Na década de 1990, enquanto diversas crianças brincavam em parques na solar Buenos Aires, na Argentina, Cecilia Arbolave tinha o livro como brinquedo favorito. Ainda jovem, sem saber que seria jornalista, escrevia textos, experimentava tipos diferentes de papel e brincava de fazer fanzines.
29 anos se passaram, e hoje, aos 39, Arbolave é considerada referência no mercado de produção gráfica, editoração independente e em impressões que transitam entre as artes visuais e a literatura.
Ela desembarca em Fortaleza para o Festival Publico de Impressos e Publicações, feira que reúne impressores e publicadores nacionais. O evento acontece até 20 de julho no Kuya - Centro de Design do Ceará e no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura (CDMAC).
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Além de ministrar o curso "Produção Gráfica e Planejamento de Publicações", já com inscrições encerradas, Cecília lança a obra "O livro de fazer livros: produção gráfica para edições independentes", lançada em 2024.
Em meio à popularização do termo "editoras alternativas" em um País que tem, conforme dados da Liga Brasileira de Editoras (Libre), mais de 150 editoras independentes cadastradas, ainda surge a pergunta: o que define uma editora independente?
Para Cecília, a resposta reside no objetivo despretensioso de uma geração de publicadores que não está tão vinculada ao sucesso, e sim ao sentido do que se coloca no mundo.
"A cena de editores e autores independentes traz uma produção muito mais preocupada com o que quer colocar no mundo. O resultado são livros, zines, obras impressas, às vezes com formatos totalmente diferentes e inovadores, que renovam a cena e trazem uma forma diferente de ver o livro", conta.
A jornalista acrescenta que a proximidade entre a produção e a circulação dos exemplares também é privilégio daquelas editoras que conseguem participar ativamente de todas as fases de produção.
"Uma característica dessa cena é que é o próprio artista que vai criar o seu livro, depois, vai estar na feira vendendo, em contato com os leitores. E são esses mesmos leitores que vão se aproximar da mesa e aprender sobre uma técnica de impressão, vão ficar com vontade de fazer os seus próprios livros. É uma maneira de provocar e de poder também criar e formar esse público leitor", afirma Cecília.
Após a graduação em Jornalismo pela Universidad Austral de Buenos Aires e a vinda para o Brasil aos 22 anos, Arbolave trabalhou como repórter na Editora Abril e nas revistas Casa Claudia Luxo e Minha Casa. Em 2012, ao lado de João Varella, criou a Lote 42, editora independente que brinca com as fronteiras entre literatura, artes visuais e design gráfico.
A editora foi agraciada em maio com o V.O. Stomps Preis, concedido pela cidade de Mainz e pelo Gutenberg-Museum, na Alemanha. Conhecido por reconhecer a excelência na arte da publicação e impressão, o prêmio foi outorgado a uma editora da América Latina pela primeira vez.
Entre os lançamentos que exemplificam a proposta da Lote 42, a editora destaca a 4ª edição do Poemóbiles, clássico do poeta concretista Augusto de Campos.
"Em formato pop-up, contando com 12 poemas, a gente relança a obra de 1974, oferecendo uma nova proposta na forma e conteúdo para um clássico. A ideia é que ele volte a circular em uma nova geração, pois o seu conteúdo é de uma força imensa", pontua.
Trazendo novos significados para o que é clássico, foi assim que a autora, também ao lado de Varella, revitalizou a Banca Tatuí em 2014. Com uma área de 6 m² no bairro Santa Cecília, em São Paulo, o espaço passou de uma tradicional banca de revistas para um ponto permanente dedicado a publicações independentes brasileiras: zines, quadrinhos, poesia e ensaios.
O projeto se configurou como a primeira banca de rua totalmente focada em publicações autorais no País, criando um espaço fixo de visibilidade para projetos. Para a editora, apesar do crescente mercado de literatura on-line que vem influenciando a diminuição de publicações impressas, projetos como a Banca Tatuí relembram que ainda existe espaço para a literatura física.
"No mercado editorial há espaço para tudo, para o livro nas suas diversas formas de se materializar. No formato (físico), há algumas camadas expressivas que de explorar. Mas me parece que tudo convive, e quantos mais leitores tivermos, seja em e-book, seja em audiobook, seja no físico, melhor", argumenta.
Lançamento "O livro de fazer livros: produção gráfica para edições independentes"