Em 28 de fevereiro de 1986, a atriz Molly Ringwald estreou um dos seus papéis mais lembrados, ela foi "A Garota de Rosa Shocking". Apesar de não ser nenhum filme ganhador do Oscar, a produção norte-americana - inserida no gênero comédia romântica - marca um dos - vários - capítulos do sonho cor-de-rosa. O que chama atenção é, paralelo ao abismo social distribuído no enredo, como a estudante Andie, no seu "mundo rosa" ideal, dá-se conta de uma personalidade que só ela é capaz de descobrir e gerenciá-la. O vestido rosa customizado passa essa impressão, que vem de um fio condutor muito mais psicológico do que ela tenha certeza imaginar. Mas é esse o recado das cores. Nada parece estar tão imune ou isento de simbolismo.
"Quanto mais distante das característica intrafigurais, com as matizes do céu fortalezense durante o pôr do sol ou o vermelho secular usada no rótulo do refrigerante de cola, o significado de uma cor não é inevitavelmente inerente, mas instituído pelos códigos contextuais operantes. Assim, há uma diversidade de possibilidades entre as intenções dos autores e os processos de recepção, interpretação e ressignificação dos signos cromáticos", comenta o professor do curso de Publicidade na Universidade Federal do Ceará (UFC), Chico Neto.
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Com a cor em questão não é diferente. "Será que a rejeição ao cor-de-rosa (relatada em "A Psicologia das Cores", de Eva Heller) se encontra na própria cor? Ou é dominante a ideia de que o rosa é feminino, e por isso secundário, sem importância?" Com conteúdos que poderiam estender à leitura, a autora mesma antecipa: "O rosa não é somente um meio-termo entre o vermelho e o branco. O rosa tem seu caráter próprio", esclarece. "Existem sentimentos e conceitos que só se podem descrever pelo rosa. E todos os sentimentos que pertencem ao rosa são positivos", "a única cor a respeito da qual ninguém pode dizer nada de negativo", descreve, associando-o a charme, cortesia e a sensibilidade, como exemplos.
Passa até na sua janela, feito uma nuvem - rosa - tóxica, com uma só intenção: fazermo-nos - viver e - refletir. Em "A Nuvem Rosa", filme recém-lançado pela diretora Iuli Gerbase, ela é "real". O thriller de ficção científica brasileiro - que concorre ao festival de cinema de Sundance nos EUA - coincidentemente retoma uma das tonalidades do rosa atribuindo a ele, não por acaso, uma ideia de conexão com o lado mais à flor de suas personagens (Giovana e Yago).
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"Quando a Covid-19 começou, pensei que as pessoas só veriam 'A Nuvem Rosa' como reflexo do coronavírus, quando desde o início foi concebido como um filme feminista", disse Gerbase à Variety, referindo também como a produção, aclamada pela crítica internacional, "poderia ajudar as pessoas a processar as emoções que o bloqueio global provocou, por exemplo, ao virar-se para diferentes visões de felicidade e liberdade".
O rosa, apesar de fatal, no filme, como disse Eva, não "pode dizer nada de negativo", mas abrir à mente ou às sensações do que dele estiver revestido. Quem aí lembra-se do Rosa Quartz em casadinha com o Serenity, anunciado pela Pantone para o ano de 2016? Na época, a moda, especialmente, dava lugar ao hibridismo de gênero, com o rosa para "todes"; enquanto ainda se discute - na esfera conservadora e política atual - o dito "padrão": rosa para meninas, azul para meninos. Avalie falar de "Ma vie en rose", o filme de Alain Berliner, rodado há 25 anos, porém, com outras motivações, mas que tem a desconstrução sobre o rosa ou qualquer outra cor que na sua trajetória indique - inevitáveis - transformações.
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É o que ocorre em uma leitura no campo da comunicação e da cultura, conforme elucida Chico. "Podemos acolher, reafirmar ou refutar sugestões de significações a elementos gráficos como, por exemplo, que um período do ano ou sexo biológico seja associado à cor rosa. Desta forma, para diferentes cenários e públicos, as cores podem ganhar, perder e mudar suas atribuições culturais e usos sociais", diz.
Quando Janelle Monáe (Gaga também tem forte influência com o rosa, nesse sentido) surge em seu videoclipe, "Pynk", de 2018, as proporções do tom suave, por exemplo, adquirem novas perspectivas do que as popularizadas na arte como na moda nos anos 1700 por membros da corte francesa, servido, à época, para simbolizar tanto a juventude quanto o romance - mas ainda não a feminilidade - expressiva, com marco, só depois, com o "rosa choque" de Elsa Schiaparelli dado às mulheres. (Jully Lourenço)