Em Fortaleza, um dos heróis mais famosos da Marvel conta com a ajuda de um jovem estudante de Medicina para continuar seu legado a partir do projeto "Aranha Urbano". Nele, veste o traje do "teioso", visita crianças em diversas instituições na Capital e realiza ações de conscientização social, como alertar para a prevenção do câncer de mama e convocar as pessoas para a doação de sangue. Atualmente, busca incentivar a vacinação infantil contra a Covid-19.
Hoje, já em seu terceiro traje do Homem-Aranha, ele tenta conciliar os seus horários da faculdade com as ações da iniciativa, e age como o "Aranha Urbano" quando encontra tempo livre. O impacto de seu trabalho é real. Ele já publicou um passo a passo de como realizar o cadastro de uma criança para a vacinação e alertou para pontos de repescagem para a imunização.
Além disso, outras ações têm efeito: quando postou uma foto em seu perfil no Instagram sendo vacinado, por exemplo, recebeu o depoimento de uma professora da época do colégio que disse quão importante era a ação dele. "Quando chegar a hora do meu filho se vacinar, vou mostrar a ele essa publicação para ele se motivar", teria dito ela.
Nesta matéria, você não saberá o nome do jovem de 22 anos que conduz a iniciativa - afinal, é importante mantermos a sua identidade secreta preservada. Entretanto, é possível saber como começou a jornada do herói urbano. Ele vem nessa trajetória desde 2015, quando ainda estava no segundo ano do Ensino Médio. A escolha pelo super-herói não chegou a ser novidade para quem o conhece de perto, afinal, ele é fã de heróis desde a sua infância. Conforme foi crescendo, percebeu que não eram as cenas de ação que mais despertavam seu interesse nos personagens:
"O que mais me atraía nas histórias eram as mensagens de cada herói. O Homem de Ferro tinha a questão de tomar responsabilidade pelo que sua empresa fazia e o Capitão América era conhecido pela força interior e por acreditar nos seus próprios valores. Se você parar para refletir, todos os heróis têm algo a significar", diz.
"Não me acho muito parecido com o Homem-Aranha, mas gosto de pensar que ele me inspira a ser alguém melhor". O jovem juntou dinheiro e comprou sua primeira roupa do herói. Era iniciado, então, o Aranha Urbano. Além de visitas a instituições e estímulo à vacinação infantil, ele produz cartilhas com informações sobre temas de interesse social para conscientizar a população e distribui panfletos em ruas de Fortaleza.
O herói incorporado em terras cearenses até ganhou um "parceiro aracnídeo" na campanha da vacinação infantil. O pequeno Gustavo pediu que sua mãe comprasse um traje do Homem-Aranha para receber o imunizante contra a Covid-19 fantasiado do super-herói da Marvel. Isso, claro, depois de encontrar o "amigão da vizinhança" em Fortaleza. Casos como esses são a confirmação da relevância dessa iniciativa: "Para mim, é o que faz tudo valer a pena", destaca o Aranha Urbano.
Mas, afinal, se até o "Gustavinho' foi identificado pelo estudante, por que ele mesmo não divulga quem está por trás do projeto? O motivo é simples: o jovem não deseja ter "fama" por essa iniciativa. Mesmo que não negue sua identidade quando perguntam se ele realmente é o Aranha Urbano, ele não gosta de anunciar quem está por trás das máscaras. O seu sonho não é o reconhecimento, mas outro: o de um dia o projeto se tornar uma "ação social maior".
Apesar de completar sete anos de existência em 2022, não foi contínuo o tempo de atuação. Devido ao aumento de ocupações de seus horários por causa de estudos e do Enem, ele foi reduzindo gradativamente, mas foi em 2018 que o estudante decidiu encerrar a iniciativa. A decisão ocorreu após uma experiência marcante e inesquecível.
Naquele ano, o jovem foi convidado para visitar a Associação Peter Pan e conversar com o pequeno Kauan, que lutava contra um câncer. Ao chegar ao leito, uma surpresa: o seu quarto era repleto de pinturas e itens relacionados ao Homem-Aranha. Kauan era fã incondicional do herói - e o Aranha Urbano logo lembrou do quadrinho "O Garoto Que Colecionava Homem-Aranha".
Na história, o teioso visita um garoto que diz ser o maior fã do herói e que colecionava tudo o que já havia saído sobre o personagem na imprensa. No quadrinho, o Aranha revela como adquiriu seus poderes, os motivos que o levam a lutar contra o crime e chega até a dizer seu maior segredo: a sua identidade.
Para o Aranha Urbano, fazer esse paralelo de histórias "o emocionou muito". As horas em que passou com o Kauan foram repletas de conversas e "tira-dúvidas" do garoto, como quais eram os vilões "que lhe davam mais trabalho" e qual era o seu filme favorito. Além disso, revelou seu sonho de assistir a "Vingadores: Guerra Infinita".
Uma pergunta, porém, foi a mais marcante para o Aranha Urbano: "Ele se virou para mim e me perguntou: 'Homem-Aranha', você nunca desiste, não é?'. Então, disse a ele: 'Não, Kauan. Nós não podemos desistir'. É uma tarde que eu guardo como uma memória muito importante. Meses depois, recebi a notícia do seu falecimento. Isso mexeu muito comigo. Eu tinha dito a ele que não poderíamos assistir a Vingadores naquele momento, mas que ia com ele ver o filme depois. Infelizmente, não foi possível".
O jovem, então, passou a ter diferentes reflexões sobre seu papel ao tocar o projeto: "Eu comecei a pensar sobre muitas coisas. Pensei que eu era só um cara fantasiado e que minhas ações não fariam diferença. Achava que a iniciativa não tinha efeito real. Então, decidi parar com o Aranha Urbano".
Dois anos depois, uma outra experiência também foi responsável por impactar profundamente a iniciativa - mas, dessa vez, a mudança veio de outra forma. No período de quarentena da pandemia, o estudante comprou quadrinhos da Marvel para se distrair. Um deles foi o volume "Homem-Aranha: O Amigão da Vizinhança".
Ao ler o último capítulo, uma surpresa: o personagem visitou, na história, um garoto que também estava enfrentando um câncer terminal. As lembranças sobre Kauan não se encerraram com o término da leitura: "Eu fico arrepiado só de falar, porque não sei se foi coincidência ou não, mas quando reparei a data em que li esse quadrinho eu percebi que era a data do falecimento do Kauan. Exatamente dois anos depois da sua partida eu lia a história".
Ele continua o relato: "Eu estava muito emocionado e comecei a pensar em muitas coisas, como a tarde em que passamos juntos. O Kauan viveu até o final acreditando nas possibilidades que esse herói representava. Lembrei não só do Kauan, mas de outras crianças e pessoas que chegavam para mim e falavam da importância do projeto".
Assim, percebeu como o Homem-Aranha era muito mais que apenas um super-herói: "Na verdade, o Homem-Aranha existe. Ele existe através de cada fã que pega as mensagens que ele passa e passa a aplicar no seu próprio dia a dia. Ele não é uma fantasia infantil, é real, através dos fãs que seguem a sua famosa frase: 'Com grandes poderes, vêm grandes responsabilidades'".
O retorno do Aranha Urbano se concretizou em 2020. O jovem chegou a visitar orfanatos ao longo desse período, sempre tomando cuidados com a segurança sanitária - tanto que, além da máscara de sua fantasia, usa por baixo uma máscara de proteção contra a Covid-19. É abafado para ele? Sim. Mas, como ele mesmo afirma: "Vale a pena".
"Tem crianças mais velhas que sabem que eu não sou o Homem-Aranha, mas entendem que estou ali para me divertir com elas. Algumas até me ajudam a convencer as mais novas de que eu sou o personagem original. É bem legal".
Por enquanto, o estudante continuará realizando ações de conscientização a respeito da vacinação e estenderá sua campanha para discutir sobre as melhores máscaras de proteção e quais pontos de testagem contra a covid estão disponíveis.
Conheça o projeto
Perfil: @aranha_urbano no Instagram
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