O Prêmio Especial do Júri conquistado pela atriz cearense Ana Luiza Rios no Festival de Gramado de 2023, há pouco mais de duas semanas, pode ser encarado como consequência natural da trajetória que a artista — que iniciou carreira e segue até hoje no teatro — vem construindo no audiovisual. Entre reconhecimentos, projetos pelo Brasil e experiências como roteirista e diretora, a atriz fala ao Vida&Arte sobre a relação com a linguagem.
Bem antes do troféu recebido pelo trabalho no longa "Mais Pesado é o Céu", de Petrus Cariry, o caminho artístico da atriz começou há quase duas décadas. "Nesse ano, faz 19 anos que faço teatro, então tem um tempo de trabalho que vem se desenvolvendo, minha formação vem dele. Ainda na faculdade, fui conhecendo também o pessoal do cinema, onde comecei alguns anos depois", contextualiza Ana, formada em Artes Cênicas pelo Instituto Federal do Ceará.
A estreia no cinema veio em 2010, no curta "Princesa", de Rafaela Diógenes, pelo qual venceu como Melhor Atriz no Festival Primeiro Plano (Juiz de Fora/MG). Os 13 anos que separam a primeira da mais recente premiação foram preenchidos, na linguagem, por experiências em curtas, longas e séries, sempre em paralelo com o trabalho no grupo Teatro Máquina.
Leia também | Confira matérias e críticas sobre audiovisual na coluna Cinema&Séries, com João Gabriel Tréz
"Não deixei de fazer teatro, faço e amo até hoje, mas fui me envolvendo com a linguagem do cinema. Gosto muito de fazer os dois e fui me identificando muito com o que o cinema pede de nós, atrizes e atores", avalia.
Ressaltando a importância de realizadores que vieram antes, como Rosemberg Cariry, Ana Luiza reconhece o estabelecimento de uma geração do cinema cearense a partir dos anos 2010, na qual testemunhou o estabelecimento de formação, mercado e reconhecimento nacional das produções cearenses.
"Me sinto fazendo parte dessa geração, um movimento que foi se ressignificando e renovando, que não é uma coisa só. A diversidade do que a gente tem produzido aqui é o mais legal. A gente tem olhares, formas de fazer e discursos diferentes — das boas produções de comédia ao drama — e isso faz com que o cinema cresça", avalia.
"Mais Pesado é Céu", pelo qual Ana Luiza foi premiada, é um drama "forte" e "tenso", como descreve. Na obra, ela vive Teresa, mulher que acolhe uma criança abandonada e se conecta a Antônio (Matheus Nachtergaele) em meio a uma jornada por estradas. A justificativa do júri para o prêmio cita a "inteireza e força" da atuação da cearense.
"Desde que eu vi a lista de atrizes concorrendo, foi um pouco impactante, porque eu era, ali, a 'atriz desconhecida'. Fiquei muito feliz por estar concorrendo com elas — como a Vera Holtz, maravilhosa, que ganhou o prêmio de atuação — e por essa curadoria de longas com personagens femininas bem importantes. O Prêmio Especial do Júri foi exatamente isso, especial", brinca.
A partir da distinção em Gramado e de ser lembrada de uma fala concedida ao V&A em 2019, Ana Luiza é convidada a refletir sobre experiências da carreira. Há quatro anos, com o curta "Marco", de Sara Benvenuto, no Festival de Brasília, ela afirmou: "Sempre achei que eu ia flertar com o cinema, mas permaneceria mais no teatro".
"A sensação de 'flertar' com o cinema veio porque, como entrei muito cedo no Máquina, me sentia muito pertencente ao teatro e talvez estivesse ainda entendendo o que é o cinema, mas a sensação de que gostei da linguagem e me identifiquei com o tipo de atuação foi desde o começo", elabora.
O audiovisual foi, também, importante durante a pandemia, quando o teatro ficou acentuadamente enfraquecido pela natureza presencial em essência. "Fui me mantendo trabalhando com as produções audiovisuais, com todo o cuidado que a gente teve que ter", destaca.
"São duas coisas em paralelo: eu entendendo o quanto me identifico, gosto, aprendo e quero aprender mais com a linguagem do cinema como atriz e o quanto essa linguagem tem sido generosa comigo no sentido de eu estar podendo trabalhar. Essas duas coisas se fortalecem mutuamente. Não é mais um flerte, já tem um compromisso sério", sustenta.
Passos futuros
Após o prêmio em Gramado, Ana Luiza Rios viajará com "Mais Pesado é o Céu" pelo circuito de festivais neste segundo semestre de 2023. A previsão de estreia comercial é para fevereiro de 2024. Além do longa, a atriz também será vista em breve nos curtas "Circuito", de Alan Sousa e Leão Neto, obra cearense que estreia no Festival de Vitória, e "Cáustico", de Wesley Gondim, gravado em Brasília. A estreia da série de comédia "Se Avexe Não" também está no horizonte para a artista.
Atrás das câmeras, Ana Luiza também tem projetos. Após estrear na direção audiovisual com a videoperformance "Tríptica Francisca Jane Nazareth" — parceria com Aline Silva e Marta Aurélia que ficou exposta na Mostra Ocupa MIS até agosto —, a artista trabalhará no roteiro de "O último corte".
O projeto de longa foi escrito com Giovanna Campos no Laboratório de Cinema do Porto Iracema das Artes. "Meu interesse por roteiro tem esse lado do meu interesse por narrativa, foi acontecendo porque fui tendo a sorte de trabalhar com uma galera aberta para o ator também interferir no roteiro", compreende. "Tenho dialogado com outros projetos nesse lugar de roteirista. Ainda me sinto muito aprendiz, mas gosto, me interessa. Meu trabalho como atriz me ajuda a pensar como roteirista, e vice-versa", atesta.
Todo mundo tem uma história de medo para contar e o sobrenatural é parte da vida de cada um ou das famílias. Alguns convivem com o assombro das manifestações ou rezam para se libertar das experiências inesperadas. Saiba mais sobre “Memórias do Medo” clicando aqui