Filmes de animação com foco no público infantil têm sempre um grande desafio: agradar seu público-alvo, mas sem se tornar algo muito simplório ao ponto de não agradar um público mais maduro. Um exemplo bem sucedido e recente disso é "Super Mario Bros - O Filme", de abril deste ano, que agrada um público mais antigo da franquia ao mesmo tempo que atrai um público totalmente novo.
Desde sua criação, em 2007, a Illumination Entertainment tenta manter esse frágil equilíbrio entre agradar filhos e pais ao mesmo tempo. E digo com prazer que em "Patos" eles acertaram mais uma vez.
Contando a história de uma família de patos que vive de forma fixa em um lago nos Estados Unidos, o longa traz foco para Mack, dublado por Sérgio Stern na versão brasileira. O pato selvagem opta por nunca migrar na troca das estações, por conta do medo que sente dos perigos que o mundo pode vir a oferecer. No entanto, os medos de Mack acabam prejudicando não só a ele, mas também sua esposa e filhos, que se sentem cada vez mais "sufocados" por aquele local. Principalmente seu filho Dax (Sam Vileti), um jovem pato adolescente com sede pelo novo e desconhecido. E essa sensação acaba sendo amplificada quando outro grupo de patos chega ao lago da família e os convida para migrar para a Jamaica.
Partindo desta premissa simples, onde os medos do desconhecido podem privar alguém da vida como um todo, o longa traz uma abordagem muito divertida e fluida do tema. Para começar, ele não perde tempo para solucionar essa questão, já que logo de início a família sai sim em sua viagem rumo à Jamaica. O ponto aqui é como Mack, quando apresentado em tela, rapidamente percebe que seus medos não estão prejudicando somente a ele, mas sim a sua relação com a família. E tudo isso é mostrado de uma forma natural, não vindo de situações mirabolantes, mas em um diálogo com sua companheira.
A partir daí, o longa vira uma espécie de road trip em família, passando por diversos lugares, e em cada um deles o roteiro encontra uma forma inteligente de mostrar quando Mack estava errado ou certo, a depender de cada situação. Tudo isso enquanto acrescenta personagens muito carismáticos, como Erin, dublada por Cláudia Raia, ou o pássaro tipicamente jamaicano, Delroy (Marco Ribeiro). E a entrada de Delroy para a viagem não traz apenas mais um personagem carismático, mas também uma crítica discreta - mas eficaz - em relação aos homens que criam animais silvestres em cativeiro.
Nesse caso, o filme não tem um antagonista em si, o que também é surpreendente nesse tipo de produção. No entanto, grandes vilões não existem na vida real. O que existem são situações ou figuras específicas que podem, eventualmente, ou até mesmo propositalmente, nos fazer mal. Porém, sem grandes planos diabólicos ou intenções maquiavélicas. Mas, se é para apontar um vilão no filme, esse seria o ser humano representado como um chef de cozinha cuja especialidade, vejam só, é pato assado.
O filme não pinta o chef como um vilão em si, apesar de seu design trazer um ar mais amedrontador, por assim dizer. Mas na visão dos protagonistas, aquela atividade diária do chef é algo extremamente assustador. E isso acaba contribuindo muito bem para uma crítica à indústria alimentícia como um todo. O longa encontra espaço para criticar, muito bem, diga-se de passagem, até a criação "humanizada" de patos para o abate.
No geral, "Patos" tem uma direção fluida e divertida da dupla Benjamin Renner e Guylo Homsy, que acertam em cheio tanto nas cenas mais frenéticas quanto nos pequenos momentos íntimos entre os personagens. Trazendo uma estética que não é de todo inovadora e que claramente bebeu muito da fonte do longa brasileiro "Rio", de 2011, essa aventura que chega dia 4 de janeiro aos cinemas traz pequenas sutilezas em seu design para fugir da mesmice. Sem dúvidas, esse é mais um acerto do estúdio de animação e uma boa escolha para ver com filhos e amigos.