É difícil fugir da sensação de déjà vu ao ver mais uma série brasileira ambientada em comunidade carente e que passeia pelo imbróglio do tráfico de drogas. O pulo do gato de Irmandade, porém, está na construção de uma narrativa que busca humanizar os personagens a ponto de tornar difícil torcer para algum dos lados. Faz pensar se, de fato, precisa haver um torcida unificada, num paralelo de antítese com a população vibrante durante uma Copa do Mundo que é mostrada na série.
A construção da protagonista Cristina e a atuação de Naruna Costa são fundamentais para sustentar o jogo de empatia estabelecido na trama. A noção ética da personagem é totalmente flutuante e ela se mostra completamente inábil na busca por tentar passear entre polícia e ladrão sem sujar as mãos de sangue. A advogada toma decisões questionáveis o tempo inteiro e foge totalmente do estereótipo hollywoodiano de infiltrado no crime que consegue resolver as situações mais embaraçosas.
A série acerta em ritmo, os acontecimentos são encadeados com precisão e os diálogos têm pausas precisas para sustentar o clima de suspense. Há sempre uma iminência de algo muito ruim pairando aquelas vidas. O desenvolvimento da série, porém, derrapa ao "esquecer" convenientemente alguns personagens ao sabor da história. Os personagens de Hermila Guedes e Lee Taylor acabam sendo apagados em alguns momentos preciosos para a trama. Essa escolha, porém, não afeta o desenrolar da narrativa, pois Cristina, em seus erros frequentes na busca por acertar, segura com verdade. Irmandade consegue escapar do limites do "filme de favela" e falar de ética totalmente livre de maniqueísmos. (Renato Abê)