Unindo a tradição religiosa milenar com o folclore e folguedos brasileiros, o “Baile do Menino Deus" mobiliza olhares há 40 anos. De autoria do escritor cearense Ronaldo Correia de Brito, o auto de Natal realizado em Pernambuco reconta o nascimento do menino Jesus de uma maneira diferente, acrescentado aspectos da cultura nordestina e abordando temas contemporâneos.
A festa acontece em Recife dos dias 23 a 25 de dezembro de forma gratuita com a expectativa de atrair mais de 75 mil pessoas. Na terceira noite, o espetáculo será exibido virtualmente pelo YouTube e o público de todo o Brasil poderá acompanhar um dos maiores espetáculos de Natal do País.
Pela primeira vez em 20ª edições no Marco Zero, no Recife, a encenação da narrativa bíblica terá um ator indígena como protagonista ao lado de uma mulher negra para interpretar os personagens José e Maria. Além de Ronaldo, a obra tem autoria de Assis Lima com música de Antônio Madureira.
Para evidenciar como o Baile do Menino Deus continua antenado em questões contemporâneas do Brasil e do mundo, Ronaldo Correa de Brito usa de uma frase do personagem Mateus da peça. "Em um mundo sem portas, ando à procura. De porta em porta, sigo adiante", cita o autor em entrevista ao O POVO.
“Abordamos temas caros para o homem. Como por exemplo, a procura por uma casa. Se você for associnar sobre a questão dos imigrantes do mundo inteiro, se for procurar associnar sobre os palestinos confinados na faixa de Gaza e sendo massacrados, vemos um verdadeiro genocídio. Você vai ver que o homem, ele ainda luta por um lugar físico, geográfico e na história”, detalha o cearense.
A montagem do show apresenta para o público um texto que mistura o sagrado e profano, repleto de sotaque, dança, música da região, fugindo de um tradicional “natal congelado”, com neve de isopor, pinheiros, renas, trenós e Papai Noel, popularmente conhecido. Mostrando maneiras diferentes de celebrar a data, valorizando sobretudo a cultura nordestina, a exemplo de reisado, lapinha, pastoril, cavalo marinho, guerreiro, chegança, boi de reis, brincadeiras e muito mais.
O baile foi apresentado pela primeira vez no Recife, em 1983 e ao longo dos anos se transformou em um dos autos de natal mais encenados do Brasil. Em 2004 a produção ganhou o Marco Zero em arrojada iniciativa de levar o show para um palco a céu aberto, com acesso gratuito. Virou tradição em Pernambuco, festa do calendário natalino e atraindo público dos mais diferentes lugares.
Pela primeira vez em 20ª edições no Marco Zero,no Recife, a encenação da narrativa bíblica escalou um ator indígena como protagonista ao lado de uma mulher negra para interpretar os personagens, José e Maria. A obra é uma criação em conjunto dos escritores Ronaldo Correia de Brito, Assis Lima e do músico Antônio Madureira.
Sobre a escalação, Ronaldo expõe que historicamente as pessoas foram ensinadas a enxergarem Cristo a partir da visão dos europeus, distorcendo de fato sua origem.
“Colocar na cena do nascimento uma Maria, que é uma pessoa que se identifica como negra, e um José, que é um indígena da tribo fulni-ô, é uma maneira de afirmar um Cristo parecido com o Cristo Galileu. E mostrar seus pais é uma maneira de mostrar que eles são parecidos com o povo brasileiro, nós somos místicos e miscigenados. De uma cultura mestiça e sobretudo formada e criada pela união dos povos ibéricos indígenas e afro-descendentes”, afirma.
Caique Ferraz, que faz parte da etnia Fulni-ô, do município de Águas Belas, em Pernambuco, e Laís Senna, cantora e compositora, serão os protagonistas desta edição.
Esse ano o espetáculo conta com a produção de 300 pessoas, envolvendo atores, técnicos, músicos e produtores. O músico Maestro Forró vai participar da nova mudança cênica do show e o palco será ocupado por 63 artistas - o maior número simultâneo desde a estreia da montagem. Terá também figurinos afrofuturistas, os bailarinos de Okado do Canal, com hip hop e break, e o percussionista Luan Rian, de apenas 10 anos.
“Em 40 anos, o baile se firmou como um espetáculo que representa o natal brasileiro, um natal diferente. Se afirmou poeta e com a incorporação da cena musical e teatral brasileira, contemporânea e moderna”, aponta Ronaldo.
O autor atribui o sucesso do espetáculo durante todos esses anos ao fato de ele comunicar ao coração das pessoas, de maneira simples, clara e objetiva.
“Abordamos questões da alma do homem, do coração, do seu sonho. Ele toca músicas que emocionam, as pessoas que vão assistir ao baile se abraçam, cantam, dançam, choram e saem felizes”, se orgulha.
Baile do Menino Deus: Uma brincadeira de Natal
Baile do Menino Deus, o livro