"Quero vê-la sorrir/ quero vê-la cantar/ quero ver o seu corpo/ dançar sem parar". Quem já se divertiu ao som desses versos certamente guarda uma lembrança afetiva (ou pelo menos irreverente) envolvendo o cantor carioca Sidney Magal, ícone de um Brasil que, nos anos 1970, era ouvido nas rádios e aplaudido nos programas de auditório. Nessa sexta, 19, Sidney completou 70 anos. Com performances inusitadas, figurinos excêntricos e dança sensual, o artista sex symbol que causou frenesi no público feminino nos anos 1970 alcançou os 50 anos de carreira recentemente e continua embalando gerações de fãs. A história do cantor e de seu relacionamento com de 41 anos com Magali West será tema de um filme musical, "Meu Sangue Ferve Por Você" ainda em fase de produção. O longa terá direção do cineasta Paulinho Machline. O ator José Loreto interpreta Sidney no filme, que teve sua estreia adiada para 2021.
O cigano e a jornalista
Quando a jornalista Ian Gomes conheceu as músicas de Sidney Magal pela primeira vez, tinha 12 anos e vivia em Senador Pompeu (230 km de Fortaleza). "Fui passar férias no sítio da minha tia, em Solonópole, e foi lá que, em um rádio antigo, ouvi pela primeira vez 'O meu sangue ferve por você'. De cara eu fiquei encantada", relembra. De volta à cidade natal, Ian passou a buscar em todas as bancas de revista algum registro do seu mais novo ídolo, e encontrou um folheto com a letra de uma de suas músicas, acompanhado de uma pequena foto de Sidney. "Me apaixonei, ele era um homem lindo, né?", brinca a jornalista.
Na TV em preto e branco da casa dos pais, Ian assistiu a uma apresentação do ídolo pela primeira vez no Programa do Chacrinha. Aos 14 anos, começou a colecionar diversas revistas em que Magal era destaque. "Eu fazia meus irmãos comprarem todas pra mim", recorda. Ian começou a montar um álbum dedicado às lembranças com o artista. Ao mesmo tempo que a admiração crescia, ela fazia a diversão das festas da escola com dublagens e performances hilárias de "Sandra Rosa Madalena".
A fama de "cigano" durou até 1980, quando passou a viver um período de ostracismo na mídia. Dez anos depois, fez sucesso com a música "Me Chama Que Eu Vou", tema da novela Rainha da Sucata.
Foi nesse período que, já em Fortaleza e recém formada em jornalismo, Ian teve a oportunidade de ver Sidney pessoalmente pela primeira vez. Ela era repórter da Rádio O POVO e estava na cobertura de um show que contava com a participação do cantor, no Ginásio Paulo Sarasate. "Ele tava lá, lindíssimo, foi simpaticíssimo comigo. Eu estava como profissional, não como fã, mas não perdi a chance de fazer uma foto com ele", diz a jornalista, que também tem diversos discos de Magal ainda guardados em casa.
Ainda como repórter da Rádio O POVO, Ian teve outra oportunidade de entrevistá-lo, dessa vez por telefone. "Eu disse pra ele: tenho um álbum com tudo registrado da sua carreira, um dia vou te mostrar". A oportunidade chegou em 2015, quando Sidney esteve na Capital e ela pôde entrevistá-lo mais uma vez, para uma emissora de TV local. "Mostrei pra ele o álbum que eu guardava, ele ficou louco pelas lembranças. Ele autografou, foi incrível", lembra Ian.
Uma das lembranças mais cômicas envolvendo sua paixão pelo artista aconteceu na adolescência de Ian, em Senador Pompeu. Enquanto ouvia a rádio Cristal de Quixeramobim, escutou bem o locutor anunciar: "Daqui a pouco teremos entrevista com Sidney Magal, aguardem". "Eu enlouqueci! Chamei meus irmãos pra ir até Quixeramobim e nos mandamos pra lá, às pressas", recorda. Quando chegou à cidade, Ian saiu correndo em direção à rádio, aos prantos, perguntando onde estava Sidney. O radialista, brincando com a ingenuidade de Ian, disse que ele havia acabado de ir embora. "Eu dei um escândalo, mas depois ele me explicou que ele nunca esteve lá, que a entrevista na verdade era só uma gravação com as respostas dele. Voltei pra casa arrasada", lembra aos risos. (Ivig Freitas/Especial para O POVO)
Sósia por brincadeira
Além de cantor, Sidney também trabalhou em cinema com o filme “Amante Latino” (1979), em que interpretava a si próprio. A maioria de seu público era feminino, que ao final de cada show “atacava” o ídolo, buscando levar seus pedaços da roupa como recordação. Embora nunca tenha assistido uma apresentação ao vivo do artista, a jornalista Rozanne Quezado tem muitas lembranças cômicas que foram embaladas por suas músicas. “Sempre gostei de ouvir ele, desde pequena, e uma vez, por brincadeira, comecei a imitá-lo e a dizer que eu era a “Sidnete Magali”. Aí, nas festas com os amigos, sempre me pediam para 'bailar' Sandra Rosa Madalena, e isso virou rotina”, brinca.
O mais curioso da história é que, embora seja conhecida pelos amigos pela sua versão feminina para Magal, Rozanne - a “Sidnete Magali” - é uma pessoa bastante reservada. “Imagina a cara de alguns amigos que me conhecem sempre quietinha, de repente me veem dançando como louca o Sidney Magal... A reação deles é de espanto total”, brinca. As imitações nas festas dos amigos começaram por volta dos anos 2000. “Uma amiga, que comemorava o aniversário (o dia inteiro e noite adentro) numa barraca da praia do Futuro, já deixava um palco armado para apresentação da Sidnete Magali. Era muita diversão”, lembra Rozanne.
Mesmo quando não está com os amigos, Rozanne admite que é impossível ouvir o Sidney “sem tentar dar uns passinhos de dança”. “E ele, de uma certa forma, incorpora essa atmosfera, essa força que a música passa. É como se ele fosse a própria música. Muitas vezes, me pego cantando baixinho uma das músicas dele e isso me eleva o espírito, me dá vontade de dançar ou, pelo menos, me mexer um pouco. Porque essas músicas mexem com a gente em todos os sentidos. E ele, como intérprete incorporou bem essa emoção e, por isso, acredito, não é esquecido”, opina. “Gosto todas as músicas dele que bailam, mas Sandra Rosa Madalena é a preferida. Outra que danço muito, e sempre causa graça pra pessoas, é “Se te agarro com outro te mato…”, conclui Rozanne, que atualmente mora em Buenos Aires.
Meio brasileiro, meio argentino
Muitas cenas do filme Amante Latino (1979), de Pedro Carlos Rovai, reforçam o mito que circulou no Brasil de que Sidney Magal era cigano. A ideia partiu do produtor do filme, Roberto Livi, que era argentino e se inspirou no cigano cantor Sandro de América, sucesso em seu país. Sandro é mais conhecido pela segunda fase de sua carreira, que teve início em 1967 e é marcada por interpretações românticas e sensuais. Magal, aqui no Brasil, gravou versões em português das músicas Tengo (Tenho) e Sandra Rosa Madalena. A clara semelhança de estilo entre os dois, afinal, não é mera coincidência. O lançamento de Sidney Magal no Brasil foi uma forma que a gravadora RCA brasileira encontrou para rebater a filial argentina, que que estava se vangloriando do sucesso de Sandro em toda a América Latina.