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Dominguinhos completaria 80 anos nesta sexta, 12; relembre o legado do sanfoneiro mais gentil da MPB
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Dominguinhos completaria 80 anos nesta sexta, 12; relembre o legado do sanfoneiro mais gentil da MPB

José Domingos de Morais, mais conhecido como Dominguinhos, completaria 80 anos nesta sexta-feira, 12 de fevereiro. Cantor, sanfoneiro e compositor, o artista foi um dos responsáveis por popularizar a sanfona pelo Brasil
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Dominguinhos apadrinhou Waldonys e foi o responsável por impulsionar o início da carreira do artista cearense (Foto: Fco Fontenele )
Foto: Fco Fontenele Dominguinhos apadrinhou Waldonys e foi o responsável por impulsionar o início da carreira do artista cearense

Dentro do carro, Dominguinhos (1941 - 2013) murmurava “dia” (sem o “bom”) para todos os pedestres que cruzavam seu caminho. Cumprimentava as pessoas enquanto dirigia pelas estradas brasileiras, mesmo que ninguém pudesse ouvi-lo. Em uma dessas viagens, estava seu afilhado da música, Waldonys. Ao perceber o hábito, o cantor cearense perguntou: “por que você fica falando isso se os ‘caras’ nem escutam?”. A resposta foi simples: “não interessa se escutam, o que interessa é o que eu desejo a eles”. A memória afetuosa que o artista recorda de José Domingos de Morais explica parte do encanto que os brasileiros detêm por sua personalidade e pela obra artística que deixou em vida. Cantor, sanfoneiro e compositor, Dominguinhos completaria 80 anos nesta sexta-feira, 12 de fevereiro.

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Sua carreira iniciou quando ainda era uma criança, em meados da década de 1950. Ao lado dos irmãos, tocava nas portas dos hotéis e nas feiras de sua cidade natal, Garanhuns. Foi em uma dessas apresentações que encontrou Luiz Gonzaga. “Eu, menino, não sabia quem era. Ele deu pra gente um bolo de dinheiro e, o mais importante, o endereço dele. Luiz Gonzaga falou assim, falem pro pai de vocês, quando forem pro Rio, pra me procurar. Dito e feito”, lembrou em entrevista ao Vida & Arte em 1° de agosto de 2004. Após uma viagem de caminhão que durou 11 dias, a família chegou à capital carioca para se encontrar com o rei do baião.

A partir desse momento, firmou-se uma parceria que mudou a trajetória de Dominguinhos. “Quando cheguei no Rio, que a gente fez esta amizade, não saí mais da casa dele. Ficava ali, vendo ele tocar, ensaiar. Era um homem altamente compenetrado naquilo que fazia, e muito brincalhão, mas muito duro também”, disse ao O POVO. Com a aproximação, integrou o grupo de Luiz Gonzaga, fez shows, viajou pelo Brasil e conseguiu se consagrar no mercado da música. Compôs canções que não somente ganharam projeção nacional, mas também se tornaram símbolos da cultura brasileira. “Eu Só Quero um Xodó” (1999), “Isso Aqui Tá Bom Demais” (1985) e sua colaboração com Gilberto Gil, “Lamento Sertanejo” (1975), são alguns dos exemplos.

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Com a carreira consolidada, o sanfoneiro seguiu as tradições de seu mestre ao ajudar novos talentos. “Agora, como já tenho 63 anos e mais de 60 discos gravados, já estou formando meus pupilos. Aqui é Waldonys, e mais recentemente Adelson Viana, além de Chico Justino, pessoas que tem amor ao acordeon, como Clementino Moura, pessoas que vivem do acordeon”, comentou ao Vida & Arte.

Waldonys, por exemplo, conheceu Dominguinhos quando era criança, em Mossoró. Desde então, ele foi acompanhado pelo pernambucano e atribui os primeiros passos de sua carreira ao padrinho. “Ele era um cara completamente à frente de seu tempo. Tinha a música na alma. Não era só técnica, não era só o conhecimento de ir no conservatório e estudar. As melodias dele são carregadas de sensibilidade”, opina o cearense. Considerado um dos “pupilos” do artista, Waldonys viajou na estrada com ele para fazer vários shows. “Era sempre um aprendizado muito grande. Conversávamos muito, mas tínhamos muitos momentos de silêncio. Era uma relação de pai para filho”, recorda.

Em algumas dessas viagens, o guitarrista e produtor Mimi Rocha também estava presente. “Eu conheci Dominguinhos como todo mundo conhece: como fã. Minha experiência de tocar com ele e conhecê-lo pessoalmente se deu em um show que fiz com Waldonys. A gente teve a presença dele, que entrou de surpresa no palco, sem ensaio”, afirma. Essa improvisação que aconteceu no primeiro contato também continuou quando ele viajou pelo interior do Ceará para integrar a banda nos shows. “Fizemos vários shows com ele. Era sempre uma experiência incrível, porque não tinha ensaio. A gente não sabia qual seria o reppertório. Era tudo no ‘ouvido’, a gente tinha que tocar na hora”, diz.

“O maior legado que ele nos deixou foi sua humildade, sua simplicidade de ajudar e contribuir com novos músicos. Quando ele via algum talento, continuava a tradição do Luiz Gonzaga de presentear com uma sanfona”, indica Mimi Rocha. Mas, para o produtor, o maior destaque continua sendo suas músicas: “ele, que era um autodidata, que aprendeu na ‘marra’, transformou o acordeon em um instrumento nobre.”

Som que ecoa nas redes

Apaixonado pela música brasileira, Janylton Hammom, idealizador do perfil @dominguinhos_sanfoneiro, conheceu a obra do pernambucano ao escutar o álbum "Elba Ramalho & Dominguinhos: Baião de Dois" (2005). "Até então eu não o conhecia. Aleatoriamente coloquei tocar 'Onde Está Você' para tocar e fiquei encantado por aquele modo de tocar sanfona. Nunca tinha visto algo igual, nem parecido. Era como se a sanfona dele falasse comigo através dos acordes. Foi nesse exato momento que surgiu em mim mais que uma curiosidade, era o início da necessidade de ouvir Dominguinhos todos os dias", explica.

Dessa afeição, ele decidiu criar uma conta no Instagram dedicada a preservar a memória do compositor. Desde 2017, busca unir fãs, músicos e novos admiradores que gostam de compartilhar informações. Com quase 18 mil seguidores, o público é majoritariamente de homens entre 25 e 44 anos. "A importância é principalmente preservar a obra do Dominguinhos, mas também fazer com que novos públicos tenham acesso ao acervo e possam conhecer seu trabalho", pontua.

O perfil demanda um processo de estudo. "Faço pesquisa sempre em plataformas, como o Google e o Youtube, por causa da facilidade de encontrar materiais produzidos pelo próprio Dominguinhos e também por terceiros", afirma. A maior dificuldade é descobrir os devidos direitos autorais. "Muitas vezes, não há uma base de dados legais que informem a autoria. Mas, sempre que disponível, coloco as referências. O público muitas vezes ajuda na criação desse material, marcando os autores nas fotos e nos vídeos", diz.

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