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Wilemara Barros celebra 50 anos de dança com solo autobiográfico
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Wilemara Barros celebra 50 anos de dança com solo autobiográfico

Wilemara Barros se apresenta quinta, 27, no Centro Cultural Bom Jardim, e sexta, 28, no Theatro José de Alencar
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Wilemara Barros, Dança, Vida & Arte, Cultura,  Centro Cultural Bom Jardim, Theatro José de Alencar (Foto: Luciano Gomes/ Divulgação )
Foto: Luciano Gomes/ Divulgação Wilemara Barros, Dança, Vida & Arte, Cultura, Centro Cultural Bom Jardim, Theatro José de Alencar

Na ponta dos pés, com movimentos rápidos, precisos e que encantam. Foi uma longa jornada para alcançar essa técnica. A cearense, bailarina e professora de dança clássica Wilemara Barros completa 50 anos de carreira. São quase 60 anos de idade, trajetórias de vida e arte que nem se separam mais. Hoje ela é consagrada como uma das mais renomadas bailarinas brasileiras de sua geração e uma referência da técnica clássica.

Em celebração aos 50 anos de história no mundo da dança, a bailarina apresenta o solo autobiográfico "Preta Rainha". Wila, como prefere ser chamada, se apresenta hoje, 27, às 19 horas, no Centro Cultural Bom Jardim e amanhã, 28, no palco principal do Theatro José de Alencar.

O novo solo traz as lembranças afetivas de uma trajetória marcada pela luta anti-racista, a quebra de paradigmas e as conquistas que a tornaram reconhecida nacional e internacionalmente. Wila foi uma das primeiras bailarinas negras do Ceará. Ainda na década de 70, quando iniciou, ela teve de enfrentar inúmeros preconceitos de uma sociedade não acostumada a ver negros em lugar de destaque.

A bailarina conta que o desejo de atuar na dança foi como uma sina, não era vontade dela, mas da mãe, que quando nova sonhava em ser bailarina, desistindo por causa da elitização na dança e também porquê na infância da mãe "as bailarinas não eram vistas com bons olhos".

Filha de uma dona de casa e um operário, Wila relata que pagar uma escola de dança não era uma opção. Quando tinha dez anos foi levada pela mãe para para uma seleção com mais de 400 crianças. Todas queriam entrar na Escola de Balé Clássico e Dança Neoclássica do SESI da Barra do Ceará, o curso era destinado para os filhos de operários da indústria. Wila passou e ali iniciou sua longa jornada na dança.

Entre uma coreografia e outra ela encontrou seu amor pela arte e viu sua vida se transformar. Ensinada pelo professor Dennis Gray, ela aprendeu a se expressar através dos passos. No meio do ambiente artístico, também aprendeu que aquele mundo podia ser cruel. Em uma cidade em que a maioria das bailarinas era branca, Wila teve de ouvir os diversos comentários maldosos, sendo diversas vezes referida como "mulata" - termo pejorativo para mulheres negras - comentários esses tecidos muitas vezes pelo próprio professor.

A cearense lembra que quando iniciou não se "percebia nesse lugar de criança negra", mas que "naquela época as mulheres negras não ocupavam nenhum lugar de destaque. Elas não tinham esse lugar de estrela dos balés, de repertórios na dança clássica. Não tinha representatividade".

Nessa longa dança da vida, Wila sempre colocou seu corpo como um instrumento político. Em cima do palco o corpo sempre foi porta-voz de lutas e resistência. "Meu corpo é a minha voz , a partir dele eu ganho espaço. É o meu escudo. Meu corpo é político porque com ele eu tenho de falar o que eu penso através dos meus trabalhos", ressalta.

Um dos momentos importantes de sua carreira foi a apresentação da Bienal Internacional de Dança de 2017. Sob os holofotes, a bailarina apresentou o grande clássico "A Morte dos Cisnes". Naquele dia ela fez algo simples, mas extremamente simbólico: entrou em cena com sapatilha e saia tutu da cor da pele. Para ela, isso é de uma representatividade imensa para as milhares de meninas negras que sonham em ser bailarinas.

"Isso é muito importante, tem uma representatividade muito grande em relação com as bailarinas jovens que estão começando agora, que são pretas e que vêm da periferia. De entender que elas podem estar nesse lugar", destaca.

Onde é o lugar do corpo negro? Na década de 1970 muitos diriam que não havia espaços para esse corpo e os poucos que restavam estavam nas margens sociais, mas Wilemara Barros mostrou que esse lugar poderia ser onde ela quisesse, inclusive em cima dos palcos com sapatilhas de ponta, no meio da arte. Wila ressignificou as dores e se tornou resistência no meio de uma arte elitizada. Hoje o mundo está mudando, pessoas negras estão em espaços antes nunca imaginados e Wila tem a esperança de que a arte da dança continue transformando a vida de outras milhares de crianças negras que sonham com a dança, assim como foi com ela.

Solo Preta Rainha

Quinta-feira, 27

19 horas - Centro Cultural Bom Jardim (Rua 3 Corações, 400 - Granja Lisboa)

Sexta-feira, 28

19h30min - Theatro José de Alencar (rua Liberato Barroso, 525 - Centro)

Apresentações gratuitas. Distribuição de ingressos 1 hora antes do espetáculo

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