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Novos traços
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Novos traços

Entre traços, palavras e política, Elias Dias, novo quadrinista do O POVO, desenha o mundo com humor crítico e sensibilidade estética
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Elias Dias, cartunista do jornal OPOVO. (Foto: Cadu Marques/Coletivo Chaminé)
Foto: Cadu Marques/Coletivo Chaminé Elias Dias, cartunista do jornal OPOVO.

(Texto de Luciana Cartaxo/Especial para O POVO)

Por trás das tiras provocativas que aparecem nas páginas do O POVO está o traço de Elias Dias, 29 anos, mineiro de Congonhas que reside no Rio de Janeiro. Cartunista, estudante de Letras, poeta não assumido e leitor voraz, Elias conduz o humor gráfico com a mesma fluidez com que atravessa a literatura, a estética e a política.

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O primeiro contato com o desenho se perde nas suas memórias de infância. O gosto pelo humor, no entanto, tem raízes bem fincadas no solo fértil da família piadista do interior de Minas Gerais. "Desde que me entendo por gente, tenho uma forte implicação com o que hoje aprendi a chamar de estética. A primeira peça de humor gráfico que vi certamente não me foi novidade, mas a síntese de uma poética já vivida", explica.

A estreia de Elias Dias como cartunista

A estreia como cartunista se deu cedo, aos sete anos. Numa ação educativa promovida por uma empresa ferroviária em sua escola, Elias criou uma tirinha sobre segurança nos trilhos. "Ganhei um boné, uma caixa de bombons e uma visita ao setor de manutenção de vagões. Foi a única vez que vi um vagão pendurado no teto", brinca.

No entanto, o cartum só se tornaria profissão muito tempo depois, impulsionado pela necessidade de expressar sua sensibilidade estética e sua paixão pelas palavras, o primeiro texto que leu na vida foi um poema infantil sobre um tatu na Inglaterra.

Sua entrada na página Brincar - publicada no O POVO -, fazendo tirinhas, veio de forma espontânea. "Certo dia, resolvi escrever aos editores e propus uma ideia mais ou menos desvairada. Gostaram", resume. Desde então, seus traços marcam presença no Vida&Arte, sempre aos sábados, com um estilo cada vez mais autoral.

"Estou menos próximo da charge, mais imediata, e mais próximo do cartum, que trata de questões atemporais. Tento não fazer o que o meme já faz melhor", justifica. Entre as influências que moldam seu olhar estão nomes como Laerte, considerada uma das maiores cartunistas e chargistas brasileiras, o desenhista André Dahmer, os poetas Paulo Leminski e Torquato Neto, e a pintora contemporânea Manuela Navas.

Mas há também a capoeira de Mestre Pastinha, o Pessoal do Ceará na música, e a poesia que ele encontra em conversas, exposições e leituras. "A palavra 'inspiração' é complicada, mas, no geral, minhas ideias vêm de textos que leio, pinturas que vejo, maldades que tento destilar", acrescenta.

Elias não se furta ao embate com temas espinhosos. Para ele, a arte está, inevitavelmente, atravessada pela política e isso vale também para o traço. "Estudo política porque tudo é política. E o humor, quando é bom, é político também. Humor que serve para vangloriar bilionários ou reforçar opressões, para mim, é só propaganda com máscara de piada", avalia.

Ele enxerga na charge e no cartum um território no qual o desenho não apenas comunica, mas também intervém. Um espaço onde o artista pode desafinar o coro dos contentes, como diria Torquato Neto, um de seus ídolos. "O humor gráfico tem uma forma própria de dizer, que nem sempre as palavras alcançam. Quando ele acerta, é como um golpe: direto, certeiro e inesperado".

Apesar da leveza que muitos associam ao humor, Elias trata o fazer artístico com densidade crítica. "Acredito que há algo na forma própria do humor gráfico que, se explorado de maneira radical, as máquinas não serão capazes de copiar", finaliza.

 

Projetos para o futuro

Elias desenha nas brechas, muitas vezes ao som de música e com uma bebida ao lado. Lê de tudo, conversa com a esposa Gabriela Diniz, visita teatros e exposições, e cultiva sonhos para o futuro. "Quero lançar um livro com minhas tiras, ter um ateliê que não seja a sala de casa, participar de exposições. Ser artista custa uma vida inteira, como li em um livro", projeta.

Seus trabalhos recheados de referências poéticas, jogos de linguagem e um humor que mais provoca que consola são, para ele, uma forma de intervenção no mundo. "A charge, como disse me disse Laerte uma vez, é tão necessária quanto a manchete ou a fotografia. Pobres dos jornais que abriram mão disso", lamenta.

Nos traços de Elias, a tradição do cartum brasileiro se renova sem perder o fio da crítica. Um artista que pensa o riso como resistência e faz do desenho um território para dizer o indizível.

 

Quadrinistas do Vida&Arte

  • Elias Dias
  • Fabrício Selva
  • Dhiôw, "Coisinhas"
  • Redi, "Tem alguém aí?"
  • Lya Calvet, "Em processo"
  • Raquel Silva, "Jerimunzinho"
  • Ise Nishi, "Entre as sarjetas"
  • Rebeca Jessica, "Zootirinhas"
  • Blenda Furtado, "Nanda a ver"
  • Pâmela de Castro, "Metatirinhas"
  • Julianne Almeida, "A cara de Ju"
  • Gabriel Amaral, "Finho Doguinho"
  • Henrique Castro, "Infinito Pessoal"
  • Emmanuel Bezerra, "Cleitin o Vetin"
  • Daniel Brandão, "Os Mundos de Liz"
  • Milene Correia e Emylle Torres, "Emylle sobre rodas"

 

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