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As barreiras da Netflix até chegar ao Oscar
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João Gabriel Tréz é repórter de cultura do O POVO e filiado à Associação Cearense de Críticos de Cinema (Aceccine). É presidente do júri do Troféu Samburá, concedido pelo Vida&Arte e Fundação Demócrito Rocha no Cine Ceará. Em 2019, participou do Júri da Crítica do 13° For Rainbow.

João Gabriel Tréz arte e cultura

As barreiras da Netflix até chegar ao Oscar

Ausência quase total de vitórias da Netflix no Globo de Ouro no último domingo, 5, dificulta caminho da gigante do streaming até o tão sonhado Oscar
Filme "O Irlandês" é principal aposta da Netflix na corrida pelo Oscar 2020, onde conseguiu 10 indicações (Foto: Divulgação)
Foto: Divulgação Filme "O Irlandês" é principal aposta da Netflix na corrida pelo Oscar 2020, onde conseguiu 10 indicações

Desde que entrou na disputa das premiações, em 2014, a Netflix vem tentando conquistar vitórias em categorias centrais de importantes eventos do mundo do cinema na intenção, é claro, de poder se afirmar enquanto vencedora de um Oscar ou um Emmy frente a uma indústria que, até recentemente, lhe era resistente. Depois de questionamentos sobre a "validade" ou não de uma obra "original Netflix" poder participar de festivais e prêmios, a plataforma conseguiu sobrepor tais barreiras de maneira direta: produzindo. E muito. Após dezenas de séries e filmes lançados nos últimos anos, ela conquistou espaços que a levaram a emplacar, na atual temporada de premiações, alguns dos favoritos a figurarem na lista de indicados ao desejado Oscar. Pelas indicações ao Globo de Ouro deste ano, pelo menos, a vez da Netflix parecia ter chegado: foram 34, somando filmes e séries. No entanto, os resultados da noite do último domingo, 5, foram adversos. A plataforma saiu vencedora de apenas dois troféus, um para TV e outro para cinema. O que isso significa para as chances da empresa no principal prêmio da indústria norte-americana, que ocorre no próximo dia 9 de fevereiro, é difícil precisar.

O histórico de vitórias da Netflix no Globo de Ouro vem sendo relativamente positivo se comparado com o Oscar e o Emmy, principais eventos das indústrias do cinema e da TV, respectivamente. Vale lembrar que o corpo de votantes das premiações difere bastante entre si. Num retrospecto, as barreiras da indústria com a plataforma chegaram ao ponto do Festival de Cannes criar uma regra que proibia a seleção de filmes que não tivessem estreia nas salas de cinema da França, numa clara limitação a obras Netflix. O serviço não se abalou e apostou cada vez mais em obras "oscarizáveis" que traziam consigo, ainda, uma ideia de "ousadia" da plataforma ao financiá-las. No ano passado, foi o caso do longa mexicano Roma, de Alfonso Cuarón, que encontrou lugar e prêmios no Festival de Veneza. O diretor, reconhecido na indústria, fez com a Netflix um filme em preto e branco, falado em língua espanhola e mixteca, que trazia um recorte bem pessoal da própria vida. Bem recebido pela crítica e com repercussão junto ao público, foi indicado a 10 categorias do Oscar, incluindo Melhor Filme, mas teve que enfrentar resistências que iam da ligação com a plataforma ao fato de não ser em inglês. Acabou levando Melhor Filme Estrangeiro, Direção e Fotografia.

Em 2020, a Netflix conseguiu trazer ainda mais obras centrais nas discussões pré-Oscar. O Irlandês, de Martin Scorsese, parecia a com mais potencial. Assinado pelo diretor de 77 anos, traz parceiros do cineasta como Robert De Niro e Joe Pesci numa trama gângster que medita sobre vida e velhice. Projeto antigo de Scorsese, foi rejeitado por estúdios tradicionais até ir para Netflix, que garantiu a desejada tecnologia de rejuvenescimento via efeitos especiais, prevista na produção para que os já idosos atores pudessem interpretar as personagens centrais em diferentes fases da vida. Neste sentido, a plataforma se destaca por ter sido ela a concretizar o projeto do adorado Scorsese. Em movimentos paralelos, a empresa passou, há alguns anos, a organizar lançamentos limitados de suas obras originais em salas de cinema nos EUA e outros países, como o Brasil, revelando abertura. Envolto nessas narrativas, O Irlandês parecia poder ser o primeiro longa da plataforma a ganhar um Oscar.

A corrida pelo prêmio em 2020, porém, está bastante específica. A temporada parece estar ainda em aberto, sem um franco favorito, apresentando chances mais ou menos concretas para filmes como Parasita, longa sul-coreano que conquistou plateias pelo mundo todo; Era Uma Vez... Em Hollywood, homenagem de Quentin Tarantino à indústria; 1917, o filme de guerra que pouca gente já viu, mas que recebeu dois troféus no Globo de Ouro; O Irlandês; e o também original Netflix História de Um Casamento - isso sem falar de possíveis surpresas que podem ser abraçadas pela Academia de Hollywood, como Adoráveis Mulheres e O Escândalo. Se a discussão sobre a "validade" de um filme da empresa parece ultrapassada, o que as barreiras encontradas até a estatueta dourada dizem sobre a produção original da plataforma? Pouco.

Guardadas as devidas proporções, a Netflix vem se comportando como um grande estúdio, produzindo ora comédias românticas descompromissadas, ora filmes de ação e ora produções que têm perfil de arrebatar prêmios pelo mundo. O caminho, portanto, vai depender, como sempre, de timing, política, campanha e contexto. A divulgação das indicações do Oscar na próxima segunda, 13, vai ajudar a apontar por que trilhas ele seguirá.

 

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