Compreender a conjuntura brasileira não tem sido fácil nem para os mais bem-intencionados observadores. O ritmo frenético de crises que se intercalam, a inclusão de novos atores sociais e a redefinição dos termos do debate público tornaram a política brasileira um território hostil, com tendências de difícil interpretação.
Se, por um lado, a realidade se impõe em toda sua complexidade, nunca houve tanto desejo por informações. A demanda, muito bem percebida pelo mercado editorial, se concentra em análises fundamentadas, de preferência com vocabulário acessível a um leitor não especializado. Pensando nesse público politizado e exigente, as editoras nacionais têm investido no lançamento de títulos que possam trazer luz sobre a compreensão da crise política. Mapear esses livros e adentrar em suas páginas pode ser um ótimo recurso para tentar dar ordem ao caos. Adam Przemworski, autor de "Crises da Democracia" (Editora Zahar), sintetiza o desafio interpretativo: identificar as causas dos desgastes recentes à cultura democrática é uma tarefa que inspira mais perguntas que respostas.
Como primeiro passo, a análise assinada por Maurício Moura e Juliano Corbellini no livro "A eleição disruptiva" é um bom caminho para compreender o resultado das últimas eleições presidenciais. Fugindo à regra dos sistemas eleitorais majoritários, saiu vitoriosa no Brasil uma chapa marcada pelo extremismo de seu discurso. Entender esse sucesso à luz de uma leitura atenta de dados estatísticos é o objetivo do livro escrito em co-autoria e publicado pela Editora Record. Seu argumento dialoga diretamente com outro ensaio indispensável, de autoria de Giuliano da Empoli: no livro "Os engenheiros do caos" (Vestígio/Autêntica) o italiano lança luz sobre como o uso generalizado de fake news, conspirações e algoritmos tem embaralhado as disputas eleitorais pelo Ocidente.
Para quem não teve fôlego de acompanhar a cronologia da crônica política, o livro de Thaís Oyama, "Tormenta - Governo Bolsonaro: crises, intrigas e segredos", lançado pela Companhia das Letras, é um ótimo exemplar de como o jornalismo investigativo pode se utilizar de virtudes narrativas para apresentar uma intricada história. Na obra, o leitor acompanha a reconstrução em prosa fluente dos principais acontecimentos que marcaram a formação do governo Bolsonaro e suas crises em 2019. É um livro despretensioso, mais narrativo que analítico, e pode ajudar a quem está perdido no mapeamento dos fatos.
O mais recente ensaio de Marcos Nobre, "Ponto Final - A guerra de Bolsonaro contra a democracia", recém-publicado pela Editora Todavia, já apresenta ao leitor confinado em quarentena uma visão de como a pandemia do coronavírus colabora para o agravamento da conjuntura. Em versão digital, o livro integra uma série de ensaios prometidos pela editora sobre os efeitos da crise global de saúde pública nos mais variados campos da esfera pública.
Nobre explica a aderência de diversos setores sociais à candidatura de Bolsonaro e alerta para as ameaças que um projeto político autoritário pode oferecer às instituições democráticas. É um ensaio bem construído, com uma análise atenta sobre os aspectos sociológicos e políticos ligados a uma tendência que já se anuncia no país há alguns anos. A competência analítica do autor vale a leitura, apesar do tom excessivamente pessimista de suas conclusões.
Se as leituras não trouxerem para o leitor respostas conclusivas para suas dúvidas, não há problema: a maior virtude dos ensaios é a de ajudar a refinar nossas perguntas sobre as raízes e as possíveis saídas da crise em que nos debatemos.
Juliana Diniz é professora da Universidade Federal do Ceará (UFC)
Títulos indicados:
A ELEIÇÃO DISRUPTIVA
DeMaurício Moura e Juliano Corbellini
Editora Record
TORMENTA - GOVERNO BOLSONARO: CRISES, INTRIGAS E SEGREDOS
DeThaís OyamaA
Companhia das Letras
OS ENGENHEIROS DO CAOS
De Giuliano da Empoli
Editora Vestígio/Autêntica
PONTO FINAL - A GUERRA DE BOLSONARO CONTRA A DEMOCRACIA
De Marcos Nobre
Editora Todavia
CRISES DA DEMOCRACIA
De Adam Przeworski
Editora Zahar