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Artista cearense Zé Tarcísio lançará álbum comemorativo pelos 80 anos de vida e 60 de ofício
Vida & Arte

Artista cearense Zé Tarcísio lançará álbum comemorativo pelos 80 anos de vida e 60 de ofício

Aos 80 anos de idade e 60 de ofício, o múltiplo artista cearense Zé Tarcísio atravessa o tempo documentando a vida que tanto ama. Lançamento de álbum celebrará existência e carreira deste eterno menino
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Álbum comemorativo de Zé Tarcísio terá lançamento em breve (Foto: Barbara Moira)
Foto: Barbara Moira Álbum comemorativo de Zé Tarcísio terá lançamento em breve

Quando alguém adentra a morada de Zé Tarcísio, renomado artista cearense das múltiplas mídias, o galo Aristeu canta. Às 4 horas da manhã, antes mesmo do sol surgir no horizonte, a ave já o acorda do sono. Neste reduto, moram ainda o gato Poderoso e a cadela Olímpia. Várias plantas dão flores e frutos — caju e carambola são alguns. Para tomar banho, há uma bica. Por ali, cadeiras de balanço também despertam o encanto do eterno menino brincante. Entre o verde do quintal, Zé restaura um painel de 1964. Em meio às incertezas de uma pandemia, ele não parou de produzir. Com o sorriso de sempre, celebra seus 80 anos de existência e 60 de carreira. Em breve, lançará álbum para marcar esta trajetória ancorada no Ceará, mas viajante pelo mundo.

Pintor, artista intermídia, gravador, escultor, cenógrafo e figurinista, Zé Tarcísio transborda no tempo, costurando memórias e documentando a vida. O álbum comemorativo contará com seis imagens de seis obras emblemáticas de cada período da produção de Zé, escolhidas pelo próprio artista. "A edição será lançada em Fortaleza, minha cidade, para ganhar o mundo ao longo deste ano. Estou muito feliz de marcar feito de vida e trabalho", anuncia.

Amante do planeta e da memória, sua obra parte da dimensão política por múltiplas lacunas — perpassa pelo que acontece no mundo, entre pedras, telas, concretos e retratos indagadores. "Eu sou também um repórter", afirma Zé Tarcísio. Nos trabalhos mais recentes, a máscara — medida de proteção contra a Covid-19 — está presente.

Nestes tempos conturbados da vida na Terra, Zé sentiu, pela primeira vez, medo e solidão. Não da morte, mas da falta de assistência. Ao tomar consciência sobre tais sensações, disse às plantas e aos animais que estavam ali, sentindo o mesmo: "Vamos ficar juntos". O quintal, segundo o artista, "é pequeno, mas a gente faz ficar grande".

Zé Tarcísio é um dos mais renomados artistas cearenses
Zé Tarcísio é um dos mais renomados artistas cearenses (Foto: Barbara Moira)

"Esse ano que passou (2020) foi marcante. A situação não é algo só municipal ou estadual. Agora é global. O mundo inteiro não está se abraçando. Estamos vendo um outro tipo de guerra. A máscara é muito necessária e muito severa. Há os termos 'fique em casa, não saia, não abrace, fique a tantos metros de distância'. Isso é muito ruim para quem viveu anos pensando em ser, cada vez mais, livre", diz Zé.

Num sábado de 1941, dia 8 de fevereiro, José Tarcísio Ramos nasceu nesta Fortaleza, Capital do Ceará. Filho único de mãe artista plástica, quando criança já criava mundos rabiscando. De certa forma, segue menino. "Acredito na arte, no desenho. É o que me faz feliz!", exclama. Aos 19 anos, nos idos de 1960, deu início ao seu ofício artístico. Era o momento da "virada cultural" da Cidade, com a inauguração de equipamentos como o Museu da Universidade Federal do Ceará (UFC) e a Concha Acústica.

Zé Tarcísio, um dos mais renomados artistas cearenses, abre sua casa ao O POVO
Zé Tarcísio, um dos mais renomados artistas cearenses, abre sua casa ao O POVO (Foto: Barbara Moira)

Durante a juventude, Zé Tarcísio pôs os sonhos na mala e embarcou rumo ao Rio de Janeiro. "Naquela época, eu precisava ir. Fui no eco de Antônio Bandeira (pintor, desenhista e gravador cearense), que me disse: 'Vá ouvir mais do que falar. Depois, vai ter que falar'. Eu fui. E Bandeira foi o mentor", conta. Estudou na Escola Nacional de Belas Artes, atravessou a repressão da ditadura, trabalhou com cinema, televisão, dança e teatro. Encantou o Brasil e o mundo por circuitos na América e na Europa. Zé passou por França, Portugal, Alemanha, Espanha, Suécia, Itália, Bolívia, Peru, Argentina, Chile e Cuba. Em 1982, instalou seu ateliê na rua Dragão do Mar, na Praia de Iracema. O sobrado da década de 1920 segue ali, resistindo às metamorfoses do entorno.

Zé Tarcísio destaca a vivência, por muitos anos, no Cumbe, localidade do município de Aracati, no litoral cearense. O período foi muito significativo para a arte deste contador de histórias. "Meu trabalho foi muito ligado à especulação imobiliária, mostrando os ferimentos na beleza da paisagem, as interferências das estacas e o desmonte das dunas", explica.

Viajante do mundo, Zé pretende migrar de Fortaleza para a sua nova descoberta: Caracará, um pequeno distrito rural pertencente ao município de Aquiraz. "Quero aproveitar este restinho de tempo por aqui para explorar, ver coisas, sentir que há possibilidades. Eu me sinto muito bem naquele lugar, ali é onde eu pretendo me basear um pouco mais". Zé também não restringe a possibilidade de, quando "der na telha" ir para qualquer canto deste "lindo planeta": "Ficar dali para não sei onde. Ficar em Fortaleza e ficar lá. Vou para qualquer parte, o que der na cabeça... Eu posso rapidinho viajar".

O fato é que, para onde tiver vida, Zé Tarcísio irá. "Estou há 80 anos por aqui. Ainda é muito pouco para a gente viver", reflete.

 

EM BREVE

Álbum comemorativo pelos 80 anos de vida e 60 de ofício de Zé Tarcísio terá capa dura e estojo rígido, com impressões em serigrafia. A apresentação contará com pessoas da rede de afetos de Zé. As seis obras icônicas da carreira do artista já foram escolhidas para compor o projeto, ainda sem data de divulgação. Apoio e parceria é de Túlio Paracampos, artista plástico e designer.

ATELIER

O Atelier Zé Tarcísio, acervo instalado na rua Dragão do Mar, nas imediações do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura (CDMAC), não será mais ateliê. O local, atualmente fechado para o público, deve se tornar um equipamento cultural para realização de cursos e palestras.

VISUAL

Por muitos anos, Zé Tarcísio mantinha cabelos e barba grandes. O artista recorda, com carinho, as vezes em que foi confundido com a figura do Papai Noel por crianças. Agora, diz — entre risos — que adotou um "visual contemporâneo".

CONSELHO

Zé Tarcísio lembra que, quando se é pequenino, antes mesmo da fala, a experiência do sentir e de se comunicar com o mundo advém dos rabiscos. Para ele, o artista deve acreditar na arte — "esta prazerosa forma de dizer".

Acompanhe Zé Tarcísio

Instagram: @atelierzetarcisio

 

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