Você já imaginou o corpo como paisagem? O que aconteceria se a natureza fosse vista como extensão viva das atitudes humanas? É partindo dessas perguntas que a exposição "Aquilo que Habita em Mim" ganhou forma. Sob a idealização da multiartista Ana Mundim e curadoria de Lucas Dilacerda, a mostra segue em cartaz até domingo, 20, no Museu da Cultura Cearense (MCC), no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura.
O trabalho é fundamentado na proposta de explorar como o ser humano faz parte da natureza. É um convite para o público pensar sobre a relação com o meio ambiente e com outras formas de vida. Mundim usa fotografias, vídeos e elementos naturais - como fungos e raízes.
Instagram | Confira noticias, críticas e outros conteúdos no @vidaearteopovo
"As obras apresentam a relação intrínseca do corpo humano com outras espécies e o entendimento de que somos natureza. O mosaico de imagens apresentadas forma paisagens a serem contempladas e experienciadas pelo corpo do público", diz a artista. Ana também atua como performer, DJ, atriz e bailarina e, desde os anos 2000, desenvolve pesquisas em dança com foco no conceito de "corpo-espaço", em que o corpo é visto como uma parte inseparável do ambiente.
A mostra nasceu a partir de uma metodologia criada pela artista chamada "Aqua Move", que consiste em movimentos de dança realizados na água. Durante seu pós-doutorado em Artes, Ana decidiu registrar esse processo em imagem.
Ao se inspirar em movimentos de plantas e animais aquáticos, a artista desenvolveu imagens que despertam novas maneiras de perceber o corpo e o ambiente. "Sentir-me água em contato com outras espécies e pousar minha atenção no movimento que elas traçaram, redimensionou minha maneira de lidar com o entorno e despertou em mim um olhar atento e cuidadoso para outras maneiras de existir e para outras inteligências que operam na construção das ações e das percepções cotidianas", destaca.
"A exposição é quase um organismo vivo", diz Ana, que vê sua obra como um processo contínuo de escuta e transformação. O trabalho tem inspiração no conceito de "simbioceno".
"A partir do conceito de simbioceno, a exposição se tornou um convite para habitar essa ficção-realidade. Quando vi suas fotografias — o corpo dela se fundindo às pedras, às raízes, às águas — percebi que não se tratava de autorretrato, mas de um gesto de dissolução do humano em algo maior, uma paisagem expandida. Foi dessa fusão que nasceu a noção de terceira paisagem, que atravessa a curadoria como eixo conceitual e poético", explica Lucas, o curador.
Segundo ele, a mostra se organiza em três eixos: a água, o corpo como paisagem e os fungos. "Esses elementos não foram escolhidos como temas ilustrativos, mas como forças vitais que organizam a exposição".
A montagem da exposição foi pensada a partir da experiência sensorial e, segundo o curador, a água aparece como "fluxo e memória", com a ideia de transformação constante. O corpo é visto como paisagem, eixo que guiou a disposição das fotografias, tecidos e projeções. Já os fungos, ele relata que desempenham o papel de mediação entre vida e decomposição, inspirando a ideia de criar pontos de conexão entre as diferentes obras.
"Foi um trabalho de curadoria que buscou dialogar com a potência imagética da Ana Mundim, uma reflexão sobre o simbioceno, esse mundo possível onde humanidade e natureza se compreendem em processos integrados, não de dominação. É, acima de tudo, um convite para experimentar uma 'ecologia vital'", destaca.
Ana Mudim explica que a maior parte das obras não possui títulos intencionalmente, pois a proposta é que o público navegue pelos "fluxos da exposição", sem um direcionamento externo para desenvolvimento de uma interpretação subjetiva.
Lucas Dilacerda ressalta como o trabalho, além de expor as dificuldades ambientais, também ressalta as possibilidades de mudança."Me surpreendeu como, mesmo lidando com questões tão urgentes e graves, Ana consegue produzir uma obra que não é niilista, mas afirmativa. Há uma esperança que não é ingênua, mas que nasce da própria vida que insiste em brotar", comenta o curador.
Dragão do Mar
A exposição "Aquilo que habita em mim" tinha previsão de término apenas em agosto, mas o fim foi antecipado para domingo, 20 de julho, pois áreas do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura passarão por manutenção. Entre as intervenções previstas estão pinturas, recuperação de estruturas metálicas e impermeabilização de lajes de teto e de piso.
Os espaços afetados pelos serviços são o Museu da Cultura Cearense (MCC), Museu de Arte Contemporânea do Ceará (MAC), lojas criativas do andar superior, minianfiteatro, passarela vermelha e a Varanda dos Museus.
As obras de manutenção serão graduais. As datas de início das intervenções ainda serão divulgadas pelo equipamento.
A estimativa do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura é que as obras sejam concluídas em três meses. Nesse período, os acessos ao complexo cultural também serão adaptados para facilitar circulação de visitantes. (Miguel Araujo)
Exposição "Aquilo que Habita em Mim"