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CachoeiraDoc realiza "Festival Impossível, Curadoria Provisória", que discute o presente a partir do cinema
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João Gabriel Tréz é repórter de cultura do O POVO e filiado à Associação Cearense de Críticos de Cinema (Aceccine). É presidente do júri do Troféu Samburá, concedido pelo Vida&Arte e Fundação Demócrito Rocha no Cine Ceará. Em 2019, participou do Júri da Crítica do 13° For Rainbow.

João Gabriel Tréz arte e cultura

CachoeiraDoc realiza "Festival Impossível, Curadoria Provisória", que discute o presente a partir do cinema

Experiência "Festival Impossível, Curadoria Provisória" disponibiliza curtas para refletir e discutir as inquietações que se impõem à atividade curatorial e ao mundo no contexto atual
Tipo Notícia
Dirigido por Yasmin Thayná,
Foto: divulgação Dirigido por Yasmin Thayná, "Fartura" retoma imagens de arquivo de refeições para falar da vida em comum

A primeira edição do CachoeiraDoc, festival de documentários realizado no município baiano de Cachoeira, ocorreu há 10 anos. Naquele contexto, havia sido recém-aberto na cidade o curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), instituição-marco de acesso e descentralização de educação e cultura em uma região com fortes resquícios da colonialidade. Parecia abrir-se, então, "um caminho novo de futuro". No entanto, a história se deu e, em 2020, pergunta-se: que futuro? Com o ensino público e o cinema atacados e precarizados pelo atual governo federal, a realização do CachoeiraDoc foi descontinuada a partir de 2018. No fim de 2019, intentou-se retomar o traçado de futuros possíveis e foi iniciado um trabalho de retorno do evento. No caminho, o imponderável aconteceu e um há pouco impensável vírus trouxe imperativos práticos consigo. Esses contextos ajudam a compreender a realização, de hoje, 26, a domingo, 31, da experiência Festival Impossível, Curadoria Provisória.

"Experiência" porque, conforme explica a professora da UFRB e idealizadora do CachoeiraDoc Amaranta César, ela não é uma mostra coletiva e nem mesmo a nona edição do festival. Explique-se: com o desejo da retomada, ainda em 2019, foi aberta uma convocatória para curadores do Brasil dispostos a construírem em conjunto o IX CachoeiraDoc. Foram escolhidas oito pessoas - Evelyn Sacramento, Fabio Rodrigues, Álex Antônio, Otávio Conceição, que têm passagem pela UFRB, Rayanne Layssa, Ramayana Lira, Patrícia Mourão e Kênia Freitas -, para compor a equipe curatorial.

O grupo, porém, se viu implicado pelo "imperativo do vírus". "A gente ficou tentando entender o que ia acontecer. Estabelecer uma nova data não era uma possibilidade. Ao mesmo tempo, seria muito ruim não agir no presente", explica Amaranta. A possibilidade de uma edição virtual foi pensada, mas uma investigação prática e necessária sobre as condições de internet em Cachoeira revelou precariedade. "Temos uma realidade de desigualdade de acesso à tecnologia e exclusão digital que afeta a comunidade cachoeirana e da UFRB. Nem todo mundo tem banda larga, Wi-Fi ou 4G que permita ficar em casa vendo filme, interagindo e dialogando pela internet. A realidade também impunha, nesse sentido e nesse momento - como sempre impôs -, seus imperativos, necessidades e limitações que dizem respeito, efetivamente, a essa ferida histórica da desigualdade, da injustiça social”, ressalta a professora.

No entanto, pelo desejo expresso de "agir no presente", a equipe discutiu possibilidades a partir das impossibilidades e, após reuniões e conversas, chegou no formato do Festival Impossível, Curadoria Provisória. "Cada um na sua casa, com questões próprias, trouxe pra gente um filme a partir de uma inquietação: como ele pode nos fazer olhar para esse momento ou como esse momento pode nos fazer 'reolhar' para ele? A gente não fez um grupo curatorial homogêneo, que responde a uma inquietação ou necessidade. É bem heterogêneo em tempo de experiência, formação e marcadores histórico-sociais", afirma Amaranta.

Os filmes escolhidos pelas curadoras e curadores estarão, junto de textos escritos por cada um, disponíveis no site do CachoeiraDoc ao longo da realização da iniciativa. Nos dias 30 e 31, às 17 horas, a equipe participa de encontros virtuais e abertos para debater a atividade curatorial. "O trabalho de curadoria do CachoeiraDoc continua - nessa temporalidade nova, com imperativos de incerteza - e enquanto isso estamos trazendo alguns filmes que podem nos ajudar a pensar. O que pode um filme? O que é esse momento? A curadoria lida com a etimologia da palavra que tem a ver com a noção de cura. O que é exatamente essa atividade confrontada com a literalidade radical da busca pela cura? Parece uma atuação metafórica, mas tem uma dimensão material. Como pensar, fora da poética, da metáfora, essa ideia de cura implicada na ideia de curadoria?", enumera Amaranta.

"Há algum tempo sentimos que o futuro está ameaçado, incerto. Me parece que a pandemia materializa esse sentimento difuso que eu e outras pessoas já tínhamos, o de 'o que será de nós?'. Há necessidade de tramar e retomar uma perspectiva de futuro para as nossas mãos", afirma. A procura, decerto, não é por nada rápido ou definitivo. "Tem um ditado popular baiano que diz 'cada dia, sua agonia'. Previsões parecem muito difíceis de serem feitas. A possibilidade de reorganização da cultura e reativação cultural é tão grande que ela não morre. Ela agoniza, mas se reinventa", acredita Amaranta.

Filmes disponíveis

"À beira do planeta mainha soprou a gente", de Bruna Barros e Bruna Castro

"Fartura", de Yasmin Thayná

"Relatos Tecnopobres", de João Batista Silva

"New York, just another city", de André Lopes e Joana Brandão

"Teko Haxy - ser imperfeita", de Patrícia Ferreira Pará Yxapy e Sophia Pinheiro

"Rebu - A Egolombra de uma Sapatão Quase Arrependida", de Mayara Santana

"Thinya", de Lia Letícia

"Tipoia", de Paulo Silver

"Trindade", de Rodrigo R. Meireles

Acesse em www.cachoeiradoc.com.br/festivalimpossivel/

 

Foto do João Gabriel Tréz

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