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Espaço cultural se consolida pela preservação da literatura de cordel
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Espaço cultural se consolida pela preservação da literatura de cordel

Em Quixadá, editora, galeria e sebo Aluá se consolida como espaço cultural na cidade e renova tradição cordelista com audiocordéis disponíveis no Spotify e no YouTube
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Artista visual Silva Barros é ilustrador e co-fundador da Aluá Sebo & Galeria (Foto: Silva Barros/ Divulgação)
Foto: Silva Barros/ Divulgação Artista visual Silva Barros é ilustrador e co-fundador da Aluá Sebo & Galeria

No quente da boca do Sertão Central do Ceará, onde os Tapuias construíram morada e Rachel de Queiroz encontrou remanso, a Aluá - Sebo & Galeria nasceu. Criada pelo professor de Literatura da Universidade Estadual do Ceará (Uece) Rodrigo Marques e o artista visual Silva Barros, a Aluá é editora e espaço para as múltiplas manifestações artísticas e culturais que se desdobram em Quixadá. No sertão que pariu Arievaldo Viana, Klévisson Viana, Rouxinol do Rinaré, Cego Aderaldo e tantos mais poetas e cancioneiros, a contemporaneidade é também tradição.

Com cerca de 30 cordéis já publicados, a Aluá localiza-se na galeria Jorge Roque, centro de Quixadá. "É um espaço onde todos podem ler, conversar, ouvir música boa, ver as gravuras…", elenca Rodrigo. Quando a noite cai, a editora que é sebo e galeria de arte torna-se mambembe: "Nós temos um cordel ambulante, um tabuleiro que colocamos nos ombros como quem vende bombom — vendemos cordéis. E bombons também!", ri-se. "A Aluá está movimentando o cenário".

O primeiro cordel publicado pela Aluá é fruto bem-vindo de uma parceria com a Casa de Saberes Cego Aderaldo. Intitulada "A saga de Cego Aderaldo", a obra é escrita por Rodrigo e ilustrada por Silva Barros. O destaque do catálogo é a coleção "Os dez nomes do Sertão Central" — biografias de cinco artistas de Quixadá e cinco de Quixeramobim: "Arievaldo Viana", por Rinaré; "Maria Lessa, poder, amor, intriga e tragédia no Sertão", por Paulo de Tarso, o poeta de Tauá; "Jáder de Carvalho, sua vida, sua obra", por Fernando Macedo; "Não me deixes (Rachel de Queiroz)", por Samuel de Monteiro; "A ressurreição de Antônio Conselheiro", por Bruno Paulino; "Ana Montenegro", por Rayane Fernandes; "Maria Luiza, de Quixadá para o mundo", por Ronaldo Rogério; e "Casa tudo azul (Fausto Nilo)", "A saga de Cego Aderaldo" e "A menina Téti e o Eclipse do Tempo", por Rodrigo Marques.

"Ao falar de cordel no Ceará atualmente, é fundamental também destacar o nome do professor Gilmar de Carvalho, grande pesquisador. A literatura de cordel vem resistindo como cultura há muitos anos — e, para isso, também vem se adaptando às novas formas de divulgação. O Klévisson e o Rinaré, por exemplo, inovaram ao colocar histórias em quadrinhos em cordel. O formato do livro também é uma novidade muito bem-vinda, resultado desse trabalho dos cordelistas mais atuais", ressalta Rodrigo.

Entre as novas dinâmicas cordelistas, a Aluá criou um audiocordel disponível no Spotify e no YouTube. O cordel "A saga de Cego Aderaldo" é declamado e tem um acompanhamento musical da viola do Eduardo Buarque. "Também temos publicado poetas da zona rural, como Gescélio Felipe Coutinho, que escreveu um cordel sobre Quixeramobim chamado 'Quixeramobim, meu lugar, minhas raízes'. Esperamos que a Aluá contribua para esse movimento coletivo de preservação, de dinamização, de vivência, de convivência com as artes populares".

Silva Barros, parceiro de Rodrigo na Aluá, destaca que os bordados entre as artes visuais e a literatura são tradições ancestrais. "A arte popular há bem dizer um século é multimídia. O cordel é o poema, é a capa entalhada na madeira e são essas histórias que se contam nos centros e nas praças. Se juntar ainda mais a cantoria e as pelejas essa palavra inglesa aí mal dá de conta. Para mim, particularmente, a arte sempre foi sobre contar histórias. Com a Aluá, cada vez mais eu crio e recrio os meus saberes de literato e desenhista na gravura em linóleo, no cordel e na música popular para contar as histórias da minha cidade e do sertão. Quixadá e o Sertão Central há muito tempo são esse lugar onde importantes manifestações populares na arte e na política acontecem. Com a nossa primeira coleção, 'Os dez nomes do Sertão Central', revisitamos algumas dessas manifestações em forma de folhetim".

Dentre os novos projetos da Aluá, a reedição das famosas pelejas de Cego Aderaldo está prevista. Nas artes visuais, além das capas, os fundados planejam também uma coleção de gravuras com pássaros do sertão e outra com os monólitos e monumentos históricos de Quixadá. Nas buscas por "velejarmos nesse informar", nas palavras de Silva, o audiocordel ganhará novos capítulos.

"Pensando naquilo que tem sido realmente esforçoso, resgatar algumas dessas histórias ou mesmo recontar de forma lúdica, rimada e ilustrada causos conhecidos e fazer essa mensagem chegar às pessoas que anseiam por elas (e sabemos que há) tem sido nosso maior trabalho. Desde a nossa idealização, queremos que a Aluá seja um ponto em comum para as manifestações artísticas e culturais que a cidade possui e incita. Quixadá é uma terra de escritores preciosos, de músicos criativos, de pintores misteriosos e de belos monumentos naturais, e atravessando tudo isso há as histórias, fatos ou lendas a depender de quem as conta ou ouve, que dão muito pano pra manga (ou estrofe pra cordel)", finaliza o artista visual.

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