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Geraldo Azevedo celebra 50 anos de carreira em entrevista: ‘Resistência cultural’
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Geraldo Azevedo celebra 50 anos de carreira em entrevista: ‘Resistência cultural’

Último convidado do projeto Grandes Nomes, disponível nas redes sociais do O POVO, o cantor Geraldo Azevedo revisita o passado e reflete sobre mudanças no meio artístico
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Cantor e compositor Geraldo Azevedo  (Foto: DIVULGAÇÃO)
Foto: DIVULGAÇÃO Cantor e compositor Geraldo Azevedo

O compositor e cantor Geraldo Azevedo foi o último convidado do projeto Grandes Nomes, série realizada pelo grupo de comunicação O POVO há quase duas décadas. Em conversa com os jornalistas Camila Lima e Marcos Sampaio na sexta-feira, 24, o pernambucano relembrou sua trajetória e ainda discutiu sobre música, tecnologia e o Brasil de hoje. "Eu trabalho para dignificar a humanidade. Tem que fazer com muita responsabilidade, sabendo que a gente pode dar algo a mais para as pessoas", sintetizou o artista .

Nascido no dia 11 de janeiro de 1945 em Jatobá, na zona rural do município de Petrolina, em Pernambuco, cresceu à beira do Rio São Francisco. A proximidade com a natureza vinha da pesca, do terreno fértil para plantação e da brincadeira com o "pé no chão". Ganhou o primeiro violão aos cinco anos de idade e ainda na infância descobriu a importância da palavra. "A nossa casa era como se fosse um centro cultural, minha mãe dava aula de alfabetização de manhã para as crianças e de noite para os adultos", relembra. A matriarca, Dona Nenzinha, também foi a responsável por colocar Geraldo em um palco pela primeira vez, quando interpretou "Meu Cigarro de Palha", de Luiz Gonzaga, em uma apresentação escolar.

Porém, apesar das investidas iniciais, o pernambucano não tinha planos de seguir com carreira na música. Sonhava em ser arquiteto e, aos treze, se mudou para Petrolina para estudar. "Depois fui para o Recife fazer o científico e entrar na faculdade. Só que levaram um violão e a música me levou a outro lugar". Na capital, Geraldo se aproximou da arte a partir da amizade com Naná Vasconcelos, Teca Calazans e Paulo Guimarães, integrantes do grupo "Construção". Ele continuou tocando em bares, como o Aroeira, até ser convidado para compor a banda do primeiro show solo da cantora Eliana Pittman, no Rio de Janeiro. "Eu vinha daquele movimento de Pernambuco, os diretórios culturais da gente estavam muito ligados ao movimento popular. Quando eu cheguei e vi que tive que aprender música americana ficava de orelha em pé. Mas, por outro lado, era muito rico aprender aquelas canções de jazz". Seu percurso musical, mesmo sem a intenção, já se tornava certo.

Diversidade musical

Na entrevista, Geraldo listou algumas de suas referências, desde a Tropicália até os Beatles. "Quando eu comecei a querer ser violonista, comecei a aprender música erudita, mas foi o Baden Powell que me seduziu para ser um violonista. Até hoje acho que nunca pensei que fosse ser um instrumentista desse nível, é preciso tocar muito. Penso que comecei a ser compositor para eliminar essa sede de querer ser instrumentista, hoje eu sou um compositor que toca bem", considera. Autodidata, o artista nunca teve aulas em escolas de música, afirma que é algo que vai "do coração para os dedos". Nos últimos tempos, se dedica a aprofundar conhecimento sobre o canto. "Esse estudo me favoreceu em muita coisa, a usar o diafragma, que eu não sabia. Tudo me deu mais possibilidade de resistência. Porém, o coração é quem manda. E as canções são ligadas ao sentimento, não só a música em si, mas o conteúdo do que transpõe para a vida".

 

Defensor das diferentes manifestações culturais brasileiras, o cantor destaca a riqueza dos ritmos nordestinos e traça paralelo com o preconceito sofrido por companheiros na década de 80. "As pessoas viam a gente como os ‘paraíbas’ ou baianos. Eu sempre acho que o Brasil teve três movimentos importantes: a Bossa Nova, o tropicalismo, e o movimento que não teve título, que foi esse momento que surgiu Belchior, Moraes Moreira, Fagner, Zé Ramalho, Alceu Valença. Foi muito importante trazer uma nova vertente da música brasileira", completa. Entre os colegas, enfatiza o trabalho do cearense Fausto Nilo, com quem colaborou em "Dona da Minha Cabeça" (1986) e "Talvez Seja Real" (1985). "O Fausto é a cabeça universal do Ceará. Ele chega ao povo através de uma poesia tão rica, de uma maneira tão simples", elogia.

Tecnologia e futuro

Já quando menciona as mudanças no meio artístico, diz sentir “carência" da poesia e afirma temer as consequências dos avanços tecnológicos em âmbitos políticos e sociais. "Essa coisa de fake news é aberrante demais. Eu acho que a internet é muito boa, dá pano para manga para qualquer atividade que exista nesse planeta, mas a gente tem que aprender a ter certo controle", comenta.

Preso durante a ditadura militar, o compositor veio de uma "geração de resistência cultural" e considera que o País teve uma "regressão" nos últimos tempos. "A gente está vendo ameaças contra a democracia. Existe ainda uma alienação muito grande. Tanto é que, nessas eleições, a gente viu que pode perder muita coisa se não tiver consciência que o nosso voto é benéfico. Eu sou uma pessoa otimista, mas tenho muito medo também de reviver umas coisas", pontua.

Entretanto, em horizontes otimistas, Geraldo continua com agenda de shows e sonha com um Brasil como ilustra na composição "Casa Brasileira" (1989): com mangueiras no quintal, rosas no jardim e um tanto de identidade. "Não tem país no mundo que tenha essa diversidade, com essa dimensão".

Grandes Nomes 2022

O "Grandes Nomes" foi o primeiro trabalho desenvolvido pelo núcleo de projetos especiais do O POVO, em 2003, como iniciativa da rádio O POVO CBN. Anualmente, o Grupo recebe cinco nomes de diferentes áreas de atuação e com notável reconhecimento do público brasileiro e, em particular, cearense.

As apresentações são feitas pela jornalista Camila Lima, sob a coordenação geral de Nazareno Albuquerque e coordenação executiva de Valéria Xavier, do O POVO. O projeto tem patrocínio da Assembleia Legislativa do Ceará e do Sebrae-CE. Nestes 19 anos, já foram entrevistados nomes como Chico Anysio, Elke Maravilha, Zilda Arns, Kennedy Alencar, Marina Silva, Natalia Pasternak, Ricardo Galvão, Camilo Santana, Severino Ramalho Neto, Carlos Lupi e Luiza Trajano.

A edição de 2022 aconteceu entre os dias 20 e 24 de junho, com a participação de Júlio Lancelotti, Karla Karenina, Juca Kfouri, Joaquim Melo e Geraldo Azevedo. As entrevistas estão disponíveis no Youtube e Facebook do O POVO.

 

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