Feita de matéria, mas embebida de cultura e história, a peça de pano nunca foi só isso. Sem passar despercebida na época escravocrata, no Sudeste dos EUA, lia-se nela: opressão ao negro. Usava-se a durag, antigamente, para proteger-se do sol nas lavouras de algodão. Além dessa ligação à submissão, havia o desgaste da própria imagem por quem a utilizava. Ficava "escondida" nas durags usadas por mulheres, por exemplo, sem poder expor sua "identidade".
Ao longo dos anos, sem esquecer seu seio no comércio escravo, porém, a peça foi ressignificada. Entrando na moda, mas muito além dela - é raso tanto quando efêmero incluir as durags somente como tendência; são expressões além -, hoje, são símbolo de resistência e representatividade; que Rafael Semino, 24, do Vicente Pinzon, onde se criou, ajuda a multiplicar.
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O estudante de teatro e História, professor em uma unidade escolar na Barra, criou a Trapo Preto, marca que começou em abril deste ano no Instagram. "A ideia da marca nasceu no dia 25 de dezembro de 2020, ganhei um durag do meu namorado. Tinha visto algumas pessoas usarem em alguns lugares por São Paulo e Angola, mas nunca tinha usado. Meu namorado disse que foi bem difícil de achar aqui em Fortaleza e por isso comprou pela internet. Usei o durag e além de me sentir super estiloso, senti a força que essa peça tem por sua história e que deveria proporcionar essa experiência para outras pessoas aqui de Fortaleza e do Brasil", visando não só o negócio, que precisou da atenção de Rafael voltada à profissionalização, antes de abrir a loja, mas na importância em ressaltar a origem do item.
Antes da durag pertencer aos movimentos da cultura negra, entre eles o do orgulho negro dos anos 1960 e 1970, quando os "trapos" se tornaram uma declaração de moda entre os homens afro-americanos e passar pelos artistas da música, na cabeça de rappers como Jay-Z, Nelly e 50 Cent, "as mulheres e os homens escravizados nos Estados Unidos amarravam pedaços de pano na cabeça por alguns motivos, o suor não cair no rosto, e/ou preservar seu penteado", relembra, até ter virado o que é hoje. Para Rafael: "um símbolo de resistência, assim como o estilo de cabelo black", aproxima.
O nome também dá o recado: "'Rag' significa trapo ou pedaço de pano, o nome da loja vem desse significado, o preto vem da nossa cor, do orgulho de ser preto. Apesar de vivermos em uma sociedade racista, em que é ensinado que o preto é sujo, ruim, mal, que as religiões das pessoas pretas são erradas, que precisamos estar todo tempo nos embranquecendo e buscando referências brancas", reverte. "Nossa loja busca enaltecer a beleza negra com referências negras, daí surge Trapo Preto, tendo como slogan pedaço de pano, estiloso amarrado na cabeça", usado por Rafael, ao lado de duas referências para ele, Dney e Eva Bessa - "ambos são dançarinos, e em seus vídeos-dança reforçam e evidenciam suas negritudes, com beleza e estilo" -, no primeiro ensaio da marca.
Made in Ceará
Na foto acima é Gabriel Vieira do Rosário, 26. Nascido em São Paulo, morando no Ceará, o modelo usa durag há uns três anos. "É uma coisa que, hoje em dia, está muito estético, mas é uma representatividade. Porque isso não é de agora não, o durag é ancestral, né, do tempo dos escravos", repercute Gabriel além. "Quando se trata até mesmo de uma pessoa branca, usando uma durag, tem muita crítica porque não é só um tecido qualquer", observa.
A marca de Angélica Freire, na cabeça do modelo, também estende a reflexão. "Durag é muito além de um acessório! Durag representa resistência da nossa estética negra!", diz a empreendedora. A Ina Durags, explica, é uma marca voltada para a difusão desse acessório que carrega muito além de estilo, "em relatos históricos as durags em 1700 eram exigidas por lei para mulheres de ascendência africana em Nova Orleans com o objetivo de diferenciar fisicamente seu status de escrava, com o passar dos anos e o crescimento da resistência e movimentos negros, como os black panters, as durags passaram a ser usadas para manter penteados em cabelos curtos chamado Waves 360, também manter por mais tempo as tranças e dreads", lembra. Hoje, além da clássica (de tecido liso), a Ina tem a durag de veludo "e o nosso mais novo lançamento a Durag Silk" com valores entre R$ 30 e R$ 50.
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