As cores de Azuhli têm novos tons. E o tom da sua obra tem novas nuances. São mexicanas e fruto da passagem dela pela Cidade do México. Foi meteórica, mas o bastante para mexer com a paleta da artista. Nova paleta, mas ainda, sobretudo, óleo e acrílica sobre tela. Sobre as telas, também o encantamento com um catálogo de uma exposição ocorrida no Museu de Estanquillo intitulada "Que se abra esa puerta", sobre a obra de Carlos Monsivais, cuja temática é a diversidade sexual. Estava ali a inspiração à porta.
Azuhli partiu para investigar alguns registros de matrimônios ocorridos desde o século XIX até os dias de hoje. O primeiro registro fotográfico encontrado foi de um casal de mulheres sem data ou autor registrado. No mesmo trabalho, ela juntou a companheira que a visitava na América do Norte e o casal da foto em duas partes distintas. Foi sua primeira criação. Juntou, como ela descreve, o seu presente e seu passado. "Fala um pouco de ancestralidade dentro dessa comunidade que vivo. O que foi possível hoje foi por conta delas". Um casal de lésbicas vestido de androginia, dos anos 1920, perdeu o preto e branco original para ganhar cores intensas de celebração. Intituladas foram como "Sobre a quantidade de vezes que disse te amo".
Na temporada mexicana, conheceu um pouco da história Kika e Yu, o primeiro matrimônio homoafetivo do Equador. "O que eu vi foi um amor tranquilo e com muita intimidade, sendo maior que qualquer outra dificuldade. A vontade de estar junta é o suficiente. Porque o amor é a coisa mais importante". Ganharam o nome de "Cariño de las estrellas", com técnica mista sobre tela.
A história de amor dos amigos Bruno e Caio, casados durante uma festa de Carnaval de São Paulo em 2019, está no altar de Azuhli. "Para mim, um dos registros mais importantes que dei de cara até agora, porque fala um pouco do presente e da minha vontade de casar também, um dia, com a minha companheira. E que seja assim, cheio de cores e liberdade". A cena aparece em tinta óleo, acrílica e carvão sobre tela.
No México, Azuhli fez parte de um estágio artístico de três meses na academia Soma de arte contemporânea, instituição Mexicana dedicada às artes plásticas. Ela foi convidada por indicação de Pablo Léon de La Barra, curador de arte latino-americana do Museu Guggenheim de Nova York. Ela ocupou uma das duas vagas por trimestre do programa de residência artística. Ela teve uma artista peruana como contemporânea. Tiveram casa, comida e acesso a cursos diversos. Um achado. Mais do que isso, puderam experimentar a Cidade.
Pablo a conheceu ao passar por Fortaleza e visitar museus e outros espaços culturais da cidade. Na Galeria Leonardo Leal ele sentiu aquilo que se costuma sentir. O impacto das cores e imagens da cearense.
E, até 15 de junho, na Galeria Leonardo Leal, o público poderá ver aquilo que São Paulo já pode sentir antes, porque ela passou pela mostra SP-Arte já com obras produzidas em terras de Frida. A 18ª edição da SP-Arte, entre 6 e 10 de abril, no Pavilhão da Bienal, no Parque do Ibirapuera, reuniu mais de duas mil obras criadas por artistas de todo o mundo.
Apesar dos pesares
O POVO - O que o convívio com artistas de diferentes lugares do mundo te ensinou sobre o amor?
Azuhli - Olha, o tempo é muito relativo nas relações, né? Tem pessoas que conhecemos por pouco tempo e já consideramos importante em nossas vidas. Nesses três meses vivendo e trabalhando no México, conheci pessoas do mundo todo, e tentava sempre conhecer um pouco de cada lugar que aquelas pessoas vieram. Quais eram suas histórias e o que fizeram chegar até aqui, pensando onde eu também.
OP - Diante do cenário político no Brasil de 2022, como defender o amor?
Azuhli - Percebo que são tempos difíceis para falar sobre o amor, parece muito que as pessoas esqueceram como abraçar ou dar carinho. O que vemos na mídia é a juventude negra sendo sendo massacrada. São tempos sombrios, eu sei. Por isso preparei a exposição para reacender aquele fogo que só a esperança de um mundo melhor.
OP - Depois desse período de residência fora, o que te saltou aos olhos quando reencontrou Fortaleza?
Azuhli - Pensava o tempo todo que Fortaleza precisa de mais equipamentos culturais, com exposições e muita gente transitando. E quando voltei encontrei a minha cidade com muita programação cultural nova, fiquei feliz. Mas ainda acho que estamos ainda engatinhando, os artistas e todas os trabalhadores do setor cultural precisam de mais assistência, mais oportunidades, sabe?
OP - O que essa exposição individual simboliza no atual momento da sua carreira artística?
Azuhli - Sinto que meu trabalho tem um papel importante de mostrar o lado não muito falado das relações homoafetivas, aquelas relações são reais. Elas aconteceram e mudaram nossa história.
O amor é a coisa mais importante
Quando: até 15 de junho
Onde: Galeria Leonardo Leal (rua Visconde de Mauá, 1515 - Aldeota)
Informações: Instagram @galerialeonardoleal
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