"É errado filmar isso", contesta Alicia (Uma Thurman) enquanto uma equipe de filmagem está instalada na casa de Leonard Fife (Richard Gere) para gravar um documentário sobre sua vida. Definhando por conta do câncer, Fife é um famoso documentarista e ex-professor universitário que, na juventude, foi ao Canadá fugindo do alistamento para a Guerra do Vietnã.
Baseado no livro "Foregone", de Russell Banks, o longa "Oh Canadá" é uma trama intimista que acompanha esse dia em que o cineasta fictício decide contar de si para o filme de um ex-aluno. O que era para ser uma entrevista protocolar acaba se tornando um turno recheado de lamentos e remorsos com revelações imprevisíveis sobre sua carreira e reputação como um ícone progressista. Pela primeira vez diante de uma câmera, a emoção de Fife está por um fio, atrapalhada e vulnerável.
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Sendo um longa de Paul Schrader, geralmente referenciado como roteirista de "Taxi Driver" e diretor de filmes enigmáticos mais recentes como "Fé Corrompida" e "O Contador de Cartas", surpreende que "Oh Canadá" seja um filme tão simpático e paciente. Na prática, a leveza desse retorno do protagonista ao passado é o seu maior trunfo, principalmente porque mergulha no idealismo nato à ideia de lembrança - tudo radiante, límpido e voraz.
Afetado pelos remédios e tendo uma vida pregressa pouco revelada, de fato, será que ele não está inventando sua própria memória? Ou tudo aquilo se trata mesmo de um grande segredo? Nesse ponto, Schrader se contenta apenas com a sugestão, o que é ótimo para nos manter envolvidos até o fim.
No presente, Fife é interpretado por um Richard Gere muito dedicado à fragilidade que o personagem exige, com seu rosto enquadrado quase sempre muito perto da câmera. Quando estreou no 77º Festival de Cinema de Cannes, em 2024, o que se conversava pelos corredores era que havia nascido uma aposta certa ao Oscar, com chance também para Uma Thurman e Jacob Elordi que conquistam seus destaques mesmo que de forma efêmera.
Nada disso aconteceu, no entanto, talvez porque "Oh, Canadá" seja inofensivo demais para causar emoções firmes ou empatia com a plateia. O filme não sabe ao certo o que fazer com um personagem preenchido de enigmas e lamúrias que, de repente, está tão perto da morte e precisa simplesmente aceitá-la.
Apesar disso, o ritmo da montagem entre passado e presente nunca parece algo meramente oportunista, devoto à ideia cruel de uma doença que te arrasta para o fim enquanto coloca em dúvida a essência da sua própria moral.
"Oh, Canadá" chega nesta quinta-feira, 5, aos cinemas brasileiros.