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Chico Buarque volta aos palcos com turnê que celebra o samba
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Chico Buarque volta aos palcos com turnê que celebra o samba

Escritor, professor e juiz, Mantovanni Colares é pesquisador da obra do Chico Buarque há 40 anos; autor analisa volta do músico aos palcos em turnê que chega agora a Fortaleza
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Quando: sábado, 22, e domingo, 23, às às 21 horas; abertura dos portões às 19h30min
Onde: Centro de Eventos do Ceará (Av. Washington Soares, 999 - Edson Queiroz)
Quanto: R$ 350 (mesa); vendas no site Bilheteria Virtual e na loja Yuri Costa no shopping Iguatemi

  (Foto: Divulgação)
Foto: Divulgação Quando: sábado, 22, e domingo, 23, às às 21 horas; abertura dos portões às 19h30min Onde: Centro de Eventos do Ceará (Av. Washington Soares, 999 - Edson Queiroz) Quanto: R$ 350 (mesa); vendas no site Bilheteria Virtual e na loja Yuri Costa no shopping Iguatemi

Um pouco de paciência, por gentileza, ao ler estas palavras, ainda que as leitoras e os leitores não venham a seguir o rumo para o qual elas irão sugerir; sei o quanto é difícil em tempos de tecnologia, redes sociais e imediatismo, alargar um pouco a contagem do tempo, tão premido por essa angústia dos segundos.

Agradeço de logo se ao menos levarem em consideração a narrativa de alguém que acompanha há 40 anos a obra musical de Chico Buarque. E ele está de volta aos shows. Sim, hoje, 22, e amanhã, 23, teremos o privilégio de recebermos em Fortaleza a turnê "Que tal um samba?", iniciada em 6 de setembro em João Pessoa. Aliás, ali estive, vivenciando o momento repetido algumas vezes ao longo das últimas décadas, do reencontro do Chico com o palco.

Spoiler aqui, nem pensar. Fiquem tranquilo. Não estragarei em nada o show. Nem divulgarei a lista das músicas, embora já espalhada por aí. Mas acredito que muitas pessoas irão ao espetáculo sem ter tido a curiosidade de conferir o setlist. A paciência que lhes rogo é para outro ponto a ser explorado, uma experiência a ser vivenciada.

Depois de ingressarem no Centro de Eventos, após selfies, prints e postagens, se acomodem e observem o cenário. Pouca coisa mudou desde o século IX a. C., quando na Grécia antiga se fazia a representação de uma situação, a fim de estimular o público, a partir de um drama narrado por artistas. Surgia o teatro. O cenário hoje ainda é o mesmo: artistas, palco e plateia. No caso do show, a história é contada mediante a costura das músicas, e nesse ponto Chico estrutura suas apresentações com um fio condutor adornado pelas canções a transportar as pessoas no tempo e no espaço.

Ali, no centro do palco, estarão Chico e Mônica Salmaso - isso não é spoiler, já nos anúncios do espetáculo se divulgava essa participação especial -, e a banda que acompanha esse artista brasileiro há décadas, alguns há mais de 40 anos, como Chico Batera, a maioria há praticamente 30 anos, e só mais recentemente Jurim Moreira, substituindo Wilson da Neves, desde o momento no qual ele decidiu tocar bateria usando as estrelas como instrumentos.

Os músicos ficam em formação de um desenho de semicírculo. Da perspectiva do Chico, no centro do palco, esse traço que o circunda começa na ponta esquerda com o Maestro Luiz Cláudio Ramos. Além dos instrumentos de corda por ele dedilhados, é arranjador e maestro, está de forma impecável atento a todos os demais músicos, regendo a banda com gestos discretos e olhares. Chico também acompanha os movimentos do maestro. Se vocês observarem bem, perceberão de vez em quando um sorriso de orgulho de Luiz Cláudio Ramos após o término de determinadas músicas.

Ao lado do maestro, com seus sopros perfeitos, Marcelo Bernardes, a elegância contida de uma aparente timidez, é ali onde ele agrega os sons metálicos às cordas e percussão dos outros integrantes da banda. Vizinho a Marcelo Bernardes, no traço do desenho do semicírculo, a tecladista Bia Paes Leme, cuja voz afinadíssima é igualmente lançada em determinados momentos do show.

É possível notar no caminho desse arco imaginário no chão no qual ficam os músicos, uma espécie de ilha, é Chico Batera cercado de instrumentos de percussão por todos os lados, e são tantas as alterações no caminhar dele nessa ilha, que juramos em determinados momentos que ali tem mais de um Chico Batera. Continuando o desenho do semicírculo, a bateria de Jurim Moreira, vigorosa e ao mesmo tempo discreta, para não se sobrepor aos demais sons. Em seguida, Jorge Hélder, com seu já conhecido contrabaixo, mas tem surpresas de outras cordas ao longo do show. Por fim, fechando esse semicírculo, João Rebouças ao piano, conduzindo nas teclas a suavidade dos tons que por vezes nos faz lembrar o Tom.

Após percorrerem seus olhares por esse arco que abraça o Chico no centro do palco, verifiquem que ele tem múltiplas preocupações e atitudes para desempenhar ali sua alma mambembe. Ele precisa estar atento a todos os músicos e principalmente ao maestro, tocar violão sem olhar qualquer partitura, assim como cantar sem teleprompter (equipamento eletrônico que exibiria as letras das canções) ou ponto de ouvido a lhe soprar os poemas. Canta, toca, tudo de memória, embalado pela banda da qual deve estar em sintonia. E faz com imenso profissionalismo e respeito ao público. O cantautor, como ele gosta de falar, já que interpreta as próprias músicas, está em sua melhor forma, no auge da maturidade, a voz inconfundível a entoar canções como quem nos conduz de forma mágica aos mundos por ele criados. Agora, nessa nova temporada, Chico divide o palco com a indescritível Mônica Salmaso; nada vou dizer sobre o seu cantar, só me contem depois se conseguiram segurar o choro de emoção.

"Que tal um samba?", para quem ficar atento a esses detalhes, é a mais pura expressão da arte e seu compromisso de reafirmação da famosa frase de Nietzsche: "sem música a vida seria um erro".

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