“A história que vou contar / É de amor, superação / De um menino corajoso / Que encarou o sertão/ E toda a sua magia / Com muita sabedoria, / Resistência e doação”. Os sete primeiros versos do cordel biográfico “Espedito Seleiro: Um menino, um mestre”, da escritora e professora Flávia Nonato, introduzem uma narrativa poética sobre a vida do artesão cearense Espedito Seleiro, grande referência na arte em couro tanto a nível nacional quanto a nível internacional.
Por meio de 54 estrofes, o livro apresenta a história de Seleiro desde seu início como artesão, quando ainda era bastante jovem e observava seu pai produzindo peças em couro para fazendeiros, vaqueiros, tropeiros e roceiros. Dedicado ao universo infantil e com ilustrações do artista Álisson Flor, o trabalho busca apresentar de forma “leve e encantadora” às novas gerações os legados construídos e deixados pelo artesão.
O livro foi lançado na XIV Bienal Internacional do Livro do Ceará, e o evento de lançamento contou com as presenças de Flávia Nonato e do próprio Espedito Seleiro. Reverenciado pelo público que acompanhou o momento e celebrado por apreciadores de sua arte de diferentes faixas etárias, o mestre teve agenda cheia no último dia 19, e encontrou um espaço para conversar com este repórter no Centro de Eventos após sessão de autógrafos.
Hoje com 83 anos, Espedito Seleiro carregava consigo brilho nos olhos de uma alma que continua jovem, e ainda com muitos desejos a serem alcançados. “Eu não vou dizer que estou totalmente realizado, porque não estou. Ainda tem algumas coisas que estou sonhando e que ainda vão acontecer, se Deus quiser”, compartilhou.
Questionado sobre quais seriam as metas futuras vislumbradas em seu horizonte, o artesão não revelou detalhes, mas foi possível notar que, independentemente de quais sejam esses sonhos, são etapas que ressaltam os legados deixados por Espedito Seleiro a partir de sua arte. Alguns deles, por sinal, podem ser conferidos no livro de Flávia Nonato, como a compreensão de que, “sozinho, não se chega longe”.
“A gente sozinho não vai pra lugar nenhum no mundo, você tem que ter alguém pra lhe ajudar a crescer, porque se você ficar sozinho parado você não vai pra lugar nenhum. Esse livro as pessoas vão ler e vão conhecer que a vida não é só do jeito que elas pensam, é do jeito que Deus manda. Existem sacrifícios pelo meio, tem algumas histórias difíceis que é muito difícil as pessoas novas acreditarem e entenderem”, afirma o artista, destacando as histórias de sua vida resgatadas na obra.
Foi observando seu pai que o aprendiz pôde, posteriormente, se tornar mestre. Se a sua arte começou trazendo bastante da sua identificação regional sertaneja, Espedito Seleiro garante que esse sentimento não mudou ao longo dos anos. Apesar de vir de uma família que já tinha costumes de produção de peças em couro, ele desenvolveu um estilo próprio - que faz questão de destacar.
“Acho que esse sentimento vai continuar e eu espero que não pare tão cedo. É tão bom quando você faz algo que o pessoal dá valor, que gosta, você tem que continuar e não parar tão cedo e passar isso pra alguém. Foi uma coisa que eu plantei e também venho mantendo tradição de família, só que eu faço um estilo próprio que vem se mantendo e eu criei uma turma da família que eu estou mantendo isso, plantando e vão ficar com ele até o mundo acabar”, garante.
A tradição, aliás, é repassada para seus dois filhos e suas duas filhas, que também produzem peças em couro e trabalham junto com o mestre - todos com “gosto pelo trabalho”. “A ciência do trabalho é gostar do que faz. Se você tem suia profissão e não gosta dela, é um desperdício de vida, mas eu acredito que na hora que eu sair daqui eles vão continuar”, aponta.
São o conhecimento e sua arte também outros legados repassados: “A história eu vou deixar. O que precisar, o conhecimento, vou deixar pra eles. E eles que continuem. Peço a Deus que dê certo até o fim das suas vidas, porque é tão legal você viver de uma profissão que o pessoal dá valor, adora, compra, fica satisfeito quando vê aquilo… Eu também fico satisfeito por isso”.
Os reflexos dessa história consolidada aparecem nos versos que encerram o livro construído em sua homenagem. Como enuncia Flávia Nonato, “O Ceará se orgulha / Desse forte nordestino, / Que pelo amor à arte / Traçou bem o seu destino, / Construiu a sua história / Nessa linda trajetória / Que vive desde menino”.
Veja mais sobre o Vida&Arte na Bienal do Livro:
Espedito Seleiro: Um menino, um mestre
De Flávia Nonato com ilustrações de Álisson Flor
Ed. Cene
72 páginas
Quanto: R$54,90
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