“Muitos sobreviventes não conseguem reviver os fatos. É uma responsabilidade nossa, dessa geração, de levar a história pra frente. De não deixar cair no esquecimento esse passado sombrio da humanidade.” Marcus Strozberg, curador da exposição “Do Holocausto à Libertação”, conversa com o Vida&Arte sobre a necessidade de ter um olhar atento ao que veio antes de nós. Com 160 fotografias e documentos históricos que remontam à 2ª Guerra Mundial, a Sociedade Israelita do Ceará se une ao Ministério Público do Estado para apresentar a mostra no Espaço Cultural MPCE.
Com o intuito de abordar uma página sombria dos eventos da humanidade, a exposição relembra o período do Holocausto, genocídio que vitimou sistematicamente milhões de pessoas, dentre elas judeus, ciganos, homossexuais, negros, comunistas, testemunhas de Jeová, e pessoas com deficiência, no período de 1933 a 1945.
Em entrevista, Marcus Strozberg conta que a coleção de imagens foi doada à Sociedade Israelita por Ben Abraham, sobrevivente dos campos de concentração durante a ocupação alemã sobre seu país. Depois de ficar confinado no Gueto de Lodz, onde perdeu o pai, e passar por Auschwitz, onde perdeu a mãe, Abraham foi enviado para os campos de Brauschweig, Watenstadt e Ravensbrück. Na noite de 1º para 2 de maio de 1945 foi libertado. O historiador polônes faleceu em São Paulo, dois meses antes de completar 91 anos.
“Ele foi presidente da Sherit Hapleitá, uma sociedade de sobreviventes do Holocausto. Abraham doou a exposição, e nos comprometemos em guardar esse material e colocá-lo à disposição, com a finalidade de um ensino eterno", relembra Marcus.
Quanto à captação das imagens, o curador da mostra observa que todas foram registradas por nazistas. “Você percebe que em todas as fotografias, os alemães estão relaxados, sorrindo, enquanto a população civil oprimida tem toda a face do medo, da insegurança. Eles nunca imaginaram que perderiam a guerra, que esse material fosse cair nas mãos dos Aliados”, comenta.
Durante a pandemia, a Sociedade Israelita, junto da Secretaria da Educação, realizou diversos webinários, para alunos e professores, com a finalidade de instigar o conhecimento, já pensando em colocar em campo a exposição para visitação pública. Marcus observa que o apoio do Ministério Público do Ceará à mostra reforça o papel relevante dos direitos civis.
“O que aconteceu na Alemanha, começou muito antes da ascensão de Hitler ao poder. A ideia surgiu junto do ideário nazista, já pregado anos antes, acomentendo em um Estado em que parte da população perde seus direitos civis e deixa de ser protegida. Com o papel relevante que o Ministério tem de garantir esses direitos atualmente, se faz necessário trazer esse discurso para os dias atuais, para frisar que hoje temos a garantia de segurança”, explica.
Entretanto, o curador demonstra a urgência da observação sobre os tempos atuais. Segundo ele, “Do Holocausto à Libertação” chega em um momento que merece cuidado e reflexão. “O mundo de hoje não é tão diferente assim. Precisamos que olhem pra isso e entendam sua posição como ser humano, não se calando frente às situações que o mundo nos coloca muitas vezes. O silêncio pode levar à ressurreição de pessoas com o mesmo ideário. E não queremos que essa realidade volte a acontecer, não só com os judeus, mas com nenhum outro povo na face da terra”.
Marcus reforça que a mostra tem o caráter educacional e memorial, indicada para maiores de 14 anos. Ele espera uma reflexão profunda e madura sobre o que cada um será capaz de vivenciar na visão da coleção de fotos. “Que possamos olhar para o mundo hoje e sermos capaz de visualizar tantos exemplos de intolerância com populações que, naquela época, foram perseguidas e agora também, como negros, homosexuais, judeus e ciganos.”
Questionado sobre os sentimentos de estar na curadoria, Marcus revela que não houve como não se envolver emocionalmente. “Essa história é diretamente dos meus antepassados mais próximos. Estou falando de avós, bisavós, e de todas as famílias de judeus que migraram para o Brasil e encontraram aqui uma terra pacífica, amistosa, e receptiva, podendo criar novas gerações”, finaliza.
A exposição é como um lembrete impactante da importância de preservar a memória histórica e evitar que tragédias semelhantes se repitam. Ela instiga os visitantes a ponderar sobre os perigos dos regimes totalitários, como o nazismo e reforça a necessidade contínua de fomentar a tolerância e a paz.
Aberta ao público desta terça-feira, 5, até o dia 30 de outubro, “Do Holocausto à Libertação” tem foco nos estudantes do Ensino Médio das escolas do Ceará. Grupos escolares devem agendar visitas guiadas.
Do Holocausto à Libertação
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