No caminhar do tempo, a música cearense foi atravessada por diferentes gerações de cantores, compositores, instrumentistas e produtores. A efervescência cultural ganhou ainda mais destaque a partir da segunda metade do século XX. Talvez, por isso, falar no passado pareça até incoerente. Esse legado mistura-se no antes, agora e depois, como uma memória viva, não finalizada — continua sendo escrita (melhor, cantada). Rodger Rogério, Téti, Davi Duarte, Edmar Gonçalves, Calé Alencar, Gilmar Nunes e Theresa Rachel são alguns dos nomes que trilham tal história. No projeto "Futuro e Memória 2", esses artistas interpretam não só canções clássicas da cena cearense, mas também composições inéditas de Rogério Franco e Dalwton Moura.
Com disco e especial audiovisual, "Futuro e Memória 2" — previsto para o final de outubro — reúne cinco gerações de músicos cearenses. Multiplataforma, o projeto terá álbum físico, músicas nos serviços digitais e show-filme no YouTube. Além disso, os artistas farão uma série de cinco lives no Instagram (@musicadoceara), com bate-papo sobre os processos criativos do trabalho. Também no YouTube, o público poderá assistir ao registro dos bastidores do concerto, filmado no Teatro da Casa de Vovó Dedé.
Rodger Rogério e Téti representam as gerações das décadas de 1960 e 1970. Artistas que, juntos, integraram o movimento musical conhecido como Pessoal do Ceará. Da geração Massafeira Livre, movimento consolidado com disco e feira cultural no fim dos anos 1970, está Calé Alencar. Os músicos Rogério Franco, Edmar Gonçalves e Davi Duarte são de uma geração que ascendeu na década de 1980 e foi solidificada na década de 1990. Já Gilmar Nunes começa nos anos de 1990 e ganha destaque a partir do início do milênio — de todo o grupo, talvez, seja quem mais segue firme no circuito da noite fortalezense. Expoente da música cearense contemporânea, Theresa Rachel é a "caçula".
Luciano Franco, Rogério e Dalwton assinam a direção musical. Luciano também é o responsável pelo contrabaixo e pelos arranjos, com colaboração de Rogério, Dalwton e dos intérpretes e instrumentistas ligados ao projeto. Na guitarra, Anfrísio Rocha. Na bateria, Paulinho Santos. Já no piano acústico, no teclado e no acordeon, Robson Gomes.
O lançamento da primeira edição do disco coletivo, "Futuro e Memória" (2018), resultou num show. O concerto, realizado com 14 músicos no palco, percorreu municípios do Ceará e da Paraíba. Foram 10 apresentações no total. Os encontros na estrada e a divulgação do trabalho deram origem a uma "convivência criativa" — conta Dalwton Moura. As trocas afetivas entre os músicos reforçaram a alegria de estar junto, fazendo música. "A gente acabou consolidando, ainda mais, a amizade, a admiração e o respeito pelo trabalho um do outro. Essas parcerias já aconteciam, mas elas foram intensificadas".
Segundo Dalwton, a ideia de realizar o segundo disco foi uma "consequência natural". Em 2019, o grupo submeteu o projeto (com disco e show) no VIII Edital das Artes, da Secretaria da Cultura de Fortaleza (Secultfor). A pandemia da Covid-19, no entanto, modificou os planos. Diante do isolamento social para conter o avanço do coronavírus, os artistas passaram a manter contato via internet.
Com o avanço da vacinação e a flexibilização dos isolamentos, os músicos passaram a desenhar um retorno. "Cada pequeno movimento relacionado à produção foi feito com muito cuidado, como uso de máscara e distanciamento social", destaca Dalwton. As gravações do segundo disco aconteceram com poucas sessões ao vivo no estúdio. Com o aval da Secultfor, os artistas decidiram adaptar o projeto para esse contexto. O que era para ser um show ao vivo, como na primeira edição, tornou-se um especial audiovisual.
Mais memórias e futuros
O álbum "Futuro e Memória 2" conta com 17 faixas. A faixa-título do primeiro volume, "Futuro e Memória", também integra o lançamento, mas com novos arranjos e intérpretes. "É uma música forte, cheia de imagens e caminhos poéticos, que toca nas relações do tempo", comenta Dalwton. O compositor, produtor cultural e jornalista explica a escolha por uma versão física do disco: "É uma outra forma de ter acesso à obra, que valoriza aquele ritual antigo de ter em mãos o trabalho, dedicar um tempo, parar e escutar".
No especial audiovisual, cada intérprete apresenta músicas que estão no disco. No palco, não houve filmagens com todos juntos por conta da pandemia. Nesse show-filme, há uma canção bônus, intitulada "Uma Canção a Mais". Assim como no primeiro disco, "Futuro e Memória 2" conta com fotografias do Edifício São Pedro, localizado na Praia de Iracema, em seu conceito visual. A edificação estampa 14 cartões e pôster do álbum físico. Os registros foram realizados pelo fotógrafo Luiz Alves. Já a elaboração da identidade visual ficou por conta de Caio Castelo. O trabalho também contempla um texto elaborado a partir de conversas com o historiador Nirez.
O Edifício São Pedro, primeiro prédio da orla fortalezense, teve seu tombamento indeferido pela Prefeitura de Fortaleza no último mês. "Quem passa pelo prédio, tem seu olhar capturado. O (fotógrafo) Luiz Alves captura quanta beleza pode ter em meio às ruínas. A gente torce para que, de algum modo, seja encontrada uma saída para sua manutenção e o prédio continue fazendo parte da nossa orla. Seria mais um crime contra a memória e a identidade", afirma Dalwton. Considerado um dos símbolos de Fortaleza, esse patrimônio permeia a rota afetiva das cinco gerações do projeto. Integrá-lo ao disco é, também, uma forma de refletir sobre passados, presentes e futuros possíveis.
Futuro e Memória 2
Mais informações: @musicadoceara
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