"Penso que vemos e interpretamos o mundo através do filtro de um vidro embaçado. Ao desenharmos, passamos o dedo neste vidro e, através de linhas e formas, ressignificamos esteticamente a nossa relação com o mundo. Desenhando, podemos entender melhor o que vemos e somos capazes de mudar o nosso olhar sobre a vida". É assim que o desenhista Daniel Brandão começa a falar sobre seu ofício. Inspirado em suas maiores paixões e colocando no papel modelos vivos, o artista lança neste sábado, 24, sua obra intitulada "Desenho Vivo: Um Artbook de Daniel Brandão".
Formado em Comunicação Social pela Universidade Federal do Ceará e já tendo cursado a Oficina de Quadrinhos da UFC, assim como a Joe Kubert School of Cartooning and Graphic Arts, em Nova Jersey, Estados Unidos, Daniel atua desde 1996 como produtor de histórias em quadrinhos, ilustrador, arte-educador e empresário. Quadrinista do Vida&Arte desde 2018, ele destaca momentos da produção de seu livro e o que o público pode esperar.
"O livro 'Desenho Vivo' é o meu artbook mais pessoal. Trabalho em sua produção desde o ano passado. Foram muitos meses de trabalho. O livro reúne meus melhores desenhos produzidos em práticas com modelos vivos e aulas de gestual e movimento dos últimos 15 anos. Foi uma seleção muito difícil de fazer. A nossa modelo Carol Benjamim domina a maior parte do livro, isso é justificável. Mas tive a sorte e o privilégio de poder desenhar muitas pessoas especiais - minha esposa, inclusive. É um livro muito interessante para quem gosta de arte, de desenho e do corpo humano. Não é restrito a quem pratica ou estuda desenho", revela.
O artista conta que no início dos trabalhos, seu traço era "duro" e as poses que desenhava não tinham muita naturalidade. "Eu enganava os olhos dos leitores com outras técnicas, mas quem tinha experiência com desenho sempre me apontava essa falha", conta. Foi em 2000 que ele concretizou o sonho de estudar fora do País e lá aprendeu sobre as técnicas de expressão gestual e prática com modelo vivo. "Isso mudou meu desenho profundamente", afirma.
Ao voltar para o Brasil, Daniel abriu seu próprio estúdio em 2002, que leva seu nome. Assim, ele passou a ensinar as técnicas para alunos e colegas e aperfeiçoar seus próprios desenhos. Ele destaca que levou muito tempo para encontrar Carol Benjamim, modelo que tem destaque em seu lançamento. Os dois fortaleceram os trabalhos durante a pandemia, o que os ajudou a enfrentar o período e a entenderem como poderiam inovar na arte do desenho. "Há mais de 20 anos, aprendi que arte é troca", pontua.
Com as atuais conquistas, Daniel relembra o início de sua paixão. Já na infância, o artista gostava de acompanhar a avó em suas aulas de pintura e copiar os desenhos da Turma da Mônica e dos Trapalhões. O fortalezense revela ainda que sua primeira opção de curso na faculdade, na verdade, foi Direito.
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"Desenhar para mim era puro prazer. Ou mais que isso... Desenhar para mim era um refúgio. Passei anos desenhando sem pensar nisso como profissão. Tanto é que o primeiro vestibular que passei foi para Direito. Mas a minha experiência com o curso foi muito triste, e a minha namorada da época, minha esposa até hoje, viu uma matéria na televisão sobre a Oficina de Quadrinhos da UFC - um projeto de extensão do curso de Comunicação Social. Participei de uma seleção em 1995 e passei. Foi lá que despertei para o que eu realmente queria fazer da vida", conta.
Questionado sobre o equilíbrio de suas atividades no dia dia, o desenhista comenta que, desde cedo, teve sabedoria de diversificar e ser eclético para conseguir sustentar seu sonho. Foi com a montagem do estúdio que ele conseguiu desenvolver seu lado administrador e empresário. Para conseguir juntar mais dinheiro, Daniel passou a buscar diferentes trabalhos, tendo se identificado mais com ilustração. Nesta mesma época, em 1998, ele junto de Geraldo Borges, seu sócio, criaram um curso de desenho e quadrinhos.
"Até 2007, eu me considerava um quadrinista e um ilustrador que também dava aulas sobre esses assuntos. Nesta época, resolvi fazer uma pós em arte-educação e a chave na minha cabeça virou. Desde então, me considero um arte-educador e me vejo como um professor que também trabalha com quadrinhos e ilustração. A prioridade se inverteu. Eu amo dar aula", afirma.
Mesmo com atividades distintas, o artista se vê conectado com cada uma, e destaca que levou tempo para entender que não era possível fazer tudo sozinho. Daniel coordena, atualmente, o estúdio junto de Juliana Bezerra, Blenda Furtado e Luís Carlos.
"Descobri que se conhece melhor o que existe depois que tentamos desenhar aquilo que vemos ou sentimos. As linhas criam uma ligação íntima entre o desenhista e o mundo. Passei a preferir desenhar pessoas reais. Não personagens imaginários, idealizados. Incluí o desenho de observação na minha rotina e quando faço um desenho de observação de alguém, chego a imaginar o que ela está pensando ou sentindo", comenta sobre seus traços.
Como forma de continuar produzindo arte, ele já adiantou ao Vida&Arte que está com um novo livro para lançar. Desta vez, uma história em quadrinhos, chamada "Um dia", escrita por Luís Carlos Sousa, desenhada por Daniel e colorida por Miguel Felício. Com previsão de lançamento para julho, o livro nasceu a partir de tirinhas publicadas no Vida&Arte.
"Estou muito feliz em poder lançar no mesmo ano trabalhos tão distintos. Quanto a inovar no ramo - seja a área de quadrinhos ou a área do desenho - nunca tive essa pretensão. Tudo que eu quero é continuar produzindo com prazer, curtindo o caminho, aprendendo sempre e tentando alcançar um público amplo, fora dos limites de qualquer nicho. Quero ser simples, direto e ter sensibilidade para tocar o coração de alguém com minha arte", finaliza.
Lançamento "Desenho Vivo: Um Artbook de Daniel Brandão"
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