Há filmes que são óbvios em sua essência. O coração partido, a lição aprendida, as situações vexatórias e o conto de fadas perpassam uma infinidade de produções. Mas a obviedade não quer dizer falta de encantamento ou ausência de discussão. Ricos de Amor - produção original brasileira que estreia hoje na Netflix - é um desses filmes que encanta por utilizar o óbvio ao seu favor. Na trama temos o playboy Teto - vivido por Danilo Mesquita, uma espécie de Noah Centíneo com o charme brasileiro - e a estudante de medicina Paula - interpretada pela queridinha atriz Giovanna Lancellotti. O POVO teve acesso ao longa-metragem antes da obra audiovisual ser disponibilizada para os assinantes.
Teto mantém uma vida fútil em uma fazenda do interior - regada a carros blindados, encontros casuais, dinheiro da família e shows do DJ Alok. O pai, Teodoro, vivido por Ernani Moraes, é dono de um império de plantações de tomate. É uma vida tão fútil e obsoleta quanto frágil. Paula, por sua vez, é a personagem centrada e batalhadora - que tem a solidez nos atos. Como se fossem ímãs, esses dois opostos se atraem logo no primeiro encontro. O jovem parte em uma jornada ao Rio de Janeiro para encontrar esse amor e participar de uma seleção de trabalho na empresa do próprio pai. É nesse ponto que Ricos de Amor entrega seus melhores artefatos.
Com sequências cômicas e algumas reviravoltas - Teto e seu melhor amigo, Igor, vivido por Jaffar Bambirra, resolvem inverter os papéis. Mas o que acontece quando o filho do chefe esconde essa posição? Como é a ótica do mundo exterior quando os seus privilégios históricos são camuflados? Como um processo pode ser justo quando há uma distinção escancarada? Ricos de Amor dá uma lição sobre a falência da meritocracia e sobre como as fortunas estão passando de mão em mão há décadas.
"A mensagem que o filme passa para o espectador é o lugar da meritocracia. Na hora de escolher entre o menino do interior e o filho do dono da empresa, se escolhe o filho do dono. Mesmo que os dois tenham o mesmo nível", explica o ator Jaffar Bambirra em entrevista ao O POVO. Igor em si é um dos méritos de Ricos de Amor: lúcido, pragmático e leve. Os personagens que circulam o casal principal, aliás, endossam a trama e garantem a bossa. Junto de Igor há Alana, vivida pela veterana Fernanda Paes Leme, que faz sua estreia na "Dona Netflix" - como ela costuma chamar.
"Ela trabalha em um mercado pautado pela desigualdade de gêneros. A mulher no mercado de trabalho sofre as distorções de salário. Ainda passamos por isso em 2020. É impressionante. Essa luta feminista vem lá de trás, ainda segue e seguirá", explica Fernanda durante entrevista ao O POVO. Ao fim, Alana é uma das responsáveis pela quebra de expectativas e pela "virada de chave" do filme. A outra personagem que se destaca é a batalhadora Monique, vivida pela multiartista Lellê, que garante a voz da sabedoria nos momentos mais sensíveis dos protagonistas.
Ricos de Amor é uma produção leve o suficiente para entreter e fazer refletir. Uma boa pedida para os tempos de isolamento social.
Isabel Costa é jornalista e mediadora de leituras
Ricos de Amor
Direção de Bruno Garotti
Roteiro de Sylvio Gonçalves e Bruno Garotti
Produção de Julio Uchôa
Disponível a partir desta quinta-feira, 30 de abril