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Autor gaúcho Tobias Carvalho debate o desejo e a não-monogamia no livro Quarto Aberto
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Autor gaúcho Tobias Carvalho debate o desejo e a não-monogamia no livro Quarto Aberto

"Quarto Aberto", romance de estreia de Tobias Carvalho, aborda vivências e debates como não-monogamia, redes sociais e dissidências de gênero e sexualidade
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'Quarto Aberto' saiu pela Companhia das Letras (Foto: Marco Antonio Filho / divulgação)
Foto: Marco Antonio Filho / divulgação 'Quarto Aberto' saiu pela Companhia das Letras

Artur é um jovem porto-alegrense de 20 e poucos anos que trabalha numa livraria, faz bicos como drag queen, namora Caíque e, ocasionalmente, sai com outros rapazes que conhece por aplicativos. É ele que protagoniza "Quarto Aberto", estreia em romance do autor gaúcho Tobias Carvalho após dois premiados livros de contos — "As Coisas" e "Visão Noturna". Sem intenção de "resumir" uma geração, a obra do escritor traz, no tema e na forma, maneiras de ser e estar "jovem adulto" na contemporaneidade. Narrado em primeira pessoa com linguagem marcada por desafetações, o livro constrói um retrato específico que não se pretende paradigmático, mas que ecoa elementos da "confusão mental LGBT" em meio ao balanço entre a recusa e a busca por padrões de vida esperados e desejados. Tendo começado a escrever a partir de uma oficina de criação literária no fim da adolescência, Tobias fala ao Vida&Arte sobre o entendimento da própria voz autora, o trajeto da "confissão" à invenção e a ficção como "convite a pensar."

O POVO - Como escritor e também sob o ponto de vista de leitor, que possibilidades te atraem no formato do conto?

Tobias Carvalho - O conto se resolve rápido. É uma obsessão curta, que não exige uma dedicação quase doentia de quem escreve. O tema, a mensagem, a atmosfera, tudo dá pra ser trabalhado sucintamente. É bonito isso. Chega num lugar bem mais direto que o romance.

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OP- Há uma ideia corrente de que publicar um romance seria uma "evolução" após um livro de contos. Você reflete sobre esse entendimento na sua newsletter, onde explica que "Quarto Aberto" surgiu inicialmente a partir de uma série de contos conectados entre si. O quanto as escolhas por um ou outro formato são pensadas e o quanto acabam sendo fruto das circunstâncias?

Tobias - Eu vinha tentando escrever um romance fazia anos. Eu estava mais acostumado com os contos, porque na oficina eles eram o exercício principal. Depois de muito quebrar a cabeça pra escrever uma narrativa longa, a forma que encontrei foi escrever uma cena depois da outra. Primeiro achei que estava escrevendo um conto, depois fui adicionando personagens, criando um universo que precisava de várias páginas pra existir. "Quarto aberto" acabou sendo o resultado desse processo. Mas o tanto que eu tive que reescrever o livro, por não ter planejado nada de antemão, me ensinou que pensar na estrutura antes pode ser bastante útil. Inclusive pra fazer o romance crescer, pra todas as ideias estarem conectadas, pulsando juntas.

OP - "Quarto Aberto" é protagonizado por jovens de 20 e poucos anos e trata de temas que são mais conhecidos entre jovens adultos. Ainda assim, sua obra não traz elementos comuns à literatura do tipo "young adult" e saiu pelo selo principal da Companhia das Letras. O que separa, mas também aproxima, a sua obra das definidas como "YA"?

Tobias - Acho que falar em YA supõe um público-alvo que não era o que eu imaginei enquanto escrevia. Pra mim, apesar de "Quarto aberto" ter personagens jovens-adultos tentando e falhando em ser adultos e se relacionar, o texto é feito pra qualquer pessoa ler. Literatura adulta, creio eu.

OP- De que forma escrever sobre afeto e experiências do tipo é, também, uma forma de elaborar as próprias questões? Como o público leitor pode se relacionar com esse gesto?

Tobias - Quando eu comecei a escrever, havia bastante de confissão no que eu produzia. Eu tentava expressar umas angústias comuns a LGBTs entrando na fase adulta, ainda tentando processar a confusão mental que é ter sentimentos que até então pareciam inexistir na sociedade. Quando eu era pequeno eu me sentia muito solitário por não entender o que eu sentia. Eu achava que eu tinha algum defeito. E escrever me ajudou a desatar esses nós — talvez puxando pra uma relação mais direta com leitores LGBT, que viveram coisas parecidas. Mas acho que hoje em dia eu me afastei bastante dessa literatura mais derramada. Não escrevo mais sobre mim, mas tento chegar em lugares parecidos através de personagens inventados. Ainda que a confusão mental LGBT siga lá.

OP- Os traços de estilo em "Quarto Aberto" constroem uma maneira mais direta, desafetada, de escrita, com aberturas a momentos de reflexão e elaboração mais íntima. De onde isso parte? De que formas, por exemplo, isso espelha as vivências da geração retratada?

Tobias - O narrador é um cara que ainda não sabe elaborar os sentimentos direito. Ele vai direto ao ponto, narra com simplicidade, e aos poucos vai se abrindo à experiência e deixando os sentimentos virem. Não foi minha intenção falar nada que resumisse uma geração, mas talvez as relações hoje sejam também atravessadas pela internet e pelos tempos caóticos — muita informação, muitas opções, tudo em todo lugar ao mesmo tempo, nada que se aprofunda muito. E o personagem descobre como achar as sutilezas no meio dessa apatia aparente.

OP- Há um debate forte em torno da "assimilação" por pessoas não conformes com a cis-heteronormatividade de elementos dessa norma, que vão do casamento à constituição da família. Entre a busca pelo padrão e a recusa a ele, onde avalia que "Quarto Aberto" se encontra?

Tobias - Somos criados desde pequenos pra aderir à norma do casamento e da família, e não é assim de uma hora pra outra que nos libertamos desses símbolos, até porque tem muita beleza em casamento e família. Só que também vamos começando a nos dar conta de que esse é um modelo fechado, estanque, que não serve pra todo mundo, e que não deveria ser imposto socialmente. Talvez os LGBTs estejam mais atentos a isso porque já não se encaixam em vários padrões, por isso questionam outros. Mas bom, "Quarto aberto" não é um elogio à não-monogamia. É só um convite a pensar. Os relacionamentos abertos suprem vários problemas dos relacionamentos fechados, mas apresentam seus próprios problemas. O que é um prato cheio pra ficção.

 

'Quarto Aberto' é romance de estreia do autor Tobias Carvalho
'Quarto Aberto' é romance de estreia do autor Tobias Carvalho

Quarto Aberto

De Tobias Carvalho

Companhia das Letras

248 pág.

Quanto: R$ 69,90 o livro físico no site da editora; também à venda em livrarias e outros sites

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