"Um domingo como esse eu levantaria antes das 6 da manhã e ligaria pra Fabi pra saber se ela já acordou. Me montaria, acordaria o Zequinha, me olharia no espelho e acharia que eu estava vestida demais, com pouca purpurina, tiraria uma peça de roupa e passaria mais brilho no corpo (...) Hoje seria um domingo de amor e felicidade". Esta publicação foi divulgada nas redes sociais da cantora e compositora Teresa Cristina no último dia 20. A narrativa expõe um cortejo comum do Cordão do Boitatá, bloco de 1996 indispensável para a revitalização do Carnaval de rua da cidade do Rio de Janeiro e para o ciclo carnavalesco da sambista.
Teresa foi a primeira mulher a ganhar o Estandarte de Ouro - prêmio concedido aos destaques do Carnaval do Rio pelo jornal O Globo - com o samba-enredo da escola Renascer de Jacarepaguá, em 2015. Em nova agenda, a artista realiza apresentações com o show "Sorriso Negro" e engaja os ensaios do Bloco Recreativo Enredo Carioca (B.R.E.C), um "sonho" composto por temas históricos das avenidas. Com sua voz amplificada nos palcos, nas ruas e nas redes sociais, a artista clama por respeito aos sambistas e à tradição da folia.
O POVO: Teresa, você nasceu durante o período carnavalesco, no dia 28 de fevereiro. Qual é a sua relação com o Carnaval?
Teresa Cristina: Eu nasci numa quarta-feira de cinzas, às 20 horas, no final do Carnaval. Eu gosto de Carnaval desde criança, desde que eu me entendo por gente. Fiz tudo que você pode imaginar, fui aos bailes de clube, fui com meu pai assistir os blocos. Tenho uma admiração pelos desfiles das escolas de samba desde criança, assisto todos, ficava a noite inteira assistindo pela televisão. O Carnaval faz parte da minha vida.
OP: O Carnaval de rua do Rio de Janeiro é um dos maiores do Brasil, parte pela movimentação causada pelo Cordão do Boitatá. Como você, foliã e atração do bloco, descreveria a relevância do Boitatá na festa da capital carioca? O que o bloco agrega?
Teresa: O Boitatá para mim é o início do meu Carnaval, começa com o cortejo do Boitatá no domingo. E o Boitatá trouxe de volta esse gosto pelas marchinhas, ao mesmo tempo em que trouxe a adoração pelo Rio antigo, por aquelas ruas do Centro da cidade. A história do Rio de Janeiro e do Carnaval está ali, misturada. É uma festa tão bonita que agrega tantos valores, o orgulho de ser carioca, dos nossos compositores. O Boitatá junta artistas, faz aquele baile multicultural na Praça XV e que, para mim, é a cara do Carnaval do Rio.
OP: Declarada como portelense, você ganhou um Estandarte de Ouro e acompanhou anualmente as atrações da Marquês de Sapucaí. O local é palco para os desfiles carnavalescos e ecoa os sambas-enredos das escolas cariocas. Como a construção destes sambas-enredos afetam a dinâmica do Carnaval?
Teresa: Os sambas-enredos contam a história do Rio. É muito difícil você falar da construção da cidade do Rio de Janeiro sem ter um verso de samba-enredo para exemplificar e ilustrar. O samba-enredo ele educa a população, ele coloca a gente num lugar muito especial de excelência e é um hino da cidade.
OP: A pandemia ampliou as divergências entre as realidades de idealizadores, patrocinadores e brincantes do Carnaval. Como você avalia a atuação dos órgãos públicos em relação ao período carnavalesco durante a Covid-19?
Teresa: Eu juro que queria entender porque um vírus é letal para o Carnaval e não é letal para blocos em lugares de aglomeração. Vários festivais de música, artistas fazendo shows para 20, 40, 50 mil pessoas e o Carnaval é o grande culpado da propagação do vírus. É muito complicado. Eu não consigo entender, para mim essa conta não fecha.
OP: Na última sexta-feira, 25, você iniciou a programação dos ensaios do Bloco Recreativo Enredo Carioca (B.R.E.C.). Qual é a proposta do projeto e o que está no repertório?
Teresa: É um sonho que está começando a se realizar, que é o B.R.E.C. A proposta do projeto é devolver à cidade do Rio de Janeiro a beleza que foi criada durante muitos anos. Nós temos muitos hinos, muitos enredos incríveis, inesquecíveis, e eu quero devolver isso para o carioca. Eu acho que a gente merece reviver esses momentos. O repertório vai ter basicamente sambas-enredos dos anos 70 e 80. Como eu falei, é a realização de um sonho, e eu, na minha infância e adolescência, vivi tudo isso que eu estou cantando. O que vai entrar no repertório são esses sambas dos anos 70 e 80, alguns dos 90, mas eu quero reviver os grandes carnavais.
OP: Por enquanto, ainda não é possível realizar a tradicional festa nas ruas. Quais são as suas projeções e desejos para os futuros carnavais?
Teresa: A minha projeção e desejo para os futuros carnavais é mais respeito. Mais respeito ao povo do samba, mais respeito aos barracões, mais respeito a uma cadeia produtiva que traz dinheiro para a cidade do Rio de Janeiro e é a maior festa do mundo ao ar livre. Eu desejo respeito.
Ensaios do B.R.E.C com Teresa Cristina
Quando: 11 de março e 8 de abril, às 22 horas
Onde: Na Fundição Progresso, no Rio de Janeiro (Rua dos Arcos, nº 24, Lapa)
Quanto: Ingressos a partir de R$ 50
Ingressos disponíveis em eventim.com.br