João Gabriel Tréz é repórter de cultura do O POVO e filiado à Associação Cearense de Críticos de Cinema (Aceccine). É presidente do júri do Troféu Samburá, concedido pelo Vida&Arte e Fundação Demócrito Rocha no Cine Ceará. Em 2019, participou do Júri da Crítica do 13° For Rainbow.
Ausência quase total de vitórias da Netflix no Globo de Ouro no último domingo, 5, dificulta caminho da gigante do streaming até o tão sonhado Oscar
Desde que entrou na disputa das premiações, em 2014, a Netflix vem tentando conquistar vitórias em categorias centrais de importantes eventos do mundo do cinema na intenção, é claro, de poder se afirmar enquanto vencedora de um Oscar ou um Emmy frente a uma indústria que, até recentemente, lhe era resistente. Depois de questionamentos sobre a "validade" ou não de uma obra "original Netflix" poder participar de festivais e prêmios, a plataforma conseguiu sobrepor tais barreiras de maneira direta: produzindo. E muito. Após dezenas de séries e filmes lançados nos últimos anos, ela conquistou espaços que a levaram a emplacar, na atual temporada de premiações, alguns dos favoritos a figurarem na lista de indicados ao desejado Oscar. Pelas indicações ao Globo de Ouro deste ano, pelo menos, a vez da Netflix parecia ter chegado: foram 34, somando filmes e séries. No entanto, os resultados da noite do último domingo, 5, foram adversos. A plataforma saiu vencedora de apenas dois troféus, um para TV e outro para cinema. O que isso significa para as chances da empresa no principal prêmio da indústria norte-americana, que ocorre no próximo dia 9 de fevereiro, é difícil precisar.
O histórico de vitórias da Netflix no Globo de Ouro vem sendo relativamente positivo se comparado com o Oscar e o Emmy, principais eventos das indústrias do cinema e da TV, respectivamente. Vale lembrar que o corpo de votantes das premiações difere bastante entre si. Num retrospecto, as barreiras da indústria com a plataforma chegaram ao ponto do Festival de Cannes criar uma regra que proibia a seleção de filmes que não tivessem estreia nas salas de cinema da França, numa clara limitação a obras Netflix. O serviço não se abalou e apostou cada vez mais em obras "oscarizáveis" que traziam consigo, ainda, uma ideia de "ousadia" da plataforma ao financiá-las. No ano passado, foi o caso do longa mexicano Roma, de Alfonso Cuarón, que encontrou lugar e prêmios no Festival de Veneza. O diretor, reconhecido na indústria, fez com a Netflix um filme em preto e branco, falado em língua espanhola e mixteca, que trazia um recorte bem pessoal da própria vida. Bem recebido pela crítica e com repercussão junto ao público, foi indicado a 10 categorias do Oscar, incluindo Melhor Filme, mas teve que enfrentar resistências que iam da ligação com a plataforma ao fato de não ser em inglês. Acabou levando Melhor Filme Estrangeiro, Direção e Fotografia.
Em 2020, a Netflix conseguiu trazer ainda mais obras centrais nas discussões pré-Oscar. O Irlandês, de Martin Scorsese, parecia a com mais potencial. Assinado pelo diretor de 77 anos, traz parceiros do cineasta como Robert De Niro e Joe Pesci numa trama gângster que medita sobre vida e velhice. Projeto antigo de Scorsese, foi rejeitado por estúdios tradicionais até ir para Netflix, que garantiu a desejada tecnologia de rejuvenescimento via efeitos especiais, prevista na produção para que os já idosos atores pudessem interpretar as personagens centrais em diferentes fases da vida. Neste sentido, a plataforma se destaca por ter sido ela a concretizar o projeto do adorado Scorsese. Em movimentos paralelos, a empresa passou, há alguns anos, a organizar lançamentos limitados de suas obras originais em salas de cinema nos EUA e outros países, como o Brasil, revelando abertura. Envolto nessas narrativas, O Irlandês parecia poder ser o primeiro longa da plataforma a ganhar um Oscar.
A corrida pelo prêmio em 2020, porém, está bastante específica. A temporada parece estar ainda em aberto, sem um franco favorito, apresentando chances mais ou menos concretas para filmes como Parasita, longa sul-coreano que conquistou plateias pelo mundo todo; Era Uma Vez... Em Hollywood, homenagem de Quentin Tarantino à indústria; 1917, o filme de guerra que pouca gente já viu, mas que recebeu dois troféus no Globo de Ouro; O Irlandês; e o também original Netflix História de Um Casamento - isso sem falar de possíveis surpresas que podem ser abraçadas pela Academia de Hollywood, como Adoráveis Mulheres e O Escândalo. Se a discussão sobre a "validade" de um filme da empresa parece ultrapassada, o que as barreiras encontradas até a estatueta dourada dizem sobre a produção original da plataforma? Pouco.
Guardadas as devidas proporções, a Netflix vem se comportando como um grande estúdio, produzindo ora comédias românticas descompromissadas, ora filmes de ação e ora produções que têm perfil de arrebatar prêmios pelo mundo. O caminho, portanto, vai depender, como sempre, de timing, política, campanha e contexto. A divulgação das indicações do Oscar na próxima segunda, 13, vai ajudar a apontar por que trilhas ele seguirá.
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