Voz da trilha sonora das novelas "Babilônia", 2015, e "Geração Brasil", 2014, e, para muitos, um dos primeiros representantes LGBTQIA do pop brasileiro, Johnny Hooker celebra 20 anos de carreira neste mês de agosto. Desde pequeno, já pensando no caminho que poderia trilhar com seu talento, John Donovan Maia resolveu oficializar o nome Johnny Hooker para soar como novidade no gênero punk nacional. Ele, que em 2015 foi vencedor do Prêmio da Música Brasileira como Melhor Cantor na categoria Canção Popular, lançou no início deste mês o single "Me Leve", um trabalho que resgata suas raízes.
"Essa música a gente já tocava em alguns shows e as pessoas sempre perguntavam quando ia lançar. Mas ela nunca se encaixava tematicamente nos meus três discos. Agora, fazendo 20 anos de carreira e tendo passado por tantos horrores nos últimos anos, eu fiquei nostálgico. Queria olhar pra trás e agradecer por todas as conquistas e momentos de glória, fazendo música e arte. Antes de fazer algo completamente novo, eu precisava bater esse parabéns e lançá-la como um agradecimento aos fãs", diz Hooker em entrevista exclusiva ao Vida&Arte.
Tendo como principais referências David Bowie, Madonna e Cássia Eller, Johnny ganhou a atenção das pessoas com uma voz potente, clipes performáticos, a maquiagem com o puxadinho nos olhos, e principalmente, com as letras intensas de suas músicas. "Alma Sebosa", "Amor Marginal" e "Eu Vou Fazer uma Macumba pra Te Amarrar, Maldito!" são algumas de suas obras que trazem composições sobre desilusões amorosas.
"Depois que minha carreira aconteceu nacionalmente que eu fui perceber a falta dessa representatividade maior. Os meus fãs agradeciam por eu estar ali. E aí percebi minha responsabilidade, de ser o artista que eu não tive, de preencher uma lacuna para muitas pessoas que não estavam se vendo ali", revela.
Atualmente, com três EPs lançados, e mais três álbuns de estúdio, tendo sido o último, "Orgia", lançado em 2022, Johnny conversa com o Vida&Arte sobre as dificuldades de entrar no mercado da música, os desafios psicológicos que enfrentou, a quase pausa definitiva de sua carreira, assim como os momentos mais marcantes dela. Confira trechos da entrevista:
O POVO: Uma das canções que mais fez sucesso em sua carreira foi "Amor Marginal", lançada em 2012. Quais sentimentos e histórias estão por trás dessa canção?
Johnny Hooker: É uma música que eu escrevi no comecinho da carreira. Ela é inspirada em uma história de amor que eu vivi com um dos meus melhores amigos na época, André Soares. Ele tocou baixo comigo de 2003 a 2016 e, infelizmente, durante a pandemia em 2021, por conta da demora das vacinas, ele pegou Covid e veio a falecer com apenas 35 anos. A história é essa, desse encontro com ele e dessa paixão que a gente viveu, romântica e amigável, até infelizmente a morte dele.
O POVO: Sendo um artista LGBTQIA+, como foi entrar no mercado da música em anos que essa representatividade não era abordada?
Johnny Hooker: O mercado da música é um pouco selvagem. Ainda é quase que completamente dominado por homens héteros. E o Brasil que a gente viu nos últimos anos é um país extremamente machista. Acho que isso se reflete em todas as indústrias e na música não é diferente. Já tive muitas portas fechadas por perceber que não queriam me reconhecer justamente por conta dessa barreira. Que tinha que virar macho para estar no mesmo lugar deles. É uma luta constante que enfrentei no início e vou enfrentar sempre. Já sofri muito ataque de pessoas religiosas também, campanhas que fizeram pra eu não acessar determinados lugares. Você tem que entrar pelas frestinhas. A gente tem que se provar toda vez por 1000. Não basta ser talentoso, tem que emocionar em lágrimas para que seja indiscutível o nosso talento.
O POVO: Em 2022 após o lançamento da sua música "Cuba" não ir bem, você fez um desabafo nas redes sociais no qual afirmou que é necessário saber a hora de se retirar. Como você avalia hoje esse momento em sua carreira?
Johnny Hooker: É engraçado porque agora que passou, eu consigo perceber com clareza que o que eu estava enfrentando era um Burnout. A pressão era muito grande, a possibilidade daquele governo continuar, o horizonte cada vez mais escuro. Tínhamos perdido nossos lugares nos palcos por causa da pandemia, também tinha acabado de perder um dos meus melhores amigos. Era uma sobrecarga mental. E, saindo disso e vindo pro agora, não poderia ser mais diferente. Nesse momento de sobrecarga, eu pensei em entrar no avião e sumir, misturado com ansiedade e depressão, com luto, falta de perspectiva. Mas eu me sinto feliz de ter superado isso e de estar em outro momento, olhando para uma possibilidade de reconstrução, minha e do País, menos intolerante e odioso. Que bom que passou.
O POVO: Desde muito cedo você mencionava os desafios que vivenciava com a sua depressão. Como superou isso?
Johnny Hooker: É uma questão que sempre atravessou a minha vida. Sempre tentei falar sobre isso muito abertamente. Em algumas entrevistas antigas, eu olho pra trás e acho até que fui muito duro. Mas é de uma maneira de fazer as pessoas procurarem ajuda, porque muita gente enfrenta isso sozinho achando que tem que segurar todo o peso só. Sempre me conscientizei de usar a minha voz pra falar o contrário pras pessoas. Eu também achava que tinha que segurar sozinho, achava saúde mental frescura. Não é e precisamos procurar ajuda. Agora, estou num momento muito bom, cuidando da minha carreira, tentando ir de passinho em passinho. É complicado porque você trabalha com a percepção das pessoas, e continua tendo muitos ataques, você tem que ir abstraindo a parte ruim e focando no futuro, na arte.
O POVO: Você cativou muitos fãs pela forte energia sexual em suas músicas. Eram sempre histórias pessoais?
Johnny Hooker: Acho que as minhas músicas têm muitas experiências pessoais, mas muita ficção também. Muita construção de imagens, justamente pela influência do cinema na minha vida. Têm algumas músicas que foram mais sofridas e que têm fundos mais pessoais, como "Escolher a Pessoa Errada Para Humilhar" e "Segunda Chance". Já "Volta" e "Flutua" são histórias inventadas. No fim, tudo tem uma experiência pessoal.
O POVO: Como está seu coração atualmente? Olhando para trás, quais momentos mais te marcaram profissionalmente?
Johnny Hooker: Eu estou em um relacionamento muito bom. Caíque começou trabalhando comigo, era meu bailarino, e a convivência foi levando a gente junto. Tenho um apego emocional com a minha equipe também, que está comigo há 10 anos. Minha família e meus fãs que nunca desistiram de mim. Quanto aos momentos, são muitos. Parada LBGT Lisboa em 2018, o Rock in Rio 2017, que dediquei a minha avó, o Rock in Rio Lisboa 2022, que dediquei a minha mãe. Quando ganhei o clipe do ano com "Flutua". São muitos momentos e vem muito por aí também. Muitos feats legais estão por vir.
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