A Secretaria de Cultura do Estado do Ceará (Secult) divulgou o resultado do edital emergencial do Festival Cultura Dendicasa: Arte de Casa para o Mundo, na última segunda-feira, 20. Com o objetivo de auxiliar os artistas cearenses durante o isolamento social, o certame selecionou 400 projetos no formato digital. O resultado, entretanto, causou divergências entre os profissionais.
Um dos pontos mais criticados foi a escolha de pessoas que supostamente não necessitam do dinheiro, principalmente, por terem outra renda. A cantora e artista visual Karine Alexandrino, por exemplo, não participou, mas se solidariza com os que não passaram. "O critério para passar, para contemplar, deveria ter sido mais humano. Deveriam ter considerado mais detalhes, porque é o que é necessário no momento que a gente está passando", avalia.
De acordo com Luisa Cela, secretária executiva da Secult, a avaliação foi realizada nas condições que eram possíveis. "Esse grau de vulnerabilidade foi visto dentro do que dava para observar no que estava posto. A gente tem certeza que, de fato, um grande grupo ficou de fora", considera.
O edital também exigia que produções fossem realizadas em um período de dez dias, especificamente durante a quarentena. O objetivo é, com esses projetos, fazer uma programação nas plataformas digitais entre maio e junho deste ano. No entanto, além do prazo considerado curto, alguns artistas não possuíam equipamentos de qualidade para elaboração dos conteúdos. "Teve gente que se inscreveu perto de meia noite porque estava ajudando uns aos outros. Gente que não tinha um celular adequado. Uma pessoa que sabe mexer com equipamentos, quer o dinheiro na hora. Imagina pagar pelo aparato sem dinheiro", relata Karine. Para ela, no primeiro momento deveria ter sido feita uma descrição do projeto e, em seguida, realizar a produção já com o suporte financeiro.
Luisa Cela argumenta que o edital solicitou o trabalho finalizado pelo caráter emergencial, de apoio rápido à classe artística. A qualidade, que foi um critério de seleção, também foi vista sob as condições atuais de isolamento. "Os produtos nasceram dentro dessa mesma condição. A perspectiva de receber o produto pronto foi uma metodologia de agilizar o edital. Se não fosse assim, íamos ter que ter um plano de trabalho, que mostrasse a aplicação do recurso", afirma.
Sobre a agilidade, também há questionamentos. "Entendo que o edital foi emergencial, que existe limitações e regras, mas ele não atende à sua natureza de emergencialidade. Entramos na quarentena no começo de fevereiro, já estamos acabando abril. Quem depende de renda mês a mês está vivendo de caridade", diz Talles Azigon, poeta, produtor cultural e criador da Biblioteca Comunitária Livro Livre Curió. O edital foi iniciado no dia 31 de março, duas semanas depois do decreto de isolamento social no Ceará, e terá homologação do resultado final nesta segunda, 27. A abertura dos processos dos termos de cooperação financeira e repasse acontecerão até 30 de maio. "O edital é uma ação isolada, que não veio com outras ações conjuntas. Um milhão de reais é bem pouco, se você imaginar todos os equipamentos fechados. Ou seja, não chega nem perto da perda econômica do setor. A economia da cultura foi esquecida, pois ela não vive apenas de cachês", critica Talles. Para ele, os centros culturais não deveriam ter parado.
Luísa Cela afirma que reuniões estão sendo feitas para discutir como continuar a programação dos equipamentos da Secretaria de Cultura do Estado do Ceará. Maneiras de normalizar os eventos por meio das plataformas digitais estão em questão. "Temos uma responsabilidade com o orçamento do Estado. Estamos estudando o formato de retomada da programação. Teremos outros artistas contratados, que não foram contemplados no edital emergencial. Temos tido reuniões sistemáticas para estudar esse ambiente", garante. (Clara Menezes/ Especial para O POVO)