“Eu comecei minha carreira acreditando na possibilidade de ajudar a sociedade como um intérprete, com um ator com habilidade, vontade e capacidade, porque esse é meu trabalho. É isso que sei fazer: estar a serviço dessa força transformadora. Então, me sinto muito bem aventurado de viver esse momento”. Quando o ator paulista Eriberto Leão pondera sobre sua trajetória, é inevitável falar sobre sua jornada como ator - e como ele sente que, a partir de sua profissão, pode espalhar mensagens positivas de transformação, principalmente a partir do amor.
Em junho, o ator - conhecido por atuações em filmes como “Assalto ao Banco Central” e novelas como “Insensato Coração” - completou 50 anos. Dois meses depois, se viu diante de marcos na sua carreira, com encerramento de novela, estreia de filmes, série e também peça de teatro. Em entrevista exclusiva ao Vida&Arte, ele repercute sobre obras recentes e projetos para o futuro.
Além da Ilusão
Um dos destaques recentes na carreira de Eriberto foi o seu papel na novela “Além da Ilusão”, da TV Globo, quando deu vida a Leônidas Lobato, homem de origem misteriosa e supostamente um tecelão. “O Leônidas foi um personagem com muitas camadas, que chegou na hora certa para mim, porque ele exige muita maturidade de um ator para dar vida a ele. Eu me senti bastante alinhado com essa maturidade dele e também com suas imperfeições”, afirma.
A novela chegou ao fim em 19 de agosto, e foi um marco para Leão. “Eu, como ator, aprendi e cresci muito durante esse trabalho, porque o Leônidas era muito observador, por ele ser um estudioso, autodidata, então ele tinha uma capacidade de observação absurda”, relata.
Para Eriberto, a novela conseguiu discutir questões como a luta antimanicomial e levar às pessoas reflexões sobre o quanto “deixamos de acreditar na cura pelo amor e pelo afeto em tempos difíceis como os que estamos vivendo”. Diante disso, ele lembra de um dos seus grandes ídolos, o cantor e compositor cearense Belchior. “Ele foi um profeta. Creio que muitas das mensagens dele foram escritas de alguma forma para os dias de hoje, como ‘a felicidade é uma arma quente’. A alegria é o amor”.
Ilha de Ferro
Personagem bastante diferente de Leônidas foi, para Eriberto, o que interpretou na segunda temporada da série “Ilha de Ferro”, que estreou na TV Globo em 25 de agosto. Como afirma o ator, “Diogo é um homem que só pensa em si mesmo e carrega egoísmo”. Na sua visão, “ele é um predador” - e, por isso, decidiu ficar em jejum intermitente de 16 horas antes das gravações.
Ele aponta que fez isso para se inspirar em um predador com fome, que tem a visão e a audição mais aguçadas “porque está prestes a encontrar uma presa”. “O Diogo é isso: um capitalista selvagem, que só pensa em si mesmo e no lucro”, complementa. Na obra, ele é o presidente da petrolífera PLT-137, local onde é ambientada a história.
“Ilha de Ferro” foi lançada inicialmente na Globoplay, uma plataforma de streaming. Atuando nas duas frentes - tanto na televisão quanto no streaming -, Eriberto Leão acredita que esse movimento do mercado em relação às produções audiovisuais “é irreversível”. “A curto prazo, a televisão ainda vai ter liderança de audiência. A médio prazo, acredito que terá algo próximo do empate. A longo prazo é um ponto de interrogação, mas acredito que isso é muito bom para o mercado porque os trabalhos podem ficar perenes e serem vistos a qualquer momento”, destaca.
O Astronauta
“Tinha tudo a ver comigo”. É dessa forma que o ator encara seu papel na peça “O Astronauta”, dirigida por José Luiz Jr. e em cartaz desde 29 de agosto. Na obra, Eriberto interpreta um homem que se veste de astronauta e está cercado por um ambiente parecido com uma nave espacial. Sem local e tempo definidos, ele crê ter embarcado em uma missão intergaláctica para buscar sinais de vida em outro planeta.
Entretanto, a viagem não sai como era esperado e ele vaga solitariamente pelo espaço, tendo uma jornada de autoconhecimento a partir de reflexões sobre sua própria existência. O trabalho de ficção científica tem referências ao filme “2001 - Uma Odisséia no Espaço” e à música “Space Oddity'', de David Bowie.
O espetáculo enfim pôde ser apresentado presencialmente após ter sido adiado pela pandemia e ter ganhado versão on-line. Apenas Leão aparece sobre o palco - os outros atores surgem em vídeos projetados. “As primeiras duas apresentações foram incríveis. As pessoas estão saindo tocadas do espetáculo. Todos nós somos astronautas e poeira em meio às estrelas”, diz.
Maior Que o Mundo
O ator paulista também mostra sua versatilidade na comédia, como no filme “Maior Que O Mundo”, que estreou em 18 de agosto. Ele vive o escritor Kbeto, que, ao encontrar uma diário perdido, transcreve o manuscrito para vender a história como se fosse sua - entretanto, ele precisa lidar com as consequências dessa atitude. Esse foi o último filme estrelado pela atriz e escritora Fernanda Young, que faleceu em 2019 vítima de um ataque cardíaco. “É muito emocionante lembrar dela. Pude conhecê-la um pouco mais e fiquei extremamente encantado com a sua inteligência, sensibilidade, afeto e habilidade de falar sobre questões políticas sociais”, compartilha Eriberto sobre a convivência com a artista.
Passado, presente e futuro
Cinco décadas de vida não são cinco dias, e em sua bagagem Eriberto carrega experiências em diferentes áreas artísticas - afinal, filmes, peças e novelas ajudam a contar essa história. Para o ator, um sentimento pode resumir a percepção sobre sua trajetória: gratidão. “Eu sou muito grato pelas oportunidades que tive e pelos personagens nos quais eu pude dar a vida. Aprendi com todos, e todos foram muito especiais para mim. Isso me faz realmente ter uma gratidão muito sincera a Deus, ao universo, ao destino, enfim, ao nome que você quiser dar”, enfatiza.
Entretanto, não significa que deseje parar agora. Para o ator, ainda há mais passos a serem dados. “Ainda ambiciono personagens ainda melhores, ainda mais verticais, mais profundos e maduros”, aponta. Ele também planeja viajar pelo Brasil com “O Astronauta” e até fazer musicais sobre alguns de seus ídolos, como o cantor Jim Morrison e Belchior. Sobra espaço até para a literatura: um de seus sonhos é poder contar a “história da fase final” da vida do escritor russo Liev Tolstói. “Poucas pessoas conhecem sua história, e eu quero levar isso adiante”, projeta.
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