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"Expedição Planta Baixa" experimenta os limites do teatro e do morar
Vida & Arte

"Expedição Planta Baixa" experimenta os limites do teatro e do morar

A partir da multiplicidade de imagens de intimidade, experimento cênico "Expedição Planta Baixa" propõe nova relação de olhar para as casas
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Foto: divulgação "Expedição Planta Baixa" nasce da união de cinco artistas com diferentes frentes de atuação

"Eu plantado no alto em mim/ Contemplo a ilusão da casa/ As imagens enchem tudo/ Vivem enquanto falo", versa a canção "A Ilusão da Casa", composta pelo gaúcho Vitor Ramil. A cena montada pelos versos sugere um olhar externo lançado a si mesmo. A ideia alinha-se em determinado grau aos movimentos e percepções propostos pelo experimento cênico "Expedição Planta Baixa", do Coletivo Projeto Casa. Com direção do encenador e professor da UFC Francis Wilker, dramaturgia de Renato Abê, performances de Loreta Dialla e Jander Alcântara e técnica do designer Gomes Avilla, o projeto divide reflexões sobre a construção de memórias e afetos a partir do contexto de isolamento com sua proliferação de imagens. A experiência virtual acontece amanhã e quarta, às 20 horas, de forma gratuita, mas demanda inscrição.

O grupo que se uniu na construção de "Expedição Planta Baixa" não havia, até então, desenvolvido projetos em conjunto e teve uma primeira experiência de modo totalmente virtual. "O desejo foi se mostrar aberto a experimentar possibilidades de criação apesar da pandemia, apesar da suspensão do encontro físico, do abraço. Queríamos poder jogar/brincar com as plataformas, saber como dar expressão às nossas sensações sobre os dias que correm", estabelece Francis.

A criação se equilibrou entre a coletividade e o afastamento e foi a partir daí, inclusive, que as questões práticas e simbólicas que envolvem a ideia de "lar" passaram a ter papel crucial no desenvolvimento do projeto. "O primeiro movimento dramatúrgico do experimento partiu da vontade de vasculhar a casa de cada um para pensar, nelas, que materiais, provocações e dispositivos surgiam. Olhar para as casas e repensar seus usos foi um primeiro trampolim para pensar o que queríamos investigar", afirma Renato.

Pelo imperativo imposto pela pandemia, a casa passou a ter papel múltiplo, conflitante: ora se apresenta como refúgio, ora como prisão. "Estamos restritos aos metros quadrados de nossas casas e lidando com a angústia em relação ao futuro, a revolta e apreensão com a situação política e com essa energia de morte e dor que o País atravessa. Então, o trabalho é uma viagem para dentro de nossas casas e também de nós mesmos, porque a ideia de casa ultrapassa materiais como tijolo e concreto, tem uma forte dimensão simbólica associada às memórias, emoções, afetos", dialoga Francis.

"A casa sempre esteve atrelada às (nossas) proposições, aí misturamos um pouco a planta baixa da casa friccionando às nossas próprias plantas baixas. Em certo momento a gente percebeu que as nossas memórias e as das casas acabam se fundindo", relaciona Jander. "Um ponto que saltou desse primeiro movimento e que se reflete na dramaturgia, é essa vontade de tirar do canto algumas certezas que a gente tem sobre essas casas e pensar também como a casa olha pra gente. Quando a gente está na cama, como a casa observa a gente deitado? Enquanto a gente vasculha nossas memórias e as guarda em nossos locais de segurança, como a casa observa o movimento?", aprofunda Renato.

O giro do olhar proposto pelo projeto passa, também, pela forma e uso de dispositivos no registro do experimento cênico. "As linguagens artísticas estão sempre se tocando, se contaminando e a arte contemporânea é um campo aberto e desejoso desses atravessamentos", considera Francis. "Pra mim, a dificuldade está em lidar com outra linguagem e ferramentas que não domino. Pensar na captura da imagem e na sua transmissão mediada por esses dispositivos envolve adentrar outro vocabulário, descobrir um mundo que faz emergir muitas questões ricas para a pesquisa no campo do teatro", avalia.

A experiência geral, enfim, dá-se a partir de um jogo de aberturas e indefinições. "O que fiz foi me abrir como artista a experimentar esse encontro com uma câmera de celular, o assombro que é estar a mercê das variações de conexão da rede de internet. Foi bastante desafiador experimentar o jogo com esses outros materiais e suas possibilidades poéticas. Nesse curto processo de experimentação, saio com mais perguntas do que entrei e interessado nas respostas que diferentes artistas das artes da cena estão dando aos desafios desse momento", elabora o encenador. "Na expedição que a gente começou a viver por dentro das casas, pensando suas geografias e reinventando-as, a gente entendeu também que não tinha muita certeza. O que a gente tem são hipóteses", ecoa Renato.

"Expedição Planta Baixa", do Coletivo Projeto Casa

Quando: dias 7 e 8 de julho, às 20 horas
Para assistir: enviar nome para expedicaoplantabaixa@gmail.com até 6/7, às 18 horas

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