Facundo, 500, Centro)
Gratuito
www.cineceara.com
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