Em 29 de julho de 1994, o cantor, ator e humorista Antônio Carlos Bernardes Gomes infelizmente partiu. Filho de Malvina Bernardes Gomes, Carlinhos, como era chamado, sempre demonstrou interesse pelo samba. Porém, foi na tela da TV que Mussum, nome que ecoou pelo Brasil, não apenas conquistou fama, mas também cativou os corações de inúmeros brasileiros. Agora, em “Mussum, o Filmis”, somos convidados a conhecer um pedacinho dessa história.
O longa tem início na infância de Carlinhos, interpretado na fase infantil do protagonista por Thawan Lucas, dando bastante foco na relação dele com sua mãe. Logo de cara, o roteiro mostra as dificuldades da matriarca do protagonista. Malvina, interpretada em um primeiro momento por Cacau Protásio, é mãe solo de duas crianças, analfabeta e trabalhando como empregada. O roteiro assinado por Paulo Cursino apresenta tudo isso de forma rápida, porém profunda. Em uma das primeiras cenas do filme, já conseguimos perceber não apenas o forte racismo da época, mas também a imensa dificuldade de uma mãe naquela situação. Tudo isso feito de uma forma quase subjetiva.
Após finalmente entrar na escola, Carlinhos aprende, mesmo que de forma um pouco tardia, a ler e a escrever. E após uma pequena montagem nos mostrando isso, o filme apresenta uma das várias interações emocionantes entre o protagonista e sua mãe. Interações que, sem dúvidas, são sempre o destaque de cada arco deste longa.
Após esta rápida passagem pela infância do protagonista, nos deparamos com um Carlinhos agora adulto, trabalhando durante a semana na aeronáutica e durante as noites do final de semana do Rio de Janeiro como sambista, no que viria a se tornar o "Originais do Samba". Interpretado agora por Yuri Marçal, que faz um Carlinhos de uma forma tão natural que chega a ser despreocupado, o protagonista se vê dividido entre seguir seu sonho de ser sambista e a segurança financeira de sua carreira na aeronáutica.
Aqui o longa nos faz começar a entender a grandiosidade de Antônio Carlos, mostrando que desde de jovem ele tocava com grandes nomes da música brasileira, como Elza Soares e Cartola, do qual era amigo. É a partir deste momento que o protagonista começa a alcançar certa fama como sambista.
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Yuri Marçal se destaca em tela desde sua primeira aparição no longa, mas é no final do segundo ato que Yuri se mostra completamente imerso dentro de seu personagem. Ao retratar um dos momentos mais trágicos da vida do artista, o roteiro mostra não só a dura realidade enfrentada por muitos artistas em início de carreira, mas também faz questão de expor a complexidade de ser um artista negro naquela época.
A direção de Silvio Guindane faz uma clara divisão da vida do artista. Depois de Marçal, traz Ailton Graça para interpretar Mussum, como ficaria conhecido. Que Thawan Lucas e Yuri Marçal estavam bem como Mussum até aqui, é algo indiscutível. Porém é Ailton que tem o maior destaque interpretando o artista. Trazendo agora um Mussum mais maduro e consolidado no samba, o ator tem a árdua tarefa de interpretar um dos maiores palhaços da televisão brasileira enquanto caminha para o seu auge. Isso é visto desde esquetes solo na TV, da "Escolinha do Professor Raimundo" até o famoso programa que consolida de vez o nome de Mussum na história do audiovisual, "Os Trapalhões".
Enquanto nos apresenta a ascensão de Mussum na TV brasileira, ao mesmo tempo o longa conta um pouco dos bastidores das relações com os colegas de trabalho de Mussum, mostrando que nem tudo eram flores na relação do grupo e que às vezes havia, sim, grades problemas de convivência entre eles.
Ao mesmo tempo, faz uma representação precisa de diversos momentos icônicos de algumas esquetes de Mussum no grupo que, apesar de claramente serem problemáticas para os dias de hoje, vão sim arrancar grandes sorrisos do vários espectadores, mesmo os que não forem afetados pela nostalgia do programa, pois fica extremamente claro ali que eles eram sim um produto de sua época.
Mesclando momentos emocionantes com a leveza do eterno trapalhão, "Mussum, o Filmis" é uma belíssima homenagem ao grande artista que Antônio Carlos foi, nos apresentando toda a grandeza e pluralidade de um dos maiores ícones da televisão brasileira. Com um roteiro assertivo, muito bem dirigido e com atuações dignas de quem as inspira, o longa vai além da cinebiografia e acerta em cheio do início ao fim.
Mussum, O Filmis