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Virginia Woolf: o que revelam os diários da autora
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Virginia Woolf: o que revelam os diários da autora

Diários da escritora Virginia Woolf, na íntegra, são publicados pela primeira vez no Brasil; textos revelam detalhes da produção literária da inglesa
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capa virginia woolf (Foto: jansen lucas)
Foto: jansen lucas capa virginia woolf

Virginia Woolf estava com o marido na residência do casal, em Rodmell, no interior da Inglaterra, quando recebeu a notícia de que a casa onde havia morado e trabalhado em Londres, na Tavistock Square, tinha sido bombardeada durante a Segunda Guerra Mundial. A escritora e o companheiro, Leonard, donos da famosa editora Hogarts Press, correram a Londres ver o que era possível salvar da casa de Tavistock Square e também da então morada londrina, em Mecklenburgh Square. Num dos trechos do seu diário em 1940, ela relata: "Só vi um pedaço da parede do meu escritório em pé: fora isso, nada além de entulho onde escrevi tantos livros. Céu aberto no lugar onde tantas noites nos sentamos, demos tantas festas", escreve sobre a casa na Tavistock Square.

Além das lembranças, o endereço onde a escritora morou e escreveu parte de sua obra guardava praticamente um tesouro literário: seus diários. Eles foram reunidos em 33 cadernos escritos ao longo de 44 anos de vida, a partir da adolescência, em 1897, até quatro dias antes de sua morte. "Comecei a caçar os diários. O que daria para resgatar naquele carro tão pequeno? Darwin, o faqueiro de prata e algumas louças e porcelanas", escreveu a escritora em 20 de outubro de 1940, sobre o que conseguira reaver em meio aos escombros. Cinco meses após o bombardeio, em 28 de março de 1941, Virginia colocou pedras no bolso do casaco e entrou no rio Ouse.

A morte da romancista, ensaísta e editora inglesa é a primeira cena do monólogo "Virginia", escrito e encenado pela atriz Claudia Abreu, que percorre o País e estará em Fortaleza, neste sábad0, 27, e domingo, 28. O texto do monólogo, construído a partir da obra ficcional, diários e biografias da escritora inglesa rendeu também o livro, "Virginia, um inventário íntimo", publicado pela atriz.

A escritora inglesa já era famosa quando morreu, aos 59 anos. Seus romances "Mrs. Dalloway", "Orlando", "Ao Farol" e "As Ondas", que exploram fluxos de consciência até um limite desconhecido pela literatura surpreenderam a crítica, remoçaram o modernismo inglês e, desde então, cativam leitores. Virginia, porém, não escreveu apenas ficção.

Fachada da Hogarth Press House, editora do casal Woolf, em Londres(Foto: Wikipedia)
Foto: Wikipedia Fachada da Hogarth Press House, editora do casal Woolf, em Londres

É autora de ensaios e inúmeras resenhas literárias sobre muitos escritores, incluindo alguns autores publicados pela editora Hogarts Press, que tinha no seu catálogo o poeta T. S. Eliot, e os jovens E. M. Forster e Katherine Mansfield. A editora do casal Woolf foi uma das primeiras casas a publicar, na Inglaterra, as obras de Freud. Entre as coletâneas de ensaios, um dos mais famosos é "O leitor comum", que contém resenhas e uma teoria particular de Virginia sobre a leitura.

Ao mergulhar no rio Ouse deixando para trás a doença que a atormentava e uma obra vasta e intensa, muitos olhares se voltaram para seus diários, que passaram a ser fonte de curiosidade e também de muita expectativa sobre possíveis vestígios a respeito dos últimos dias de vida da escritora. No entanto, nada disso se encontra nos diários, como observa a tradutora dos textos pessoais da escritora inglesa e pesquisadora da obra de Virginia Woolf, Ana Carolina Mesquita, que assina a apresentação da obra Diários III, que estão sendo traduzidos e lançados na íntegra pela primeira vez no Brasil, pela editora Nós.

A primeira versão dos diários de Virginia foi publicada pelo marido, Leonard Woolf, mais de dez anos após a morte da esposa, em 1953. Na edição, o próprio Leonard fez cortes nos escritos pessoais da mulher, "desidratando-os", como afirmam alguns críticos e biógrafos da autora. Virginia escreveu num caderno em 20 de março de 1926: "E o que será de todos estes diários?, perguntei a mim mesma ontem. Se eu morrer, o que o Leo vai fazer deles? Ele não estaria inclinado a queimá-los, ele não os publicaria. Bom, ele deveria transformá-los em um livro, penso eu (...). Ouso dizer que eles dão um livrinho, se os rabiscos e rascunhos fossem um pouco ajeitados".

Virginia Woolf(Foto: Divulgação)
Foto: Divulgação Virginia Woolf

O recorte dos diários de Virginia Woolf entre 1924 e 1930 - de que trata este texto - é considerado um período muito importante para a vida da escritora. Seus livros mais famosos surgiram entre os anos de 1925 e 1930 e os diários são testemunhas disso. Aliás, segundo a tradutora Ana Carolina Mesquita, Virginia se dá conta que os diários são um exercício de escrita e de experimentos para ela. "Acaba de me ocorrer que neste livro eu pratico a escrita; treino minhas escalas; sim, me dedico a criar certos efeitos", afirma enquanto escreve "Mrs. Dalloway", e observa: "Escrever o diário ajudou enormemente o meu estilo, soltou a amarras", admite, em 1º de novembro de 1924. Os diários mostram uma Virginia atenta aos  eventos sociais, repara nas pessoas do meio literário, relata assuntos que vêm à tona nas rodas de chá, reclama do calor londrino, e acompanha as agitações políticas como as greves.

Ao longo de mais de quase um século, a obra de Woolf tem ampliado o interesse de leitores e pesquisadores. A ficção da autora tem sido estudada num viés psicológico, além da crítico-literária, e vista no cinema e no teatro. Mais recentemente, biografias da escritora têm discutido aspectos da doença mental que lhe causou tanto sofrimento. Alguns experimentos e análises realizados a partir dos seus diários e cartas atestam que Virginia sofria de transtorno bipolar e depressivo. Um dos seus biógrafos, Stephen Trombley, relata os conflitos que a autora mantinha com seus médicos e sugere que ela foi vítima da ignorância sobre as doenças mentais e psiquiátricas. Ser mulher, ele acrescenta, ampliou as desvantagens de Virgínia diante da Medicina e dos médicos.

Virgínia

  • Quando: sábado, 27, às 19 horas; domingo, 28, às 18h e 20 horas
  • Onde: Cineteatro São Luiz (rua Major Facundo, 500 - Centro)
  • Quanto: R$100 (Plateia Inferior) e R$80 (Plateia Superior). Preços de inteira
  • Classificação Indicativa: 14 anos
  • Duração: 60 minutos 

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