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Filme estrelado por Dira Paes retrata luta de maranhense contra o trabalho escravo
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Filme estrelado por Dira Paes retrata luta de maranhense contra o trabalho escravo

Inspirado em história real e dirigido por Renato Barbieri, "Pureza" chega aos cinemas nesta quinta-feira, 19
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Produção da obra durou 12 anos
 (Foto: Divulgação)
Foto: Divulgação Produção da obra durou 12 anos

Em 1993, a maranhense Pureza Lopes Loyola deixou a cidade de Bacabal, a 240km da capital do Maranhão, para ir em busca do filho Abel. Os dois trabalhavam com venda de tijolos quando o caçula decidiu deixar o estado para tentar a vida no garimpo, a fim de melhorar a renda familiar. Após meses sem receber notícias dele, a matriarca decide procurá-lo, levando apenas a roupa do corpo, uma bolsa, a Bíblia e a foto de Abel.

A busca a fez passar por municípios como Imperatriz e Altamira, alguns dos locais nos quais Pureza se deparou com um sistema de aliciamento e escravidão de trabalhadores rurais. Para encontrar o filho, ela se infiltra nas fazendas como cozinheira e toma conhecimento da exploração vivida pelos peões. Os homens têm seus documentos confiscados, se tornam dependentes para necessidades básicas, trabalham em condições precárias e são ameaçados de agressão e morte caso queiram fugir ou reivindicar seus direitos.

As vivências da maranhense nestas regiões inspiraram o longa “Pureza”, que estreia nos cinemas brasileiros nesta quinta-feira, 19. O enredo aborda a temática do trabalho escravo contemporâneo no Brasil e, de acordo com o diretor Renato Barbieri, a produção do filme durou 12 anos. O desenvolvimento do projeto começou ainda em 2007, após o cineasta ter lançado "Atlântico Negro" (1998) e "Terra de Quilombo - Espaços de Liberdade" (2002), trabalhos sobre negritude e escravidão. “Eu queria uma história universal”, explica sobre a escolha da narrativa, produzida por Marcus Ligocki Jr.

A decisão, então, pairou na trajetória daquela que se tornou uma das principais representantes no combate ao trabalho escravo. Após deixar as fazendas, por meio da ajuda da Comissão Pastoral da Terra (CPT), Pureza denunciou a situação para o Ministério do Trabalho e o Ministério Público do Trabalho no Maranhão, no Pará e em Brasília. Sua dedicação contínua para encontrar Abel, sonho realizado após três anos de intensa procura, impulsionou a criação do Grupo Especial Móvel de Fiscalização, que une agentes para viabilizar o cumprimento dos direitos trabalhistas. Entre 1995 e 2021, o movimento libertou mais de 57 mil trabalhadores em condições análogas à escravidão.

"O filme tem uma finalidade social, nós fizemos esse filme com o intuito de ter uma obra de arte cinematográfica que pudesse mostrar para a sociedade brasileira que a escravidão não acabou em 13 de maio de 1888. A verdade é que a escravidão contemporânea começou no dia 14 de maio de 1888, o Brasil nunca viveu sem escravidão", pontua Renato. Para escrever a trama, a equipe entrou em contato com Pureza. A maranhense, em um entendimento singelo sobre a importância do longa, disse que seria vista “pelos olhos do mundo” ao ser representada nos cinemas.

Ela disponibilizou todo o acervo de registros, com fotos, documentos e até cópias das cartas que escreveu para os presidentes Fernando Collor de Mello, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso, em uma tentativa de conseguir ajuda na busca pelo filho e obter sucesso na denúncia do que presenciou. "No filme, a gente mudou algumas coisas, porque o público tem que entender a geografia das locações. A gente fez contrações do cenário, para ficar mais organizado, mas tudo o que está no filme é pesquisa. Tem muitos trabalhadores nas mãos dos gatos (recrutadores de mão-de-obra escrava), muitas pessoas que ficam na linha de frente da liberdade e da justiça. Toda a locação foi feita por onde ela passou, no Maranhão, no Pará", desenvolve o diretor.

Com o roteiro estruturado, era a hora de escolher quem iria dar vida à personagem que carrega o nome do filme. Renato conta que logo a atriz Dira Paes “surgiu e ficou” na sua mente. "Ela falou que não foi um chamado, foi uma convocação (para o papel). Eu queria uma pessoa engajada e ela era diretora do Movimento Humanos Direitos”, relata o cineasta. O elenco é formado por atores do Pará, de Brasília e ainda conta com trabalhadores rurais que já tinham sido submetidos a trabalho escravo no passado, com preparação feita por Cláudio Barros, que interpreta o padre Flávio no filme. A obra ainda conta com nomes como Flávio Bauraqui, Mariana Nunes e Matheus Abreu.

Dira leva às telonas uma figura que, pessoalmente, é expansiva e expressiva. Mantém traços das falas e dos gestos, se preocupando em preservar cinematograficamente o arquétipo da mãe, que luta pelos filhos de tantas outras mulheres. Em 1997, Pureza recebeu em Londres o Prêmio Anti-Escravidão da Anti-Slavery International, a mais antiga organização de combate ao trabalho escravo, e auxiliou, apesar do retrocesso a partir do governo Temer, o País se tornar referência mundial no combate à temática.

"O filme traz o trabalho escravo que foi enfrentado por uma mulher simples e destemida. Tem uma questão de trazer dignidade, não só à invisibilidade do tema, que é crime, tendo como protagonista uma mulher que é tocada pela supremacia machista do patriarcado”, expressa Renato. Até o momento, "Pureza" conta com a participação de mais de 85 organizações atuantes na causa e já recebeu 28 prêmios nacionais e internacionais. "A protagonista é uma heroína sertaneja que ainda está viva, o que é importante. Ela em campo fez com que os abolicionistas criassem política pública, que o governo brasileiro reconhecesse o trabalho escravo. Dona Pureza é expoente", complementa o diretor.

Filme "Pureza" em Fortaleza

Quando: a partir de hoje, 19

Quanto: entre R$17,80 a meia e R$38,80 a inteira

Onde: Cinépolis RioMar Fortaleza (Rua Desembargador Lauro Nogueira, 1500); Kinoplex Iguatemi Fortaleza (Av. Washigton Soares, 85) e UCI Shopping Parangaba (Rua Germano Franck, 300)

Info: No site

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