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Filme turco "O Conto das Três Irmãs" divide incomodo das personagens com o público
Vida & Arte

Filme turco "O Conto das Três Irmãs" divide incomodo das personagens com o público

Acompanhando o reencontro de uma família pobre marcada por frustrações e segredos, filme "O Conto das Três Irmãs" estende o sentimento incômodo ao espectador
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Longa turco dirigido por Emin Alper,
Foto: divulgação Longa turco dirigido por Emin Alper, "O Conto das Três Irmãs" disputou o Festival de Berlim em 2019

A grande problemática do filme turco "O conto das três irmãs" já ocorreu antes mesmo dele começar. O que se tem acesso a partir da obra são as consequências dos processos anteriores daquele universo fictício. Sem explicações ou contextos que elucidem didaticamente tudo de uma vez, é pelas reações, diálogos e eventuais confidências trocadas entre as personagens que o espectador pode ir montando o cenário pregresso. Em um resumo inicial possível, o filme acompanha o reencontro de três irmãs de uma pobre família do interior da Turquia que, após terem sido mandadas para a cidade para servir a uma família rica, voltam a morar com o pai na afastada vila por conta de distintos problemas. Sustentado basicamente por boas atuações e bonitas paisagens, o filme traz consigo uma constante sensação de que não se cumpre - talvez num jogo de linguagem que replique a própria trajetória das protagonistas.

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A primeira cena do longa é o retorno de Havva, irmã mais nova, que chega novamente na vila por circunstâncias alheias a ela. A adolescente reencontra a irmã mais velha, Reyhan, que já havia sido mandada para casa meses antes por ter engravidado. Finalmente, a intempestiva irmã do meio, Nurhan, acaba voltando por ter agredido um dos filhos do patrão. Na casa, somam-se às três o pai, viúvo, e o marido de Reyhan, com quem ela se casou para abafar a gravidez.

O recorte narrativo do filme é, justamente, a nova reunião da família na vida pobre, difícil e isolada da vila. Para as irmãs, é um passo atrás por terem deixado a cidade e suas possibilidades. Para o pai, também, já que ele terá que tentar convencer novos patrões a aceitarem as filhas. O momento, para todos, é encarado como passageiro. Isso se reflete nas escolhas do diretor de apostar mais em diálogos do que em ações, como se o filme também estivesse esperando, junto com as personagens, algum desenrolar. Daí, há uma sensação constante de letargia e repetição, de dada forma emulando as sensações das irmãs.

Essa placidez, na maior parte da narrativa, só é mexida por pontuais sugestões que o filme carrega consigo de que algo fantástico pode se dar: o isolamento do local e suas paisagens e arredores, a trilha sonora como que de contos de fada, a presença de personagens como a "louca" da vila - que sempre aparece em cena dando cambalhotas - ou de uma dupla de misteriosos homens - que sempre aparece em marcha, como que sem destino. A sensação de uma possível fantasia, no entanto, é ao mesmo tempo constante e frágil, fugidia.

Pelo título original, o filme se chamaria tão somente "As irmãs". No entanto, os títulos pelo mundo, incluindo o brasileiro, aderiram à ideia do "conto", que reforça que algo a mais possa sair dali - sentimento frustrado. Essa escolha, no entanto, não surge como gratuita. Em mais um espelhamento entre a forma e a narrativa do filme, a sensação primeiro instigante, e depois incômoda, de que algo pode acontecer acaba replicando a própria trajetória das três irmãs, que alimentam a esperança de saírem do marasmo da vida na vila, mas também entendem que esse sonho parece se distanciar a cada dia. Na narrativa, os desejos se cumprem ou não em diferentes níveis para as personagens, enquanto, ao espectador, resta ter acesso a um filme que nunca chega a ser.

O Conto das Três Irmãs

Disponível no Now e na Vivo Play

 

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