"A revolução não será televisionada (...) a revolução será ao vivo". O músico e poeta Gil Scott-Heron lançou "The Revolution Will Not Be Televised" em 1971, abordando a luta pelos direitos civis, o uso da mídia na politização do povo e a fala de uma revolução vivida e não transmitida.
"Uma Batalha Após a Outra" (2025), escrito e dirigido por Paul Thomas Anderson, mostra um cenário em que vemos os Estados Unidos da América com políticas racistas, xenofóbicas, machista e anti-imigratórias. Tudo isto transmitido pelas televisões em 2025.
O diretor americano, um dos mais autorais da geração, conhece a realidade de um futuro não tão distópico neste mundo que vemos se aproximar a cada fala e medida tomada por Donald Trump, presidente da maior potência mundial.
A obra, adaptada de livro homônimo, narra o tesão - e também a tensão - que os militantes carregam pela revolução. A introdução do longa mostra os personagens efusivos, excitados em enfrentarem as tropas militares para libertarem imigrantes oprimidos e presos.
Isso tudo é sentido e muito bem interpretado por Teyana Taylor, que dá vida a Perfídia Bervely Hills. Ela vive tanto pelas suas causas que até esquece de dar atenção ao dia a dia - como o fato de ser mãe, embora seja um símbolo feminista e da negritude contra as forças opressores imperialistas.
Seu apego a revolução é tanto que traz para o contexto, aparentemente de forma abrupta, Bob Ferguson, interpretado pelo sempre excelente Leonardo DiCaprio. Antes de se tornar o hippie drogado e sem muito ânimo para a vida, ele foi um revolucionário que vibrava ao ir contra a mão que oprime, mesmo sendo branco e estadunidense, quem, em tese, não seria alvo de ataques dos extremistas intolerantes.
Ainda na introdução, Teyana esbanja toda sua sensualidade para o asqueroso coronel Steven Lockjaw, papel de Sean Penn, que de forma brilhante vive um supremacista arrogante, cheio de si, que não esconde o ódio. Chega a dar asco apenas pelo seu olhar e jeito de andar.
O personagem tinha tudo para ficar caricato, se não vivêssemos em um mundo onde essas figuras já não têm mais vergonha de serem racistas e homofóbicas. Basta olhar para quem comanda a "maior democracia do mundo". Penn é um ótimo ator e dificilmente ficará de fora das indicações dos principais prêmios do cinema.
A montagem do PTA, abreviação do diretor Paul Thomas Anderson, é caótica não só pelo mundo estar tomado por chamas, mas também pela agilidade de quem vive sempre escondido ou em busca de uma perigosa empreitada. Tanto que as quase três horas de duração passam sem muito sofrimento ou momentos lentos que cansem o telespectador.
Um artifício usado pelo cineasta são os planos-sequências e diálogos "afetados". Quando a cena é uma baita confusão, não chega a lugar nenhum porque há um entrave na história. A câmera do filme conduz bem e não deixa quem está assistindo perdido.
No meio dessa loucura, Benício Del Toro é um excelente alívio cômico com o seu misterioso Sensei. Não sabemos muito sobre este personagem, como consegue o que consegue, mas cada aparição é divertida e, embora sem maiores aprofundamentos, funciona como liga de um ponto do roteiro a outro, principalmente para o personagem de DiCaprio.
O maluco e perdido Bob lembra - em alguns momentos - outras atuações de DiCaprio. Não tem nada que ele já não tenha feito, mas seu sarrafo é tão alto que nos acostumamos com grandes performances.
Outro ponto de atuação que merece destaque é a estreante Chase Infiniti. Ela interpreta Wila Ferguson, uma adolescente perdida que faz com que a trama deixe de lado o universo de opressão para focar nesta história mais intimista.
A direção de PTA até inova uma maneira de se fazer perseguição entre carros em uma avenida curvada. A cena em que ele deixa o telespectador quase que beijando o asfalto em subidas e descidas de uma crescente tensão é fantástica. Muito ainda se falará deste trecho.
As discussões sobre direitos civis de negros, mulheres, imigrantes e homossexuais que Gil Scott-Heron trouxe há cerca de 60 anos mostram uma América conflituosa. Por saber disso, Paul Thomas Anderson destaca como o país passou por construção e reconstrução sobre alguns temas.
É orgulho para supremacistas neonazistas, vergonha mundial para os que entendem minimamente de um mundo pacífico, mas que existe. Por mais que passem 15 anos, como mostra o filme, os intolerantes continuarão por aí.
E na mesma medida em que um opressor abre suas asas para suas convicções atrasadas e irracionais, mais o revolucionário se excita a lutar por direitos. E hoje mais do que nunca, quando os ataques à democracia e aos direitos básicos são feitos de forma escancarada, televisionados em todo o mundo.