"Canções usavam formas simples pra falar de amor. Carrões e gente numa festa de sorriso e cor", nos versos da canção "Jovens Tardes de Domingo", Roberto Carlos relembra a atmosfera do movimento que efervesceu entre a juventude durante a década de 1960.
A Jovem Guarda celebra 60 anos em 2025 com sucessos atemporais e a influência na criação de outros movimentos culturais. Iniciativa nascida no Bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro, quando o grupo de amigos Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Tim Maia e Jorge Ben se encontrava para compor e apresentar suas canções.
Foi apenas em 1965 que a expressão "Jovem Guarda" se tornou nacionalmente conhecida com o programa de televisão da Rede Record. Apesar de não ter sido o único ligado ao movimento, a emissora foi responsável por alcançar uma das maiores audiências da televisão brasileira com rock ao vivo.
Segundo Jotabê Medeiros, jornalista e escritor da obra "Roberto Carlos: Por Isso Essa Voz Tamanha", os artistas foram inspirados pelo rock e soul da época. Uma das referências para a sonoridade foi a banda The Beatles, formando o "iê-iê-iê", estilo musical que descrevia o som da Jovem Guarda.
"No final dos anos 1950, foi inventado o rock and roll nos Estados Unidos. Então, você tem lá a Little Richard, Chuck Berry, você tem os pioneiros, né, do rock. Quando essa música chega ao Brasil, ela foi absorvida por artistas que copiavam o som do rock estrangeiro, eles não tinham uma música autoral. Então, quando aparece a dupla Roberto e Erasmo, surge a música, o rock cultural brasileiro", destaca o crítico.
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Roberto e Erasmo passaram a ser autores e criaram suas músicas. Entre as composições, foi a abordagem de situações cotidianas que impulsionou a popularidade do movimento entre os jovens. Perspectiva que diferenciou o gênero das músicas que eram destinadas ao público mais velho, como os boleros e a Bossa Nova. "Na década de 1950, você não tinha música para adolescentes. A Bossa Nova era destinada ao pessoal que já estava no final da adolescência, universitários", diz.
"Também tinha o samba, os sambas de canção, os boleros, a MPB (que ainda não se chamava de MPB), mas todos feitos para adultos. De repente, começou a chegar via rádio versões de rock and roll americano e mudou tudo", elucida Ricardo Pugialli, autor do livro "Almanaque da Jovem Guarda" e pesquisador.
A popularização resultou na ascensão de outros nomes: Martinha, Eduardo Araújo, Wanderley Cardoso, Jerry Adriani e as bandas Os Incríveis, Renato e seus Blue Caps, Jet Blacks, Jordans Golden Boys, The Fevers e Os Incríveis. Para além da música, a influência da Jovem Guarda refletiu na moda e no comportamento. O visual era característico entre fãs e artistas, com roupas coloridas e estampadas, casacos e cabelos escovados ou com topete.
"As meninas começaram a usar vestido de tubinho e depois - quando a Wanderléa começou - a usar mais mini saia. Os garotos todos, calça tipo 'santroppê', mas eram calças muito apertadas, de cós baixo e todo esse cinto com fivelas grandes, botas, óculos escuros. Então, os jovens começaram a se vestir como jovens e, obviamente, eles viam as fotos que vinham lá de fora", relembra Pugialli.
A linguagem era incorporada por expressões retiradas das letras das canções apresentadas no programa como: "barra limpa", "broto", "pão" e "é papo firme". O programa homônimo ao movimento era comandado por Roberto Carlos, Erasmo Carlos e Wanderléa. A cantora, segundo os pesquisadores, foi um símbolo de emancipação feminina.
"A Jovem Guarda teve essa associação entre moda, música, atitude, comportamento e emancipação feminina. A Wanderléa era a primeira menina emancipada da música, apesar do preconceito, ela era uma figura que convocava as garotas a serem livres, a terem sua própria cabeça, profissão, liberdade em relação à família", destaca Jotabê Medeiros.
Apesar do seu valor como influência de novos movimentos, a Jovem Guarda também era vista por parte da intelectualidade como supérflua, devido ao tema de suas canções. Diante do cenário do golpe de 1964, os integrantes da Jovem Guarda passaram a ser apontados como "alienados" por aqueles que combatiam a ditadura militar. "Acho que um movimento que mobiliza a juventude inteira é revolucionário e tem capacidade de articular mudanças", elucida Jotabê.