Cento e oito anos já se passaram desde o nascimento de Ciça Maria de Araújo. Mais conhecida como “Ciça do Barro Cru”, a cearense se tornou um ícone da arte e da cultura popular com sua técnica e criatividade ao modelar a terra. A partir de suas mãos, o barro se transformava em aves, animais domésticos, pessoas no cotidiano, estatuetas e outros conjuntos.
De origem indígena e pobre, ela se tornou famosa pela arte que fazia. As peças de sua criação viajaram o mundo, em museus, coleções particulares de arte e mostras, mas também eram admiradas por pessoas de sua terra, no Sítio São José, em Juazeiro do Norte. A partir delas, muitas crianças aprendiam sobre as manifestações culturais populares e seus diversos significados.
Ciça do Barro Cru faleceu em 1994, mas seu legado continua vivo. Baseando-se na trajetória da mestre da cultura, o Grupo de Teatro Experimental de Cultura apresenta no Cineteatro São Luiz nesta terça-feira, 21, o espetáculo “Barro Cru”, do pedagogo, ator, diretor teatral e dramaturgo cearense Walden Luiz. A peça ocorre dentro da faixa de programação “Curta Mais Teatro”.
O musical é gratuito e não haverá distribuição de ingressos. O trabalho passa pela narrativa dos elementos criados a partir do barro que ajudam na sobrevivência do povo sertanejo e “mostra como as lendas, as músicas, o misticismo, a religiosidade, as danças e os artesanatos” ajudam-no a “vencer as adversidades”.
O espetáculo é uma adaptação livre baseada no livro “Cultura Insubmissa - Estudos e Reportagens”, de Rosemberg Cariry e Oswald Barroso, que contém texto a respeito da artista da cerâmica. “Achei muito interessante que a Dona Ciça trabalhava com barro e não botava para queimar as peças dela, ela deixava todas crus e dava uma demão de tinta - branca, vermelha, azul, dependendo do que fosse”, afirma Walden Luiz.
“Ela tinha uma criação muito grande e farta de personagens. Esse acervo ficou quase perdido porque, como ela não queimava, não tinha muita resistência e quebrava facilmente. Então, quem tem alguma peça da Dona Ciça tem uma relíquia e uma obra-prima”, acrescenta o diretor.
Com o musical, busca divulgar o trabalho da artista, mas destaca que não se trata de “uma biografia” sobre Dona Ciça. “Eu fiz uma criação em cima da obra dela e das peças que fazia, do modo de vida dela”, relata. Assim, a peça também permeia costumes e lendas do Cariri, como uma forma de ampliar o conhecimento sobre a cultura popular da região.
Além de falar sobre uma artista importante da cultura cearense e de se propor a tratar da sabedoria popular, “Barro Cru” é especial para Walden Luiz porque marca, de certa forma, o seu retorno ao posto de diretor após passar por um período difícil. Em outubro de 2022, ele teve chikungunya e, depois de fazer exames no hospital, descobriu que também estava com Covid-19.
Walden ficou hospitalizado até janeiro, mês no qual recebeu alta. Ele voltou para casa, mas ainda está se locomovendo por meio de cadeira de rodas. “Estou melhorando, graças a Deus e aos médicos. Tenho tomado remédios e melhorado”, revela.
“Como eu estava doente, eu pedi a outra pessoa para fazer a direção. Eu dirigi até certo ponto e participei como assistente de direção. Nos últimos dias, pedi ao (diretor e ator) Antônio Marcelo para tomar conta da direção. Foi ele quem tomou conta e deu certo”, compartilha.
“Barro Cru” não é importante para Walden Luiz “apenas” pelo seu retorno, ainda que gradual, à direção de espetáculos após as dificuldades causadas pela Covid-19. Em 2023, ele completa 60 anos de carreira no teatro. Logo, o espetáculo é o início das comemorações ao longo do ano pela sua trajetória cênica.
Assim, não há como negar o lado fundamental do teatro em sua vida: “Eu acho o teatro importantíssimo na vida das pessoas, principalmente na educação dos jovens. É muito importante. O que você vê em uma peça você não esquece mais. Fica gravado na sua memória para sempre. Comigo foi assim”.
Walden também relata: “O que eu vi de teatro infantil quando era criança ainda lembro e guardo com muito carinho. O teatro tem uma importância muito grande na formação dos jovens. É muito relevante saber escolher o espetáculo que vai ver. Esteja sempre assistindo a peças de teatro ou lendo-as”.
Em 1º de abril, será apresentado outro espetáculo com participação de Walden Luiz: a peça “Cajueiro da Verdade”. A obra acontecerá com direção de Arlindo Araújo no Teatro Chico Anysio e, também musical, falará sobre o “Cajueiro da Mentira” que existia na Praça do Ferreira. A árvore histórica era o ponto preferido de conversa dos frequentadores da praça, que se reuniam no Dia Internacional da Mentira para realizar o “concurso de mentiras”. Na ocasião, era campeã a pessoa que contasse a história mais mentirosa.
Barro Cru
Quando: terça-feira, 21, às 16 horas
Onde: Cineteatro São Luiz (Rua Major Facundo, 500 – Centro)
Gratuito
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