Emiliano Queiroz amava estar em cena. Ator desde a infância em Aracati, era afeito a uma boa ficção e não negava trabalhos. Num ambiente tão personalista e vaidoso como é o da TV, não se rendia a caprichos.
Medo de papel pequeno não assombrava o cearense.
O diretor precisava de um padre para uma cena de casamento? Lá estava ele, concentrado, no altar. Olhar terno, fala acolhedora. Esse tipo sacro marcou o imaginário de diferentes gerações de apaixonados por televisão.
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Em entrevista para a jornalista Eleuda de Carvalho, publicada nas Páginas Azuis do O POVO em 2007, o artista contou não se projetar "nem Hamlet, nem Jeca Tatu". Assim, longe de grandiloquências e estereótipos, não vestiu a máscara do ator eternamente em busca de protagonismo.
Também por isso, acabou por assumir personas marginalizadas num cenário de um Brasil ainda mais careta. No teatro, foi Veludo, criação de Plínio Marcos (1935-1999) para a premiada peça "Navalha na Carne", de 1969. Em cena com Tônia Carrero (1922-2018) e Nelson Xavier (1941-2017), Emiliano defendeu um personagem gay em meio ao conservadorismo da ditadura militar.
Sobre Veludo, o cearense refletiu em julho último, em entrevista ao Vida&Arte. "Eu era metido a valente. Meus amigos diziam que eu era descendente de Lampião, que eu não tinha medo de nada. E eu já me colocava contra o preconceito", relembrou, contando sobre as críticas que recebia, em conversa no Hotel Luzeiros.
Tanta entrega, inclusive, comoveu Chico Buarque, que ampliou a força da personagem Geni, no espetáculo "A Ópera do Malandro" (1978), ao ver o ator em cena. Após se deparar com a interpretação de Emiliano para a travesti alvo de tantos julgamentos, transformou as poucas estrofes da música original da personagem na clássica canção "Zeni e o Zepelim".
Além do imenso currículo marcado pelo talento, Emiliano também nos deixa provocação sobre o fracasso. Ao abandonar a autoria da novela "Anastácia, a Mulher sem Destino", em 1967, o artista deixou recado também sobre a importância de ser fiel ao próprio ofício.
Nunca quis ser autor de novelas e, quando se viu num papel que não era seu, soube abrir caminho para quem, de fato, merecia estar ali. Assim, saiu de cena e Janete Clair (1925 - 1983) assumiu a trama - primeiro trabalho da mineira na TV Globo.
"Eu não tinha medo das verdades", detalhou sobre entender as próprias limitações e lutar as lutas que atravessavam seu caminho. Emiliano agora parte, aos 88 anos, e a Cultura do Estado segue embebida do seu legado sincero e criativo.