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A bossa nova se despede de Leny Andrade e Doris Monteiro
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A bossa nova se despede de Leny Andrade e Doris Monteiro

Cantora Leny Andrade, uma das referências da música brasileira mundo afora, morre aos 80 anos no Rio de Janeiro
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Diva do jazz, cantora Leny Andrade morre aos 80 anos (Foto: Nana Moraes / Divulgação)
Foto: Nana Moraes / Divulgação Diva do jazz, cantora Leny Andrade morre aos 80 anos

A cantora Leny Andrade morreu, aos 80 anos, nesta segunda-feira, 24, no Rio de Janeiro. A artista carioca estava internada no Hospital de Clínicas de Jacarepaguá, na Zona Oeste. Ao longo de mais de seis décadas de carreira, Leny se consolidou como uma das referências do jazz brasileiro. Desde 2018, a artista morava no Retiro dos Artistas, espaço que acolhe profissionais da cultura no Rio.

"Estou indo encontrar João Donato e Tony Bennett. Música do céu. Minha voz estará sempre com vocês", postou a equipe da artista no perfil do Instagram. "A diva do jazz brasileiro foi improvisar no palco eterno. Leny faleceu nesta manhã, cercada de muito amor", completou a nota.

Ministra da Cultura, Margareth Menezes homenageou a carioca. "Dona Leny Andrade, que vá em paz. Seu legado é eterno. Obrigada por tantas contribuições", se despediu.

A cantora Gabby Moura lamentou a morte de artistas nas redes sociais. "Não pode ser verdade isso. Nossa eterna rainha do jazz, da bossa nova, do improviso. Que falta você fará, Leny", publicou a cantora de samba e pagode.

"O Brasil acaba de perder Leny Andrade. Ele já levou a música brasileira a 48 países. É consagrada internacionalmente. Ela era tão, mas tão poderosa que costumava ter Tony Bennett na plateia de alguns dos muitos shows que fez em templos do jazz de Nova York. Brilhou, alcançou lugares incríveis. Foi ouvida, tocada e muito reproduzida", homenageou Zezé Motta, lembrando os feitos da cantora mundo afora.

"Estamos cada dia mais só. Que tristeza perder duas amigas em um mesmo dia. Que a querida Leny Andrade encontre luz e paz em sua nova morada. Descanse em paz", escreveu a cantora Alaíde Costa lamentando também a morte de Dóris Monteiro.

Ainda criança, Leny de Andrade Lima iniciou os estudos no Conservatório de Música e já passou a se apresentar no Clube do Guri, da Rádio Tupi. Nas adolescência, passou a cantar no Beco das Garrafas, em Copacabana. Em 1961, ela lançou seu primeiro LP, "A sensação".

A partir dos anos 1980, a intérprete passou a circular internacionalmente. Durante as turnês pelos Estados Unidos, a brasileira acabou se aproximando de nomes como Liza Minnelli e Tony Bennett.

Ao longo da carreira, fez parceria e homenageou grandes artistas nacionais em álbuns como "Cartola 80 anos" (1988), "Antonio Carlos Jobim, letra e música" (1995) e "Luz negra - Nelson Cavaquinho por Leny Andrade" (1995).

Teve vários hits nas paradas brasileiras, e em 2007 dividiu um Grammy Latino com César Camargo Mariano para Melhor Álbum MPB ao Vivo.

Em 2018, comemorou 60 anos de carreira com apresentações pelo projeto Clube do Choro Convida, acompanhada pelo violonista Luiz Meira. Cantou músicas que se tornaram marcantes em sua trajetória, como "Estamos aí" (Durval Ferreira/ Maurício Einhorn), "Rio" (Roberto Menescal/ Ronaldo Bôscoli), "Céu e Mar" (Johnny Alf), "Influência do Jazz" (Carlos Lyra), "Contigo Aprendi" (Armando Manzanero), além do pout-pourri de Tom Jobim, com "Este seu Olhar", "Triste", "Vivo Sonhando", "Você vai ver" e "Garota de Ipanema".

Em agosto de 2022, gravou, com o pianista Gilson Peranzzetta, a música "Por Causa de Você" (Tom Jobim e Dolores Duran), lançada como single pela Mills Records em janeiro de 2023 em comemoração aos seus 80 anos.

Dóris Monteiro faleceu aos 88 anos
Dóris Monteiro faleceu aos 88 anos

Cantora Doris Monteiro morre aos 88 anos

A cantora e atriz carioca Doris Monteiro morreu na madrugada desta segunda-feira, 24. Ela tinha 88 anos e, segundo publicação em seu perfil oficial no Instagram, o falecimento ocorreu por causas naturais. 

Doris nasceu no Rio de Janeiro em 21 de outubro de 1934, e estreou como cantora na Rádio Nacional, em 1947, no programa Papel Carbono, de Renato Murce, segundo o Dicionário Cravo Albin.

A carioca iniciou sua carreira profissional na música em 1951, quando tinha apenas 17 anos. Na época, trabalhou como cantora da Rádio Tupi e permaneceu por oito anos na emissora. Seu primeiro álbum foi gravado naquele mesmo ano. Ela foi a voz de sucessos como "Se Você Se Importasse", "Dó-Ré-Mi" e "Fecho Meus Olhos… Vejo Você".

Dois anos depois, em 1953, começou sua carreira no cinema com a estreia em "Agulha no Palheiro". E foi eleita a melhor atriz do ano devido a sua interpretação. Doris Monteiro foi marcante para a consolidação da bossa nova no Brasil e, ao longo de mais de 70 anos de carreira, interpretou músicas de nomes como Tom Jobim, Noel Rosa e Fernando César.

Além da extensa carreira na música, a ela também estrelou o programa Encontro com Doris Monteiro!, na TV Tupi do Rio de Janeiro, e participou dos filmes "Carnaval em Caxias" (1954), "De Vento em Popa" (1957) e "Copacabana Palace" (1962).

Dona de uma voz sussurrada, intimista, Adelina Doris Monteiro estreou na época do samba-canção e antecipou a bossa nova, além de ter gravado discos antológicos numa fase dedicada ao sambalanço. Nessa época, se aproximou de compositores como Marcos Valle, Jorge Ben, Antonio Carlos e Jocafi.

Seu disco mais recente foi dedicado a esse repertório. "As Divas do Sambalanço", lançado em 2020, foi dividido com as cantoras Eliana Pittman e Claudette Soares. O repertório inclui "Diz que fui por aí" (Zé Keti), "Mancada" (Gilberto Gil) e "Mas que nada" (Jorge Ben) (Miguel Araujo)

A bossa em duas versões

Por Marcos Sampaio, jornalista e crítico de música

Curioso uma mesma manhã levar embora Doris Monteiro e Leny Andrade. Ambas tiveram seus nomes ligados à bosa nova, mas trilharam estradas opostas. Opostas, mas não competitivas. Doris começou sua história musical ainda adolescente, quando o samba-canção era o ritmo do momento. Dona de um canto curtinho, elegante, ela em nada se aproximava da opulencia de Dalva de Oliveira ou Angela Maria.

Com esse estilo econômico, ela acabou, sem querer, adiantando a estética cool da bossa nova de João Gilberto. O contrário do que fez Leny Andrade, que pegou as lições do "bruxo de Juazeiro" e temperou com a liberdade e os improvisos do jazz. Como Sarah Vaughan ou Ella Fitzgerald, Leny não era nada econômica, mas sabia como poucos dar elegância à sua interpretação.

Se as vozes e a bossa eram tão diferentes, Doris e Leny se assemelhavam na vontade desbravar a música além de qualquer estilo. Doris gravou parcerias antológicas com Dick Farney e Miltinho, além de lançar nos anos 1970 uma sequencia de discos que lhe garantiram o título de "diva do sambalanço". São álbuns em que ela canta canções de Sergio Sampaio, Sidnei Miller, Carlos Dafé e outros nomes que percorrem as entrelinhas da MPB.

Já Leny, com uma discografia mais extensa, já gravou de Stevie Wonder a Raimundo Fagner, e deixou albuns inteiros dedicados a compositores como Ivan Lins, Roberto Carlos, Nelson Cavaquinho e Cartola. Aliás, foi com a obra desses dois últimos que ela se apresentou pela última vez em Fortaleza, em 2019. Na ocasião, perguntei como era seguir cantando e gravando aos então 76 anos. "Não pode parar não se não dá mofo. Principalmente num país tão ser vergonha como é esse meu", respondeu. E sobre Fagner, ela brincou: "o Fagner é aquela porralouquice. Eu sou apaixonada por ele. Eu canto tudo dele, só não tremo. Acho que tem que fazer um curso só pra tremer".

Leia no O POVO + | Confira mais histórias e opiniões sobre música na coluna Discografia, com Marcos Sampaio

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