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Só sei que foi assim: 'Mundo Suassuna' em cartaz na Caixa Cultural
Vida & Arte

Só sei que foi assim: 'Mundo Suassuna' em cartaz na Caixa Cultural

Espetáculo "Mundo Suassuna" está em cartaz em Fortaleza; leia análise da jornalista Eleuda de Carvalho
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Foto: @erikalmeida/DIVULGAÇÃO '"Mundo Suassuna" é apresentado na Caixa Cultural Fortaleza

Por Eleuda de Carvalho*

“Mundo Suassuna” faz jus ao nome. A obra imensa de toda uma vida, isto é, Ariano Suassuna em prosa, verso, performance, ação, vocação e festa, está toda compactada com graça no espetáculo que dura 55 minutos mas parece um átimo, de tão divertida, includente e espirituosa que é a peça.

Se você conhece a poesia de Ariano, o seu teatro, o seu maravilhoso Romance d´A Pedra do Reino, foi a alguma aula-espetáculo, vai amar e morrer de saudade e querer ler tudo de novo, e ouvir e rir. Se não conhece, vai apreciar do mesmo jeito. Para todos, será sempre uma descoberta e alumbramento.

Sábado, teatro da Caixa Cultural, pequeno e simpático, lotado. Antes do espetáculo vale um passeio pelo vetusto prédio do século 19, a antiga alfândega de Fortaleza, erguida em 1897 e desde 2012 transformada neste espaço cultural com amplo jardim e fonte e esculturas coloridas de Dim Brinquedim.

O vento aracati dava o ar de sua graça, na noite acolhedora. No piso superior do prédio tem uma exposição incrível e de cara vejo o homem amarelo e as casinhas coloridas do Hélio Rôla. Brigadistas simpáticos faziam-se fotógrafos pra quem quisesse se registrar na escadaria de ferro fundido vinda de Inglaterra.

Mas está na hora do espetáculo começar. Rapidinho o respeitável público tomou assento e lotou a plateia, muitas famílias com crianças. Como era sábado, havia um grupo pronto pra se revezar na tradução em libras. No palco vazio, alguns praticáveis redondos e coloridos, dois retangulares também coloridos, no alto quatro cordões de pequenas luzes que vão se transformar em céu estrelado, depois.

Havia ainda suspensos dois painéis enrolados. Ao fundo, uma espécie de oratório, uma caixa móvel também colorida e ainda de portas fechadas. Tudo lembrando o circo. O circo essencial. Ah, a peça! Toda a graça da brincadeira popular nordestina e universal, pois não, logo mais, diante de nossos olhos: o mamulengo, os palhaços, os poetas itinerantes, o sertão e sua magia, a cidade e seus ruídos, a estrada.

O palco é a estrada da vida e em instantes três cavaleiros de alegre figura vão nos apresentar a máquina do mundo, ali, encantada. Do escuro da cena vem vindo a casinha oratório, aliás, digamos aqui seu legítimo nome, kamishibai, o mamulengo japonês. Abrem-se as portas da caixa e vemos o herói menino, em seu mundo sertão, onde reinava o rei seu pai, assassinado.

Que tragédia. Aquele menino, para vingar a morte do pai, fez-se poeta e artista, a defender o sonho através da magia da poesia, do teatro, do livro. É esta a história a ser contada pelo poeta em seu cavalo e seus parceiros palhaços e profeta e onça e caveiras malassombradas. Como no teatro de bonecos, a plateia, especialmente as crianças, participam ativamente, alertando o herói dos perigos da jornada. “Mundo Suassuna” tem direção e concepção de Marcelo Romagnoli, com o trio de atores Fábio Espósito, Guryva Portela e Henrique Stroeter.

As gravuras dos estandartes do sol e da lua e das pedras do reino são do artista plástico Manuel Dantas Suassuna, filho de Ariano. Os bonecos de mamulengo, os cavalinhos da cena final e o cavalo Pantero foram criados por artesãos de Glória do Goitá, município pernambucano com grande tradição no cavalo- marinho, que inspira a coreografia do personagem Poeta.

O texto é uma criação em palimpsesto da obra de Ariano e até as inserções autorais do diretor casam-se com o mundo suassúnico. Por exemplo, quando os personagens fazem uma aposta, o Palhaço chama de “bet”, ao que o Poeta corrige: “Não troco minha aposta pela bet de seu ninguém”, ecoando a frase de Ariano, não troco meu oxente pelo ok de seu ninguém.

O Poeta viaja com o cavalinho de reisado Pantero (nome do personagem principal do último romance de Ariano) e um caderno no qual vai contando sua aventura. Ele chamou de “quaderno” ou foi impressão minha? Quaderna é o personagem narrador do Romance d´A Pedra do Reino. Bom. Contei como sabia, e só sei que foi assim.

*Eleuda de Carvalho é jornalista

Espetáculo "Mundo Suassuna"

  • Quando: sábado, 19, às 19 horas; domingo, 20, às 18 horas
  • Onde: Caixa Cultural Fortaleza (av. Pessoa Anta, 287 - Praia de Iracema)
  • Quanto: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia-entrada)
  • Vendas: bilheteria presencial
  • Mais informações: Instagram

 

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